SPFW sem filtro: Rocio Canvas, Ateliê Mão de Mãe, Martins, Handred e Ellus

Com filtragem inversamente proporcional à progressão do evento, o time ELLE comenta os bastidores e os principais desfiles do terceiro dia da semana de moda.


MartinsSPFW n54Foto Marcelo Soubhia @agfotosite 4



É, queridos leitores, a vida é trem-bala. Só porque falei sobre a verborragia conceitual de alguns estilistas no resumo sem filtro de ontem, o terceiro dia da São Paulo Fashion Week foi especialmente seco de conteúdo. 

Não que isso seja um problema, pelo contrário. Objetividade é tudo em tempos de sem tempo irmão. Assim como uma boa pesquisa e narrativas com influências mil também são excelentes (o que não significa que precisam sempre ser compartilhadas na íntegra ou sem edição). No fim, o que importa é roupa. Se ela for boa de verdade, não precisa de maiores explicações.

Ah, e para quem pediu para continuar com as informações do trânsito de São Paulo, hoje tava pior ainda. Pelo menos não teve tanto vai e vem em horário de pico. Mas tá, vamos ao que interessa.

No Komplexo Tempo, quem abriu a tarde foi Diego Malicheski, da marca Rocio Canvas – sim, amigos, Rocio (pronuncia-se rocío) não é o primeiro nome do estilista, é o nome do meio de sua mãe, uma das pessoas que mais o incentivou a seguir carreira na moda.

No camarim, no momento exato em que o desfile estava marcado para começar (aparentemente atrasos de quase duas horas são tendência nesta temporada),  o diretor criativo estava mostrando para o influenciador Arthur Freixo como um trench coat da coleção podia ser usado de diferentes maneiras. Isso é um dos pontos altos de seu inverno 2023.

Arthur também perguntou o que inspirava Diego. E a resposta foi bastante sucinta, apesar dos vários exemplos: o cotidiano. É que a moda da Rocio Canvas sempre prezou pela simplicidade visual. A alfaiataria é a base de quase tudo, mas o estilista gosta de experimentar com modelagens e construções mais ousadas.

Nem sempre dá certo. No desfile desta sexta-feira, 18.11, algumas saias com tiras de tecidos mostram mais do que o desejado e alguns volumes aparecem meio desajeitados, atrapalhando a proporção ou quebrando a silhueta.

Faz cerca de um ano que Diego abriu a primeira loja da Rocio Canvas e, segundo o próprio, isso impactou bastante seu processo criativo. Ele diz que o diálogo com as clientes o ajudaram a abrir mão de algumas coisas e prestar mais atenção em outras. Apesar dos escorregões, é algo visível na passarela. Principalmente quando consideramos o todo, com opções mais práticas e possíveis para o dia a dia.

 

A Ateliê Mão de Mãe, de Vinicius Santanna e Patrick Fortuna, segue crescendo vertiginosamente. A coleção desfilada hoje na SPFW é uma continuação daquela apresentada em Milão, meses atrás. Sim, internacionais, queridas. 

O ponto de partida é a planta Abre Caminho, conhecida por seus poderes medicinais e espirituais – daí o vasinho carregado por uma das modelos. O crochê segue como principal destaque, agora trabalhado em novos pontos, texturas, relevos e até com aparência de renda.  Eles cobrem blusas, camisas pólo, vestidos, calças, maiôs e biquínis em combinações de cores fortes, bem no estilo da dupla. 

A técnica não funciona muito bem em todos os looks, mas o saldo é mais positivo do que negativo. Outra novidade são as estampas, as primeiras da marca. Uma delas é uma padronagem que imita um crochê e a outra, uma versão aquarela da flor de lavanda. 

 

Quem também mostrou uma boa evolução nesta temporada foi Tom Martins. Na verdade, o que a gente viu talvez seja sua melhor coleção já apresentada até aqui. A repórter Lelê Santhana fala mais, ó: 

“Combinar as mais diferentes referências em uma só coleção já é costume antigo no trabalho da Martins. Embora antes nem sempre estivessem conectadas uma às outras, dessa vez, o impulso nasce de quatro filmes adolescentes relacionados: Meninas Malvadas, Patricinhas de Beverly Hills, Legalmente Loira e Jovens Bruxas.

Engana-se, porém, quem imagina uma tradução literal das cenas dos longas. Há bastante ironia permeando toda coleção. As calças cargo e cuecas, por exemplo, surgem em referência a um diálogo de Patricinhas de Beverly Hills, em que as personagens dizem desaprovar o uso das peças.

