Se você fizer ao Google a pergunta que dá título a esta reportagem, o primeiro resultado, curiosamente, já revela o patamar no qual a discussão sobre beleza se encontra no senso comum. Isso porque existe um documentário de mesmo nome (em inglês, Why beauty matters?), de 2009, idealizado pela BBC, no qual o filósofo conservador britânico Roger Scruton defende a ideia de que a beleza foi abandonada pela arte contemporânea para dar lugar a um suposto culto ao feio, que retira da arte a sua função original: oferecer uma válvula de escape da realidade, tornando-a menos dura. Ele condena as frentes modernistas e defende a retomada dos ideais clássicos a respeito do belo.
Kanioko
Congele essa imagem e vamos um pouco mais fundo nessa pesquisa digital. No YouTube, uma série de criadores de conteúdo relacionado à filosofia ganharam a alcunha de “LeftTube” (em tradução livre, algo como o “YouTube da esquerda”). Um dos nomes mais proeminentes dessa turma é o também britânico Oliver Thorn. O jovem de 27 anos, durante a pandemia, publicou em seu canal (Philosophy Tube, com mais de 600 mil inscritos) um vídeo de tema similar chamado Beauty in Ugly Times (A Beleza em Tempos Feios), que se dedica ao tema abordado por Scruton: uma tentativa de responder à pergunta “o que é beleza?”.
Mesmo seu pensamento sendo oposto ao do conservador Scruton, todo o referencial do youtuber é de grandes pensadores da filosofia ocidental. Immanuel Kant, Umberto Eco e até Aristóteles entram em cena. Em comum, esses homens dividem uma experiência de vida cisgênero, masculina e branca. Mesmo a beleza sendo um conceito que se estende para além da arte e atinge diretamente a vida de pessoas bem diferentes das características demográficas representadas por esse grupo de filósofos, aparentemente, na filosofia ocidental, as teorias mais ouvidas e disseminadas a respeito do tema são deles.
“A estética é um campo muito aberto, e geralmente, em uma sociedade opressora que hierarquiza as pessoas, quem está no topo é quem decide o que é belo”, aponta Joice Berth, escritora, colunista da ELLE Brasil e autora do livro Empoderamento (2019, Coleção Feminismos Plurais, Ed. Pólen Livros). “Por mais que o velho ditado popular ‘o que é bonito para você não necessariamente é bonito para mim’ tenha certa veracidade, existem estímulos sociais para que nós vejamos certos padrões como exemplos de beleza universal”, completa Vinícius Rodrigues, mestre em Ciências Sociais pela PUC-SP e pesquisador nas áreas de Marcadores Sociais da Diferença e Cultura Africana e Afrobrasileira.
Rapha da Cruz, maquiadora e educadora de beleza da Escola Madre (na qual ministra, ao lado de Magô Tonhon, cursos como Beleza É diversidade, que terá novos turmas ainda este trimestre) nos relembra qual padrão de beleza é esse o criado pelas estruturas opressivas da sociedade: “O belo é magro, quase sempre branco. Carrega certas feições e está sempre polido com o esmalte do dinheiro. O belo tem dentes perfeitos que foram corrigidos desde cedo, uma pele uniforme que frequenta dermatologista. O belo se veste bem, com vestes que aparentam riqueza, que denotam classe. O belo é esguio e ereto, se move como quem estudou balé na infância. E por mais que a moda, vanguardista como adora ser, busque fugir dos padrões para se mostrar à frente e assim, volta e meia, debruce seu olhar sobre o que julga exótico, o que estava posto, segue posto. Coisas mudam para caber em interesses maiores e mais vendáveis”.
