Pão de queijo é coisa nossa?

No dia do quitute mais amado do Brasil, descubra truques e versões autorais de chefs, confira receitas e conheça seu concorrente portenho.


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Combinação macia e crocante de polvilho, ovos, óleo e, de preferência, bastante queijo, hit de vendas em cafés, padarias, supermercados e até restaurantes premiados, o pão de queijo é daquelas receitas consideradas afetivamente patrimônio nacional, junto à coxinha e ao brigadeiro. Mas será que, como o samba, o Flamengo e Ipanema, ele é coisa nossa?

Não podemos esconder: a América Latina todinha esbanja versões do quitute, como o cuñapé (receita boliviana com queijo e amido de mandioca, ovo, manteiga, leite e fermento em pó, em formato de seio feminino), o pandebono (massa colombiana com farinhas de milho e mandioca, queijo, ovo e, às vezes, uma pitada de açúcar) e a chipá ou chipa (que tradicionalmente não tem formato de ferradura, como a versão que se popularizou no Brasil, nem é mais biscoituda que o nosso pãozinho. Pelo contrário!).

Preparo ancestral da cultura guarani feito com fécula de mandioca, ovos e muito queijo, a chipá é patrimônio nacional no Paraguai e hypou em cafés, hotéis e restaurantes na Argentina. Normalmente achada em bolas ou bolinhas, como as nossas, mas não raro formatada em rosquinhas e palitos, é hoje mais uma das rixas com nossos hermanitos.

“Os brasileiros vão direto no bowl: ah, tem pão de queijo! Corrigimos, é chipá, senhor”, sorri o chef Emiliano Sittner, do hotel Casa Sur, no bairro de Palermo, em Buenos Aires.

Vizinho do hotel, no concorridíssimo Oli Café, a chipá é um dos itens mais vendidos, seja a simples, a recheada com presunto e queijo ou a com kimchi. “Confesso que nossa chipá não é a tradicional, pesa 120 gramas e leva um pouco de creme de leite para ficar superfofa”, conta Olivia Saal. “É inspirada na tradicional chipá do norte, que contém leite, suco de laranja, farinha de mandioca, manteiga e queijo. Estes ingredientes são simplesmente combinados usando a técnica de ‘arenar’ (fazer uma farofa com a manteiga fria). O resultado é bem diferente do pão de queijo brasileiro, que é mais arejado”, explica a chef.

Do nosso lado da fronteira, cozinheiros nem cogitam entrar em picuinhas, sobretudo os mineiros. Caio Soter, do Pacato e do Jardim, de Belo Horizonte, usa todas as suas raízes e acrescenta um toque pessoal na hora de transformar o pãozin em biscoitin finin, que continua indo muito bem com ragu de linguiça e requeijão. Para além da escolha dos queijos regionais, Soter entrega outro segredo: “O mais importante do pão de queijo é escaldar o polvilho, porque o escaldo do polvilho azedo faz com que o amido seja gelatinizado, o que traz elasticidade à massa”.

Pablo Oazen, mineiro estabelecido no Baixo Pinheiros, em São Paulo, gosta de misturar os dois polvilhos. “O azedo ajuda na crocância e o doce deixa o interior mais fofinho. No Benza, uso um queijo mais curado para dar sabor, o Capim Canastra, e um minas frescal, que dá cremosidade no interior. Lembrando que é um pão de queijo e não um pão de polvilho. Portanto, tem que levar um tantão de queijo. Não adianta economizar!”

Luiz Filipe Souza, do Evvai, é a prova que exagerar no queijo não diminui – em nada – a sofisticação da receita. Nem a brasilidade. Os láticos artesanais ocupam quase 75% da fórmula do premiado chef. “Coloquei o pão de queijo na caixa criativa de boas-vindas que traça um paralelo entre Brasil e Itália. Então, tenho o pãozinho, que é o snack que está mais no cotidiano do brasileiro, como se fosse um brinde, e tenho também o prosciutto com melão”, apresenta ele. Com o queijo de Araxá, no Triângulo Mineiro, Luiz evoca uma “denominação de origem com pungência legal”, enquanto o da Ilha do Marajó brinca com a “tradição das búfalas italianas, ao mesmo tempo em que traz uma invenção nacional, o requeijão de corte”.