Em termos de design, essa é a primeira vez que a marca apresenta peças de alfaiataria. Uma adição bem-vinda que colabora com a construção da imagem colegial desejada. As estampas exclusivas e os plissados também se destacam. A vontade, agora, é rever look por look, buscando cada referência.”

E tá aí um bom exemplo de uma coleção focada em produto e nada chata. E o gosto cinematográfico de Tom Martins merece menção honrosa. Praticamente todos os seus desfiles trazem alguma inspiração desse mundo. E quase sempre de grandes hits.

Mudando um pouco de assunto agora, mas nem tanto… Desde que a Handred estreou na SPFW, fala-se sobre um dilema antigo: qual é a necessidade de uma marca focada em básicos ou clássicos revisitados desfilar numa semana de moda? Demorou um tanto para o diretor criativo André Namitala validar sua tese. Hoje, contudo, a presença da etiqueta carioca no evento faz todo sentido.

A repórter Giuliana Mesquita fala mais:

“Para comemorar seu aniversário de 10 anos, a Handred decidiu olhar para Santa Teresa, o bairro boêmio e artístico do Rio de Janeiro – ‘muito diferente de onde eu cresci’, explica André Namitala. De lá, ele traz as estampas de paisagem e paralelepípedos que decoram vestidos coluna com babados na barra.

Outra inspiração visível são os anos 1920, que trazem esse ar de celebração em franjas de canutilhos e no dourado que permeia boa parte da coleção. Nesta estação, André olha especialmente para as estruturas e partes de baixo das roupas, criando volumes através de tule de armação e anáguas. Ele conta que usou até técnicas de vestido de noiva na construção das roupas.

O destaque, no entanto, não fica para a novidade volumosa e, sim, para o que o estilista faz de melhor: roupas fluídas, levinhas, com tecidos naturais e com cara de fim de tarde carioca. Apesar dos excessos de bordados e dourados, é ali que a Handred brilha.”

E para encerrar um dia bastante longo (que a gente imaginou que seria mais longo ainda), migramos para o hotel Rosewood, na Bela Vista. Foi lá que a Ellus desfilou a coleção que celebra seus 50 anos. Feito bastante louvável, ainda mais em terras brasileiras, e sobre o qual falamos no Volume 09 da ELLE impressa.

 

Antes de entrar na apresentação, vale ressaltar o pânico, desespero e ansiedade de quem está acompanhando todos os desfiles in loco. Com atrasos gigantescos, todo mundo pensou que a primeira modelo só entraria na passarela quase no dia seguinte, depois da meia noite.

Ainda bem que a marca teve a sensatez (e aqui vai um grande MUITO OBRIGADO) de não bookar modelos que estivessem no desfile anterior, o da Handred, na Mooca. No fim, o show começou com os costumeiros 30 minutos de atraso. 

Mas voltando às modas… Pense em jeans. Mas muito jeans. Muito mesmo. Lavado, escuro, estonado, rasgado, com bolsos cargo, estrutura de corset, jaquetas, calças, bermudas, camisas e mais um tanto de coisas. Foi assim que a Ellus comemorou seu cinquentenário.

E nada mais justo. Afinal, foi com um jeans e uma camiseta que a etiqueta ganhou fama, lá em 1972. De lá pra cá, a coisa mudou um tanto. A empresa cresceu, não só estruturalmente como também em oferta de moda. Mas nunca sem perder o estilo irreverente, meio rocker e sempre sexy. Daí as transparências, as variações de jaquetas perfecto, as camisetas tipo de banda, os comprimentos mini, os recortes e decotes.

Sempre bem alinhada às vontades do momento, entra em cena um boa dose de alfaiataria, com destaque para os casacos de lã, combinação perfeita para as peças com aparência surrada – outra forte tendência de agora.

Com uma das melhores trilhas da temporada (pelo menos até agora), a apresentação ainda contou com celebridades nacionais e internacionais. De fora, veio Fernando Casablancas, filho de John Casablancas, o lendário fundador da Elite Model (a marca sempre curtiu um flerte com nomes quentes da moda gringa). E do solo nacional, teve Jade Picon, toda brilhante, lembrando de toda relação da etiqueta com a noite.

Deu até vontade de ficar para a festa. A pista parecia promissora. Porém… Ossos do ofício que chama.

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