E não é novidade para ninguém que apenas uma parcela ínfima da população preenche todos esses requisitos. Mas é aí que surgem perguntas importantes. Por que, ainda assim, o olhar da maioria e o debate a respeito do conceito de beleza continuam tão brancos, magros, heteronormativos e cisgêneros? Qual é o serviço prestado por esses padrões inalcançáveis para as estruturas de poder? E mais: como viver à sombra do paradoxo entre a liberdade proporcionada pela quebra de tais ideais e a rejeição e a exclusão social que essa desobediência acarreta? Esta é uma conversa extensa, complexa e desafiadora que, evidentemente, não termina na última linha desta reportagem. No entanto, as perspectivas aqui apresentadas fogem à regra hegemônica e abrem possibilidades menos limitantes e menos violentas de beleza. Nesse intuito, vamos viajar ao Brasil Colônia (que está mais próximo e mais presente do que se imagina) e adentrar os terrenos da Psicanálise, da Antropologia, da Sociologia e da Filosofia, mas, dessa vez, Scruton e seus amigos não estão convidados.
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Atrás da cortina
No decorrer do século 20, a maior fonte de informação sobre beleza eram as revistas femininas. E é evidente que o conteúdo da maioria das páginas dessas publicações seguia à risca a cartilha dos padrões de beleza hegemônicos. Voltando à nossa primeira pesquisa no Google, não raro encontramos hoje artigos que atacam a mídia impressa pelo seu papel na disseminação de valores excludentes. E eles estão certos. Contudo, atualmente, a imprensa de beleza já não tem mais tanto poder quanto antes, e, mesmo em um mundo muito mais digital, comparações pouco saudáveis entre o que vemos no espelho e o que está no Instagram ainda povoam a mente de boa parte da população, principalmente das mulheres. Um estudo australiano feito em parceria entre a Universidade de Nova Gales do Sul (UNSW Sydney) e a Universidade de Sydney relata que essas comparações podem até ser mais nocivas, uma vez que a proximidade que temos com quem seguimos nas redes sociais adiciona uma camada extra de pressão social.
De forma alguma o intuito é eximir a responsabilidade da mídia tradicional na veiculação de padrões de beleza ou de diminuir a importância da diversidade de vozes trazidas pela internet. Mas, considerando essa mudança no eixo da comunicação mundial, já não era tempo da discussão a respeito de beleza ter alcançado um novo sentido no senso comum? Por que, por exemplo, a característica mais valorizada e esperada de uma mulher nos Estados Unidos ainda é a aparência física, como revela pesquisa publicada em 2017 pelo Pew Research Center? Joice Berth leva a discussão além: “Apesar de não ser a criadora desses conceitos, a mídia acaba entrando nessa lógica. Se você pensar que a imagem da Marilyn Monroe até hoje segue no imaginário de populações de quase todo o mundo, fica evidente que esse é um plano do capitalismo patriarcal-supremacista para aprisionar pessoas. Enquanto esse padrão existir, todo mundo que não se encaixa nele vai fazer o que pode para conseguir chegar lá. E, nessa jornada, essas pessoas vão consumir tudo o que o mercado oferece na promessa da beleza”.
Rapha da Cruz lembra que até ocorrem variações nesses padrões, mas sempre para a manutenção de privilégios de certa camada da população e de estender a distância entre o real e o ideal. “Já foi desejável ter a pele alva e usava-se pó de arroz para demarcar que não se trabalhava ao sol, como um vassalo. Muito tempo depois, quando estavam todos trancados em fábricas trabalhando distantes do sol, a pele bronzeada se torna status de quem pode se queimar na praia”, exemplifica. “Os padrões colaboram para a marginalização dos corpos que fogem a esses preceitos da norma. E os efeitos são devastadores, doentes, e guiam o lastro de desencontro no qual a humanidade se firma cada vez mais. E fala-se sempre de poder.”
Às vezes, esses efeitos atingem as pessoas tão gravemente que nem mesmo o contato com discursos, teorias e pensamentos não normativos é capaz de curá-las de imediato. “Vai sempre haver um jogo entre a cultura dominante, a sociedade e o desenvolvimento subjetivo do indivíduo. Você pode fazer parte de um contexto progressista, nascer em um ambiente em que a liberdade e a igualdade estão sempre em pauta e, ainda assim, ter vivido diferentes experiências de opressão ao longo do seu desenvolvimento, e vice-versa. As múltiplas formas que pode tomar esse conflito acabam se tornando fundamento para a maneira como cada um de nós se coloca no mundo”, explica a psicanalista Vivian Whiteman, que é também colunista e editora especial da ELLE Brasil. Isso posto, resta a pergunta: como, então, escapar dessa armadilha tão bem engendrada pelas estruturas de poder? Para tentar responder, primeiro é preciso olhar para a questão sob uma perspectiva mais ampla. E isso envolve se lembrar das noções coloniais que ainda regem tantas sociedades ocidentais. Mas, em especial, vamos focar no Brasil.
