O novo vintage de novo

Marcas, stylists e fashionistas olham para o passado de forma nostálgica, em busca de conforto, exclusividade e novas formas de consumir.

A moda sempre foi novidadeira. É tudo sobre a nova estação, a nova coleção, a nova tendência, modelagem, silhueta. Agora, porém, a principal novidade fashion é o passado. E não estamos falando de inspirações, referências e releituras, mas sim do vintage no melhor e mais literal dos sentidos. O movimento começou pelas beiradas, quer dizer, pelos acessórios. Já há algum tempo acompanhamos o retorno de sapatos e principalmente bolsas que fizeram sucesso em outros tempos. Pense na Baguette, da Fendi, na Cleo, da Prada, ou na Jackie, da Gucci.

\u00c0 esq. e no centro, looks do ver\u00e3o 1996 e, \u00e0 dir., look do ver\u00e3o 2021. Tudo Prada.

À esq. e no centro, looks do verão 1996 e, à dir., look do verão 2021. Tudo Prada.Foto: Dilvugação

Na temporada de verão 2021, as roupas também entraram nessa história. A Prada trouxe de volta a estampa quadriculada com jeitão ’70s, que marcou o verão 1996 – coleção que originou o termo ugly chic. Era o primeiro desfile com Raf Simons como codiretor criativo, e os quadrados coloridos foram aplicados em moletons oversized e saias mídi, numa combinação perfeita entre os estilos da italiana e do belga.

Look do ver\u00e3o 1992 e look do ver\u00e3o 2021, ambos Versace.

Look do verão 1992 e look do verão 2021, ambos Versace.Fotos: Divulgação

Na Versace, a icônica coleção de verão 1992 de Gianni Versace foi revisitada pela sua irmã e atual diretora de criação Donatella, que reproduziu os famosos motivos marítimos aplicados em vestidos justos e desfilados por modelos plus size, como Paloma Elsesser e Jill Kortleve.

Em entrevista à ELLE estadunidense, a estilista italiana explica que reviver esses designs é uma forma de mostrar que a boa moda é eterna. Ao mesmo tempo, ela ressalta que o vestido usado por Linda Evangelista, 20 anos atrás, deve ser colocado em perspectiva com o novo momento atual da marca. Daí as modelos fora do padrão extremamente magro das passarelas.

A vontade de revisitar os arquivos das marcas – e até nosso próprio guarda-roupa – se amplificou durante a pandemia. E as coleções de verão 2021 são apenas mais um reflexo disso. Nos últimos meses, algumas artistas fizeram aparições com peças vintage marcantes. Rihanna deu pinta com uma calça jeans Gucci da época de Tom Ford, um casaco Chanel de meados dos anos 1990 e um colar Dior assinado por John Galliano.

No clipe de “We’re Good”, Dua Lipa aparece com um vestido Prada da época em que Great Gatsby, de Baz Luhrmann, foi gravado (início da década de 2010). No vídeo em parceria com Miley Cyrus, a cantora também recorreu ao passado e usou um look Gucci supersensual da era Tom Ford. E para sua mais recente aparição no tapete vermelho, no Brit Awards de 2021, ela escolheu um vestido feito sob medida de Vivienne Westwood e a mesma plataforma que ficou conhecida por levar Naomi Campbell ao chão, durante um desfile da estilista, em 1993.

Na premiação Black Woman in Hollywood, Zendaya também cruzou o tapete vermelho e aceitou o prêmio especial de honra usando um look Yves Saint Laurent que data de 1982. A escolha homenageou Eunice Walker Johnson, empresária negra que fez história na indústria da moda.

Cenário brasileiro

O stylist Dudu Farias, que assina os looks de nomes como Flávia Alessandra, Renata Kuerten e Izabel Goulart, é rei na hora de repetir peças em várias produções. Com um acervo de cerca de 8 mil peças, sendo quase 4 mil delas garimpadas em brechós nos últimos nove anos, ele não acredita em roupa com prazo de validade.