Falando em invencionices, Rafa Costa e Silva, do Lasai, ostenta hoje a mais sexy delas, uma nuvem de queijo recheada com aligot (aquele purê queijudo de batata), que não é servida como couvert, nem amuse bouche, mas é um dos tempos, quase central, da degustação do Lasai, quiçá a melhor do país.

Se a versão do carioca é sensual, a do paulistano André Mifano é pornográfica. Mais hardcore, o chef do Donna serve um pãozinho frito à base de queijo cremoso da Serra da Canastra (foto que abre a reportagem): “Foi a coisa mais orgânica da história. Estava na cozinha com um pacote de pão de queijo na mão para congelar. Olhei pra fritadeira e ela disse: ‘e aí?’. Olhei pro pão de queijo e ele disse: ‘e aí?’. Três minutos depois, tcharan! Como a maçã que caiu na cabeça do Isaac Newton, foi uma dessas ideias Eureka!”. Brincadeiras à parte, essa cápsula explosiva de requeijão é um dos quitutes imperdíveis de São Paulo. E, sim, é brasileiríssimo.

A seguir, confira três versões dessa maravilha de queijo, ensinadas por experts no assunto.

Receita de pão de queijo de boas-vindas

pao de queijo com folha de ouro fotografado sobre carvoes

No Evvai, o pãozinho mistura queijos mineiro e marajoara.Foto: Divulgação

Receita de Luiz Filipe Souza, do Evvai

Rendimento: 65 unidades
Tempo de preparo: 30 minutos

Ingredientes

450 g de queijo Araxá ralado
200 g de queijo da Ilha do Marajó em cubinhos
130 g de polvilho doce
20 g de manteiga
2 ovos pequenos
2 g de fermento em pó
2 g de sal
50 ml de leite

Modo de preparo

1. Misture todos os ingredientes até obter uma massa lisa.

2. Porcione em bolinhas de 10 g com um pedacinho de queijo do Marajó dentro.

3. Asse a 180°C por 10 minutos.

Receita do chipá do Casa Sur

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Chipa, com fécula de mandioca e leite na massa.Foto: Divulgação

Receita de Emiliano Sittner, do hotel Casa Sur

Rendimento: 50 unidades
Tempo de preparo: 40 minutos

Ingredientes

250 g de fécula de mandioca
250 g de amido de milho
250 g de parmesão ralado
250 g de queijo fresco ralado
3 ovos
100 g de manteiga
½ colher de sopa de fermento em pó
¼ de xícara de leite
1 pitada de sal

Modo de Preparo

1. Com o fouet, bata os ovos com os ingredientes secos.

2. Incorpore os queijos e junte a manteiga e o leite. Por fim, misture o fermento.

3. Disponha colheradas da massa na assadeira.

4. Leve para assar em forno preaquecido a 180°C, de preferência com grill, até dourar levemente.

Telha de pão de queijo

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Receita de Caio Soter, dos restaurantes Pacato e O Jardim

Rendimento: 4 telhas de 30 cm x 40 cm, em média
Tempo de preparo: 40 minutos

Ingredientes

100 g de queijo da Canastra curado
120 g de queijo minas padrão
165 g de polvilho azedo
85 g de polvilho doce
400 ml de leite integral
50 ml de óleo de sua preferência
10 g de sal
3 ovos caipiras

Modo de preparo

1. Em um recipiente grande, coloque o sal e o polvilho. Misture e reserve para mais tarde.

2. Coloque o leite e o óleo para ferver em uma panela. Assim que levantar fervura, misture bem com um fouet até ficar homogêneo.

3. Agora, comece o processo mais importante do pão de queijo: escaldar o polvilho! Aos poucos, acrescente o líquido ao polvilho e sal reservados. O ideal é ir misturando ao mesmo tempo com uma colher de pau.

4. Quando esfriar um pouco, misture com as mãos até a massa ficar homogênea. Deixe descansar por 10 minutos.

5. Rale os queijos no lado grosso do ralador e misture à massa. Em seguida, adicione os ovos, um por vez. Amasse tudo usando a palma da mão até ficar sem nenhum bloquinho de polvilho.

6. Abra a massa em cima de um silpat (tapete de silicone). Coloque filme plástico sobre ela e abra com um rolo, assim ela não gruda.

7. Preaqueça o forno a 180°C e coloque a telha para assar por cerca de 10-15 minutos.

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