Recorte & cole: saiba mais sobre a tendência manual do momento

Na passarela, no feed e na arte, a colagem desponta como uma das expressões criativas mais conectadas com o nosso tempo.


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Matt Bovan Foto: Divulgação



Quando começou a se popularizar no início do século 20, pelas mãos de Pablo Picasso e George Braque, a colagem se tornou uma interessante forma de expressão artística. Desde então, sua evolução foi intensa e seus conceitos permearam toda a seara e produção cultural. Hoje, pode-se até dizer que é o principal modus operandi criativo. Você já deve ter ouvido a história de que nada se cria, tudo se copia. Ou que a novidade é superestimada e inatingível em sua forma mais pura.

É sobre isso que escrevem Aaron Rose e Mandy Kahn no livro Collage Culture: Examining the 21st Century’s Identity Crisis, de 2011. Segundo os autores, todo e qualquer produto cultural e artístico, atualmente, é composto de uma série de camadas e elementos do passado. Ou seja, tudo que vemos e consumimos é uma mistura louca do que antes. É tudo uma grande colagem. E não só esteticamente, conceitual também.

“Acredito que a colagem, além da técnica, é também uma linha de pensamento criativo”, diz o designer e diretor de arte à frente da Spred Studio, Marcos Mendonça. “Sou responsável pela direção artística e pela criação de diversas marcas. Em cada uma das etapas, consigo enxergar a colagem presente. Tudo se resume ao recorte de referências e à justaposição de elementos para criar uma nova arte ou peça”, continua.

Colagem de Marcos Mendon\u00e7a.

Colagem de Marcos Mendonça.

Para a colagista e também designer Domitila de Paulo, “é como se fosse uma produção de camadas de linguagens, referências e narrativas. É um compilado do tempo, de comportamento e de expressões. Tanto de estrutura social, território e identidades individuais ou coletivas. É a soma de significados”. Formada em design de moda, a artista mineira já trabalha com a técnica há algum tempo. “Fazia colagens tanto para os painéis de pesquisa quanto para a ilustração de moda. Aos poucos, fui me aprofundando no assunto e isso resultou em uma expressão criativa própria, não em função de algo”, explica.

Sob um olhar mais amplo, essa ideia já vem sendo desdobrada há um bom tempo em nossos feeds. A internet foi um catalisador potente para o liquidificador de referências que resulta nas imagens que nos impactam a cada segundo. E com a pandemia, mais ainda. A privação de contato social mais todas as limitações e impactos causados pela crise sanitária, implicaram em uma série de novas perspectivas sobre o tema.

O primeiro deles é de ordem prática. A colagem tem, em sua essência, a manualidade. E, como se sabe, trabalhos manuais estão em alta neste período. Devido a sua simplicidade, houve um grande boom de colagens (no caso, as literais) inundando as redes sociais por meio de postagens de entusiastas, artistas e alguns tutoriais.

Colagem de PV.

Colagem de PV.

“O fazer com as mãos, é capaz de criar muitas coisas interessantes” diz o artista Paulo Victor Tavares (aka PV), um dos fundadores do coletivo Sociedade Brasileira de Colagem, ao lado de Sacha Senger e Fabiana Lopes, as colagens se popularizaram durante a pandemia, justamente pela manualidade. “Vivemos um boom digital na década de 1990 e início dos anos 2000. Acredito que as pessoas sentiram falta do contato com o manual. Por isso, estamos vendo o interesse por tantas técnicas artesanais no momento”, completa.

Recorta e cola, ou melhor, costura

Com o renovado interesse por trabalhos manuais, estéticas que estavam adormecidas também voltaram com força às passarelas. É o caso do patchwork, que se assemelha muito às colagens. A técnica consiste em um uma junção de peças de tecido de várias cores, tipos e formas, costuradas entre si, formando desenhos geométricos ou padrões aleatórios.

Porém, com fornecimento de tecidos prejudicado pelas restrições pandêmicas, muita marca precisou se virar com o que havia no estoque. A ideia não é mais tão absurda quanto antigamente. Circularidade é um dos temas mais urgentes e com mais rápido e amplo potencial de assimilação pela indústria.

Em sua estreia na Chloé, a diretora de criação Gabriela Hearst usou retalhos de coleções antigas e partes de peças esquecidas no acervo da maison para criar roupas completamente novas. De forma similar, a estilista Marine Serre também se valeu de sobras encontradas em seu ateliê para dar vida ao inverno 2021 de sua grife homônima. Na Coach, Stuart Vevers foi pelo mesmo caminho. E, na Marni, o diretor criativo Francesco Risso confeccionou 25 casacos feitos a partir de peças paradas no estoque. Marcas como a Chopova Lowena e Salvatore Ferragmo também apostaram no estilo, em suas coleções de verão 2021.

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