ONG abre caminho para amizades muito especiais

Friendship Circle promove a inclusão de pessoas com deficiência por meio da convivência e da criação de laços entre jovens com desenvolvimentos típicos e atípicos.


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Allan Cohen e Felipe Len, ambos de 15 anos, estavam apreensivos na primeira vez que foram à casa de Tonton, de 11 anos. “Não sabíamos se ele gostaria de brincar com a gente. Mas, assim que nos viu, ele abriu um sorriso e nos abraçou. Percebemos ali que seria uma amizade para a vida toda”, contam.

O encontro entre Felipe, Allan e Tonton, que tem síndrome de Down, se repete semanalmente há um ano e é promovido pelo Amigos em Casa, um dos programas da organização The Friendship Circle, localizada em Higienópolis, em São Paulo.

Presidida pela professora e especialista em educação especial Beila Schapiro, a ONG existe desde 2016 e foi inspirada numa organização estadunidense. Seu objetivo é promover a inclusão de crianças e jovens com deficiência a partir da criação de vínculos de amizade.

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Da esquerda para a direita, os amigos Allan Cohen, Tonton e Felipe Len: amizade atravessou a pandemia.Foto: Divulgação

“Acreditamos na promoção da convivência diversa para um mundo mais empático e inclusivo”, diz Renata Fridman, a Naty, uma das responsáveis pela comunicação da ONG e mãe de uma criança com deficiência.

Segundo ela, a motivação para a criação da Friendship Circle foi perceber que havia uma lacuna importante na socialização de pessoas com desenvolvimento atípico. “A inclusão social e pedagógica acontece na escola, mas nem sempre essas crianças são convidadas para festas ou frequentam as casas de seus colegas. Construir vínculos de amizade é muito empoderador e traz impactos positivos não só para o emocional, como para o desenvolvimento em si”, afirma Naty.

Aprendendo com os pares

Iniciativas como a Friendship Circle ganham mais visibilidade em datas específicas, como 21 de março (dia internacional da síndrome de Down) ou como agora, no Abril Azul, mês da conscientização do autismo. Mas o fato é que os laços que surgem com o projeto duram muito mais do que apenas alguns dias.

Rafael, de 16 anos, é autista e há três anos participa do programa Amigos em Casa. Sua mãe, Renata Seripierre Chaves, que colabora com a equipe de comunicação e marketing da ONG, conta que a vida do filho mudou bastante desde que ele começou a receber os amigos em casa.

“Se entrar na adolescência e lidar com as amizades já é difícil para a criança típica, imagine para a neuroatípica”, pontua Renata. Até os 13 anos, Rafael só costumava ter contatos individuais com terapeutas. Com a entrada no programa, ele precisou aprender a receber os amigos e a se comunicar com eles.

Tarefas aparentemente corriqueiras, como trocar mensagens por whatsapp, podem representar desafios para quem está se habituando a lidar com as regras do contato social. E, como sabe qualquer adolescente, tem assunto que não dá para tratar com os pais. “Há coisas que pais e terapeutas não ensinam, são regras de convívio que aprendemos com nossos pares”, diz Renata.

Ao longo das visitas, ela viu a relação entre seu filho e os novos amigos fluir com naturalidade. “A diferença vai ficando em segundo plano conforme a amizade é construída”, afirma. Um vínculo que, provavelmente, não teria a chance de se desenvolver fora do Friendship Circle, avalia.

Capacitação e match

O processo para se tornar voluntário do programa começa com um contato com a equipe técnica da ONG. Os interessados têm seu perfil avaliado e passam por um processo de capacitação. Em seguida, é feita a aproximação com a família do participante com deficiência junto a seus responsáveis. Após o “match”, começam as visitas. Os primeiros encontros são acompanhados por voluntários da equipe, até que todos estejam confortáveis.

As visitas, realizadas sempre por uma dupla de jovens voluntários, acontecem uma vez por semana e têm uma hora de duração. Podem participar do programa crianças a partir dos 4 anos até jovens de 19. Já para ser voluntário é necessário ter entre 13 e 23 anos.

E o impacto positivo não é exclusivo aos participantes com deficiência. “Notamos uma transformação grande nos jovens voluntários, que começam a refletir sobre empatia, solidariedade e também precisam ter criatividade para lidar com situações inesperadas”, conta. Outro fator trabalhado é a responsabilidade. Os voluntários se comprometem a reservar, ao longo de um ano, uma hora por semana para as visitas. E sabem que faltas ou atrasos causam grande frustração nos amigos que os esperam.

Renata acredita que, além de tudo, a convivência ajuda a quebrar estereótipos, algo que converge e beneficia a sociedade de forma geral.

Amizades pandêmicas

Como o resto do mundo, a equipe e os voluntários da Friendship Circle tiveram de se adaptar à realidade de um mundo em pandemia nos últimos dois anos. Para manter a interação entre os jovens, foi criado um programa de amizades virtuais e, o que inicialmente representou um desafio, acabou se tornando uma possibilidade de incorporar pessoas de outras regiões.

“Ampliamos nossos contatos com jovens de outros estados, e mesmo com brasileiros que vivem no exterior”, anima-se Renata.

Allan e Felipe também não deixaram de ter contato com Tonton nesse período. “Experimentamos conversar pelo computador e deu supercerto. Chegamos a ficar meia hora juntos, batendo-papo”, lembra Allan.

Com a que nos índices de contágio da Covid-19, Fê e Ila, como Tonton chama a dupla, retomaram as visitas e estão felizes por voltar a brincar de pega-pega, jogar no Ipad e assistir filmes com o amigo. Recentemente, os dois participaram de uma apresentação em sua escola, em que puderam compartilhar sua experiência. “Dividimos com nossos colegas um pouco do aprendizado – que acontece dos dois lados – e do prazer de conviver com nosso amigo”, concluem.

Para saber mais

The Friendship Circle: friendshipcircle.com.br. No Instagram: @friendshipcirclesaopaulo

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