Um exemplo é o blazer vermelho que já apareceu algumas vezes em seu Instagram, cada hora numa mulher diferente e vestido de outra maneira. O top Thierry Mugler é outro. “Acho uma bobeira ligar para isso”, fala Dudu. “A brasileira ainda não tem o costume de comprar peças usadas, mas aos poucos isso está mudando. Tento plantar essa sementinha. É um trabalho não só de preservação da cultura de moda, mas também de sustentabilidade e consumo consciente”, completa.

data-instgrm-permalink="https://www.instagram.com/p/BXrNIcaHJOO/?igshid=9a35zkivdbsm" data-instgrm-captioned data-instgrm-version="4" style="background:#FFF; border:0; border-radius:3px; box-shadow:0 0 1px 0 rgba(0,0,0,0.5),0 1px 10px 0 rgba(0,0,0,0.15); margin: 1px; max-width:658px; padding:0; width:99.375%; width:-webkit-calc(100% - 2px); width:calc(100% - 2px);">

data-instgrm-permalink="https://www.instagram.com/p/BcfJlppnw4b/?igshid=1edooro02ico0" data-instgrm-captioned data-instgrm-version="4" style="background:#FFF; border:0; border-radius:3px; box-shadow:0 0 1px 0 rgba(0,0,0,0.5),0 1px 10px 0 rgba(0,0,0,0.15); margin: 1px; max-width:658px; padding:0; width:99.375%; width:-webkit-calc(100% - 2px); width:calc(100% - 2px);">

Por aqui, os brechós de luxo estão se tornando cada vez mais comuns. Nomes como B. Luxo, Trash Chic e Casa Juisi são importantes e conhecidos acervos de vintage em São Paulo, mas a internet também tem impulsionado outros negócios nesse ramo. Um deles é o Pretty New, criado em 2014, por Gabi Constantino, em Brasília. Apesar de o espaço ser digital, há uma sede onde a maioria das peças, vendidas por consignação, ficam estocadas enquanto não encontram um novo lar.

Looks do brech\u00f3 online Pretty New.

Pretty New.Foto: Divulgação

A ideia surgiu após uma temporada de estudos em Londres (Gabi se formou em international business na European Business School e fez alguns cursos de moda na Central Saint Martins). Foi na capital britânica que nasceu o hábito de garimpar peças antigas. Hoje, o Pretty New tem em torno de 3 mil itens cadastrados e todos passam por uma curadoria e verificação da autenticidade. “Fazemos uma pré-análise por foto e, assim que elas são aprovadas, analisamos pessoalmente e fazemos a higienização. Temos uma equipe de três pessoas treinadas para reconhecer réplicas e ainda mandamos fotos dos detalhes para uma empresa estadunidense avaliar e emitir um certificado”, explica.

A ideia de ter uma peça única, raramente vista em outra pessoa, é o motivo pelo qual a estilista Alix Duvernoy se apaixonou pelo garimpo em brechós. “Acho que sempre tive essa coisa de querer algo raro. Não gosto da palavra exclusiva, porque ela exclui, mas prefiro usar algo mais único.” A paixão pelo vintage veio da criação. “Sempre gostei de revirar os guarda-roupas da minha mãe e avó, de quem acabei herdando bastante coisa”, fala.

Alix Duvernoy.

Alix Duvernoy.Foto: Divulgação

Ao longo da vida, Alix morou dez anos fora do Brasil e, nesse tempo, sua paixão cresceu exponencialmente. Entre Paris e Londres, ela até fez amigos em alguns dos brechós mais icônicos dessas cidades, como o Rellik e o One of a Kind, na Inglaterra. “Morava do lado do Rellik, então, acabei ficando amiga deles. Era engraçado porque eles tinham certo apego com as peças, guardavam coisas no fundo e não vendiam para qualquer pessoa”, explica.

Seja pelo amor a peças antigas e técnicas que estão caindo em desuso, pela vontade de ser e se vestir diferente da maioria ou pelo princípio sustentável de optar pelo que já foi produzido, usar roupas vintage tem se tornado cada vez mais comum. “O mais legal é que, durante o garimpo, você decide se uma peça é incrível ou não. Com tantas referências de looks o tempo todo, sinto que isso está em falta”, finaliza Alix.