“Nenhuma raça possui o monopólio da beleza, da inteligência e da força”, Aimé Césaire, poeta francês
Segundo Vinícius Rodrigues, em sociedades marcadas por colonizações e colonialismos (como é o caso do Brasil), a beleza também será entendida sob uma perspectiva colonial: “Essa é, basicamente, a história do Ocidente e de nós, os ocidentalizados. A beleza está relacionada ao quão próximo da fenotipia europeia uma determinada pessoa está. Assim, o feio é todo aquele que se afasta disso: o negro, o indígena, o asiático (em menor grau) etc.” A beleza, diz ele, abre portas e garante inserção e maior mobilidade social para a branquitude, uma vez que é definida por seus traços físicos e concebida por seus valores. “A construção social racista que recaí sob corpos negros, por exemplo, associa negritude a feiura e perigo. Há toda uma educação do gosto e do olhar que opera esse tipo de conduta.” Para o pesquisador, o caminho para a mudança está na educação e na despolarização de conceitos opostos. Joice arremata o pensamento ao nos lembrar da associação automática que se faz entre beleza e valor pessoal ao longo da História e na pós-modernidade: “Quem é entendido como bonito é também entendido como bom. Basta olhar para a atuação da polícia que, frente a uma pessoa negra, imediatamente a coloca na posição de malfeitor, criminoso ou vilão. As pessoas brancas, no entanto, não passam por isso. Quanto mais afastado alguém se encontra desses ideais, mais pesados são os estigmas da desvalorização e da desumanização”. A escritora Neusa Santos Souza, um dos principais nomes do pensamento antirracista no Brasil, ajuda a desvendar a percepção social da branquitude em seu livro Tornar-se negro, de 1983: “O belo, o bom, o justo, o verdadeiro são brancos. O branco, a brancura, são os únicos artífices e legítimos herdeiros do progresso e do desenvolvimento do homem. Eles são a cultura, a civilização, em uma palavra, a ‘humanidade'”.
Aprofundando-se na consequência dessas concepções, a escritora, psicóloga e teórica portuguesa Grada Kilomba cita Frantz Fanon, francês da Martinica, pensador fundamental dos Estudos Pós-Coloniais, Teoria Crítica e Marxismo. “Fanon usa a linguagem do trauma, como a maioria das pessoas negras o faz, quando fala sobre experiências cotidianas de racismo, indicando o doloroso impacto corporal e a perda característica de um colapso traumático. Pois, no racismo, o indivíduo é cirurgicamente retirado e violentamente separado de qualquer identidade que ela/ele possa realmente ter”, escreveu em Memórias da Plantação (2008). Por isso, a importância da internalização do pensamento decolonial. “Em oposição ao pensamento colonial, o pensamento decolonial busca romper com as amarras do colonialismo impostas por tantos séculos. É a ideia de ouvir outras narrativas. Entender esse personagem ‘outro’ na sociedade, que sempre o coloca em um lugar de subalterno. É a pluralidade e a diversidade na contramão dessa exploração de um indivíduo sobre o outro”, explica Hanayrá Negreiros, pesquisadora e educadora especializada em modas negras e colunista da ELLE Brasil. De acordo com ela, é a partir dessa perspectiva que se manifesta a proposta de uma beleza também decolonial. “E, dentro dela, cabem as belezas negras, indígenas, gordas, queer etc. Todos os segmentos que o colonialismo vai colocar na chave do exótico, esvaziando essas narrativas.”
