A Juicy Couture está de cara nova
Com novo direcionamento e discurso pró-diversidade, a marca californiana se esforça para voltar de vez.
Se a primeira imagem que vem à sua mente quando falamos em Jucy Couture é Paris Hilton num conjunto de moletom de plush rosa com estampa de strass, bom… Temos uma novidade: a marca, que ajudou a definir o estilo do começo dos anos 2000, está com planos bem sólidos de mudar por completo a maneira como é vista pelo público.
Quem comanda o rebranding é a estilista Amy Gibson, head de design da Juicy Couture no Reino Unido. Ela foi contratada em 2019 e, até então, ocupava o cargo de designer sênior na Ivy Park, etiqueta de roupas de Beyoncé. “Nós queríamos evoluir e alinhar a marca ao que todo o mundo estava seguindo”, explica ela. “A nossa cultura avançou em direção a novos valores – independência, ambição e força – e o direcionamento da JC permite que as consumidoras incorporem isso.”
A intenção é incluir diversidade no centro do negócio e recuperar a essência e estilo da virada do milênio responsável pela explosão comercial da grife. “Percebi que muitas marcas contemporâneas estavam se apropriando da assinatura da Juicy Couture, com exceção da própria”, fala Gibson. “Na Europa, havia um movimento muito forte em direção à herança da estética Y2K [Year 2000].”
O melhor exemplo do novo momento pode ser visto na campanha de verão 2021. Fotografado por Aidan Zamiri, o casting é composto de modelos com diferentes ascendências e tipos físicos. O clima é de backstage, divertido, nostálgico na medida e com atmosfera de festa underground.
“O nosso principal desafio tem sido mudar as conotações da marca. Elas foram fortemente incorporadas nas raízes da herança de Los Angeles. Os valores da Juicy de conforto e estilo, sem comprometer a mensagem, precisam ser restabelecidos no mercado. Com isso em mente e uma abordagem de design atualizada, lá se vai a velha Juicy!”, argumenta Gibson.
Inicialmente, o reposicionamento era restrito ao Reino Unido e Europa, mas deu tão certo que a matriz da empresa, baseada nos Estados Unidos, passou a implementar o estilo como base para os demais licenciamentos do nome. “Considerando o desejo inegável do mercado por nostalgia, a reação que recebemos tem sido incrível”, revela Gibson. Segundo ela, a venda das duas coleções anuais e algumas cápsula vão bem, mas a empresa não revela números sobre isso.
Um pouco de história
Para melhor entender a ‘nova’ Juicy, não deixemos tão rápido a ‘velha’ de lado. A marca teve papel importante na moda do início dos anos 2000, com conjuntos de veludo e plush, bolsas gigantes e botas felpudas. Marcada por altos e baixos, em seu auge alcançou 605 milhões de dólares em vendas (2008). Na sequência, veio a crise imobiliária americana e, cinco anos depois, a empresa foi vendida por menos de um terço desse valor. Hoje, está sob o comando do grupo ABG, que inclui Forever 21, Herve Leger e a revista Sports Illustrated.
A Juicy Couture foi fundada por Gela Nash-Taylor e Pamela Skaist-Levy, amigas que trabalhavam juntas em uma loja de Los Angeles. Quando a primeira ficou grávida, teve dificuldade em encontrar opções confortáveis que lhe interessassem. Resolveu, então, adaptar calças jeans folgadas do marido. Quando percebeu que a ideia podia dar certo comercialmente, chamou a amiga e, em 1988, lançaram a Travis Jeans, para gestantes.
A empresa cresceu consideravelmente nos anos seguintes e, em 1994, para ampliar a abrangência de mercado as duas criaram uma camiseta branca com decote em V, que seria perfeita para qualquer mulher. O projeto era baseado em quatro elementos: caimento, tecido, conforto e cor. O decote não poderia ser muito profundo e precisava cobrir uma proporção exata dos braços. O corpo feminino era analisado com cuidado, de mulher para mulher, o que era um diferencial em relação aos estilistas e empresários homens da época – o foco deles era o tamanho 36 apenas. Assim que chegaram no design perfeito, elas replicaram as camisetas em 26 cores diferentes. No ano seguinte, 1995, mudaram o negócio de nome e nasceu Juicy Couture.
O contexto era de início de recuperação da recessão de 1990 e 91. Os consumidores estadunidenses tinham fome por experiências caras, ou ao menos que aparentassem riqueza. Daí tanto strass e aplicações douradas, além do termo couture no nome. Foi uma sacada esperta e o negócio cresceu bastante. O preço inicial das peças era de 155 dólares. Não era barato nem impensável para a classe média. Mas faltava ainda alcançar o ponto tão desejado por todos no mercado: a propagação de um estilo de vida.
Isso mudou com o endosso de celebridades com óculos gigantes, chihuahuas minúsculos e ar entediado. Pense em Lindsay Lohan, Britney Spears, Nicole Richie, Madonna e muitas outras. Nenhuma, porém, se tornou tão sinônimo de Juicy Couture quanto Paris Hilton. Juntas, elas consolidaram a “Valley Girl”, estereótipo feminino cultural, linguístico e socioeconômico. De forma bem resumida, trata-se da garota loira, jovem, rica, antipática e frequentemente pintada (quase sempre por homens) de burra.
A Juicy Couture era a amiga ideal que acompanhava Britney na fuga da manada de paparazzis a caminho do dentista (sabemos bem as consequências), ou que estava com Madonna no desembarque do aeroporto. Antes, as celebridades eram vistas apenas com alta-costura no tapete vermelho ou em entrevistas estrategicamente planejadas. Depois, passaram a ser fotografadas enfiadas em saladas ou tomando café (descafeinado) pós-pilates. Cada minuto começou a ser registrado e elas precisavam ser casuais, mas ainda manter um status de estrela. E a JC tinha a opção perfeita para isso.
De volta para o presente
A crise de 2008 foi a mais letal queda da marca. Com a desestruturação do setor imobiliário e crise que seguiu o caso, não havia mais desejo por opulência. Com vendas abaladas, a Juicy Couture não soube se adaptar e, desde então, tenta se restabelecer no mercado. Em 2016, por exemplo, rolou uma parceria improvável com a Vetements. Fez sentido, causou impacto, mas não o suficiente. Agora, sob o comando de Amy Gibson, o discurso parece mais alinhado com o que o contexto pede. “Nós queríamos evoluir a Juicy para a consumidora atual mais inclusiva, com pensamento aberto e empoderada”, conclui a head de design.
A campanha mencionada no começo da matéria acima transmite bem a mensagem. Com grade do PP ao GG, parece atender minimamente uma maior variedade de corpos. A não negação do passado de patricinha e, sim, sua ressignificação é uma estratégia interessante e conectada com os desejos de agora. Sem contar que ironia, diversão e um pouco de autoindulgência podem ser muito bem-vindos no momento. No mais, faltou só comunicar melhor como a diversidade se desdobra para além da imagem, no quadro de funcionários e diretoria. Questionada sobre isso, a grife preferiu não comentar.
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