Nada do que foi será

Após três meses de lockdown, a vida e o comércio em Paris retomam suas atividades com a certeza da necessidade por mudanças no comportamento de consumo.


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Depois de quase três meses de lockdown, Paris está desconfinada desde o dia 15 de junho. Aos poucos a cidade acorda para uma vida quase normal, já que a Covid-19 arrefeceu fortemente em todo o país, mas ainda não foi embora e ninguém sabe quando irá e se não voltará em breve. Nas redes sociais viralizam imagens de bares lotados e festas animadas em parques e apartamentos. A realidade, contudo, é um pouco diferente. O clima é como de férias, com comércio com baixo movimento e ruas quase vazias.

Nas lojas e metrôs, o uso de máscaras é obrigatório. Nas ruas, não. O álcool gel também está por toda parte: na entrada das lojas, ao lado dos caixas, nas paradas de ônibus. Na mais importante avenida da cidade, a Champs Elysées, o fluxo de gente é fraco e poucas pessoas entram e saem das lojas, seja Louis Vuitton, Dior, Zara ou H&M. Já na avenida Montaigne, passarela de fashionistas, celebridades e socialites, nada delas. O que mais se vê é uma atípica invasão adolescente, seja para passear, fazer fila na porta da Gucci ou buscar a reedição da bolsa de náilon criada pela Prada em 2005. A grande Galeries Lafayette, com seus 70 mil metros quadrados distribuídos em três prédios, também já está com as portas abertas – e com descontos em grande parte dos produtos.


Conhecidos por serem fortemente reflexivos, os parisienses ainda estão desconfiados para sair às ruas gastando. Com restrições de viagens e proibição da entrada de passageiros vindos de países como EUA, Brasil e China, o turismo também está em baixa. Cerca de 90% do movimento de grande parte das marcas de luxo vem dos turistas.

Pesquisa feita pela empresa OpinionWay revelou que apenas 25% da população francesa lamentou o fechamento das lojas durante o confinamento. Eles preferiam ver os parentes (73%), dar uma volta e visitar amigos (49%), ir a um restaurante (45%). Com a reabertura do comércio, 60% dos entrevistados estimam que voltarão a buscar seus produtos preferidos exatamente como faziam antes, 7% querem comprar mais, e 33% dizem exatamente o contrário.

A pesquisa também revelou que 41% dos franceses estão convencidos de que levará tempo para recuperar seus hábitos e 25% pensam que deveriam desistir de alguns deles. Outros 69% planejam consumir de forma diferente, com mais responsabilidade, ou seja, vem aí uma possível mudança de hábitos.

Para entender melhor os humores e anseios de uma cidade em fase de recuperação, conversamos com empreendedores de pequenas marcas sobre o atual cenário da moda, do consumo e da vida em Paris. Confira:

Charlotte Calixte, fundadora e designer da marca de sapatos Dondoks

Quais são suas resoluções em relação ao consumo durante e depois da pandemia?

Já estava consciente sobre como consumir menos e melhor nos últimos anos. Depois de ter visto o documentário “The true cost”, sobre o fast fashion e a realidade do consumo de massa, tive um wake up call e decidi nunca mais entrar numa loja H&M. A pandemia e a quarentena só acentuou o meu desejo de focar no essencial.


Como você está passando por esse momento de pandemia com a Infitiny?

É um momento muito delicado. Eu estava prestes a abrir uma nova loja, num espaço maior. Tudo isso aconteceu na hora que a Covid-19 apareceu e agora temos que esperar. Enquanto isso, estou desenvolvendo minha plataforma online.

Quais são os principais desafios para você neste momento?

As pessoas estão com uma necessidade muito grande de sair, de se encontrar, de curtir a família, os amigos. Ao mesmo tempo é tudo muito estranho. Sinto que a economia e a maneira de consumir foi muito afetada. Tudo que está sendo comprado é muito básico, essencial. É muito difícil para nós, designers independentes, viver sem o turismo. Ele é fundamental para uma marca jovem e esse é um dos motivos pelo qual nos instalamos em Paris. Temos acesso a uma clientela muito variada. Agora, tudo está muito complicado, porque o custo de vida é muito alto para se manter sem aquela mesma fonte de renda.

O que você acha que vai ser da moda parisiense daqui para frente?

A cidade é uma grande vitrine para o mundo da moda. Acho que a tendência, daqui para frente, será uma redução no volume de coleções e de todos os excessos com os quais estávamos acostumados. Acredito que precisamos dar uma parada nisso e focar ainda mais na qualidade e em tentar entender o que o consumidor precisa de fato.

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