Junto de Rapha da Cruz, a mestre em Filosofia pela USP Magô Tonhon compõe a dupla LGBeauté e trabalha como consultora em diversidade desde 2016, treinando equipes de diferentes empresas. Para ela, a beleza é uma categoria em disputa. “Levantar-se orgulhosa, mesmo depois de tantos esforços para nos resumir ao feio, indesejável e até doentio – como nos casos das identidades de gênero não cis (homens e mulheres trans, travestis, pessoas trans não binárias, pessoas interssexo) – é um ato político: comunicar que somos mais que isso, que jamais seremos reduzidas ao que tentaram nos impor como limite.” Não à toa, é de sua autoria o projeto #PelePossível, que levanta o debate nas redes sociais. “Tem a ver com não enxergar a pele como uma tela em branco, mas como um abarrotado de conteúdo que aqueles que pensam pelo viés da beleza hegemônica têm dificuldade de enxergar. Isso que se produz como beleza única e desejável atualmente, apesar das concessões caridosas dos últimos tempos, é um problema de validação identitária enquanto se oculta a(s) identidade(s) que é (são) reflexo da norma”, diz Magô. “Ou o conceito de beleza se esgarça e toma outra forma, ou cabe a nós criar outra categoria. Enquanto a beleza estiver relacionada somente a corpos que são o avesso do meu e, portanto, uma ferramenta de produzir auto-ódio, beleza não existe.”
“A educação tem um papel importante que pode nos ajudar a entender essas outras belezas”, diz Hanayrá. “Se estudássemos decolonialismo nas escolas, talvez conseguíssemos reverter esse cenário.” Nesse sentido, ela indica autores como Aníbal Quijano, bell hooks, Angela Davis e, no Brasil, Lélia Gonzalez, Ailton Krenak e Maria Beatriz Nascimento. “Além disso, ter uma mídia que se coloque na contramão e traga outras vozes, ou seja, possibilite que pesquisadores e autores de fora do establishment participem de entrevistas ou, até mesmo, escrevam as suas próprias histórias, é muito importante.”
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Através do espelho
As reformas sugeridas pelo pensamento decolonial, evidentemente, não acontecem em um estalar de dedos. Trata-se de um conjunto de ideias radicalmente avessas ao sistema em que vivemos e que, exatamente por isso, sofrem retaliações e desmontes por diversas forças externas. Dessa forma, resta àqueles que não se encaixam no 1% da população que corresponde ao padrão de beleza encontrar maneiras de manter-se vivos e sãos em um mundo que planeja o extermínio não só físico, mas subjetivo desses indivíduos. E, para isso, retomamos o conceito de empoderamento de Joice Berth. Não é o empoderamento visto sob a perspectiva liberal, que promove facilidades que influenciam individualmente a vida de alguém. É o empoderamento de viés social, que propõe a recuperação de poderes perdidos por grupos minoritários em um sistema de opressão, explica a autora. “É um instrumento de luta social que parte do sujeito, mas passa sempre pelo coletivo. É uma simbiose, uma troca entre esses dois agentes.”
Na questão da beleza, diz Joice, o empoderamento passa não só pela aceitação da imagem, mas também pelo trabalho de resgate e do entendimento da autoestima como algo muito mais profundo: “É a construção da sua relação com você mesma que, em certa medida, vai lhe tornar independente da validação da sociedade. Quando você desenvolve a sua autoestima, a opinião do outro até tem a sua importância, mas a sua tem muito mais, porque você é a maior autoridade sobre sua própria vida.” Em seu livro, Joice cita a pensadora estadunidense Patricia Hill Collins, que fala sobre autodeterminação, ou seja, a ideia de que você é quem diz quem você é. Nesse sentido, a autoestima ganha força até mesmo política: “Ela lhe dá a possibilidade de você mesma narrar a sua história”. Um ponto importante, ressalta Joice, é fazer a distinção entre autoestima e vaidade. Esta última exige uma perfeição que não existe, está conectada aos ideais do ego, que são quase sempre superficiais e ilusórios – principalmente quando os padrões de aceitabilidade são rígidos e restritivos. A autoestima vai muito além: “É você se saber um ser imperfeito e estar disposto a trabalhar as suas imperfeições e, nem por isso, deixar de gostar de quem você é ou deixar de se relacionar com você de uma maneira positiva”.
Antes de mais nada, é importante lembrar que a jornada rumo a uma autoestima elevada leva tempo. “Eu demorei muito para chegar a fazer as considerações que faço hoje em dia”, conta Joice Berth. É preciso ter paciência, coragem e saber que esse encontro consigo mesmo também vai doer, avisa ela. “Fica o meu apelo para que as pessoas, principalmente as mulheres, a negritude e a população LGBTQIA+ enfrentem esse desafio. Eu sou uma mulher negra em um mundo ainda racista: o natural é que as pessoas me rejeitem sem que eu nem abra a boca. Então, é libertador não estar mais condicionada ao que o outro pensa de mim.”
Não existe, contudo, uma receita de bolo para conquistar essa segurança interior. “É praticamente impossível dar uma resposta concreta para a pergunta de como fortalecer a autoestima, porque trata-se de uma construção que vai se conectar com diferentes pontos da história e do desenvolvimento de um indivíduo”, diz Vivian Whiteman. “O que a psicanálise tenta recuperar é exatamente a história pessoal, não só pela perspectiva dos fatos, mas do efeito que eles causaram nesse sujeito, de como ele pode contar e recontar essa história, numa aposta de escuta do inconsciente. E isso, claro, é relativo. As pessoas reagem, inclusive a experiências traumáticas, de maneiras muito diferentes. E a cultura e a lei também vão trazer elementos que reforçam certas experiências negativas, assim como criam e fortalecem opressões estruturais. O racismo opera também nessa ordem, por exemplo.” Vivian faz referência à obra da francesa Françoise Dolto, da diferenciação que ela faz entre esquema corporal e imagem do corpo. “Existe um corpo que é dividido por todos nós enquanto espécie. Mesmo com diferenças, ela parte do princípio de que existe um esquema corporal que lhe permite funcionar. O que é totalmente diferente da imagem do corpo que, para Dolto, em sua maior parte, é uma imagem inconsciente desse corpo. Essa é uma imagem que vai ser formada desde o nascimento e vai sofrendo uma série de interferências de todo tipo.”
E, como Joice já explicou, transformar ideias criadas no inconsciente não é tarefa simples. O que significa que o contato com o pensamento decolonial e com as narrativas corporais não normativas não garante a catarse imediata em frente ao espelho. “Essas ideias simplistas de ‘passo a passo’ de autoestima que circulam nas redes, infelizmente, não surtem muito efeito quando quem passa por elas, na verdade, tem questões inconscientes, que podem ser traumáticas, para enfrentar. A psicanálise aposta num acesso via palavra, que pode acontecer ali na transferência entre analista e analisando. Mas não existe uma garantia de desempenho, um comprou-levou, é um processo”, completa Vivian, que ressalta que nem por isso o contato com essas temáticas na mídia é inútil: “Às vezes em uma reportagem pode ser a primeira vez que alguém vai ler sobre questões que o mobilizam. Acontece muito. E talvez o reconhecimento externo desse sofrimento possa levar a pessoa a questionar sua vida. É isso que eu acho bonito da psicanálise, especialmente da que considera o social, da que batalha pelo acesso. Ela ouve a subjetividade sem desconsiderar o seu contexto e, acima de tudo, aposta que há algo que o sujeito possa fazer, algo que tem potencial criativo”.
Por fim, fechamos a reportagem, mas não as reflexões, com a proposta trazida por Joice sobre uma nova beleza que, sim, se vale da imagem, mas não para por aí. Que funciona como um convite para o aprofundamento e não como um ponto final, que se impõe antes mesmo de a frase começar. Uma beleza que se pauta pela autenticidade e pela autonomia dos sujeitos. Que não reduz, mas amplia. “A imagem, por vezes, passa informações que não cabem à realidade. A gente tem de sempre desconfiar daquilo que está vendo, ir além, conhecer as pessoas de fato, entender o que elas representam e até que ponto conseguimos ter uma interação social bacana. Que trocas podemos estabelecer entre nós? É isso que eu acredito que deve liderar as nossas aproximações e os nossos afetos. E, aí, acho que teríamos uma sociedade mais sincera, mais encantadora e mais verdadeira.”