Os 22 do Passinho lançam clipe de sua primeira música autoral
Grupo, que já participou de clipes de Emicida e Nego do Borel, é expoente de uma nova geração do passinho.
“Temporais são temporários.” Todos os dias, quando abrem a porta para atravessar o quintal rumo à rua, em São Gonçalo, no Rio de Janeiro, os gêmeos Jeferson Alves Santos e Wellington Alves Santos se deparam com a frase, que eles próprios grafitaram no muro de casa. É uma espécie de mantra para os irmãos, conhecidos como Faiska e Fumassa, desde 2016, quando fundaram o grupo Os 22 do Passinho.
Naquela época, postaram no YouTube, sem pretensões, um vídeo dançando no quintal, rabiscando o chão com os pés em alta velocidade e marcando as batidas de um funk carioca. O vídeo viralizou. Chamaram Gelson Mendonça, o Gegê, irmão por parte de pai, para compor o bonde – são só os três, e o número 22 que dá nome ao grupo, traduz Faiska, é uma gíria carioca que significa “louco, maluco”. “Somos os loucos do passinho”, resume.
Agora, cinco anos depois daquele vídeo no quintal, os irmãos lançam o clipe da primeira música em que se apresentam também como autores e cantores. A letra de “Coração de um sonhador” foi escrita, como diz Faiska, em meio a mais um temporal que o trio enfrentou. Em julho do ano passado, a loja de roupas que eles abriram em 2019, em São Gonçalo, foi assaltada. “Levaram quase tudo, e a gente não tinha de onde tirar dinheiro. Pensamos em fechar. Um dia, acordei muito triste e comecei a pensar nos conselhos da minha mãe. Ela sempre dizia que seria difícil, mas que a gente não podia desistir. As frases dela na minha cabeça pareciam música”, lembra Faiska.
Os 22 Do Passinho – CORAÇÃO DE UM SONHADOR!
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Ele então chamou os irmãos para compor. Fizeram dos conselhos da mãe uma canção e, no mesmo dia, postaram um vídeo no Instagram. Foram pinçados pela Espirito Bird, marketplace de luxo focado em beauty, perfumaria e moda, e que buscava jovens com potencial criativo nas redes. A empresa patrocinou o clipe de “Coração de um sonhador”. “Até já fizemos duas músicas, mas consideramos como aquecimentos, porque são mais dançadas. Essa é a primeira vez que a gente assina a letra e canta, que as pessoas escutam nossa voz”, diz Faiska.
Anos atrás, foi dançando que eles chamaram a atenção de Nego do Borel. O músico viu um vídeo do bonde no YouTube e convidou os meninos para o clipe “Me Solta”, hit da internet em 2018. No ano seguinte, participaram do clipe de “AmarElo”, de Emicida.
Faiska e Fumassa têm 20 anos. Gegê, 22. Inspirados pelo Dream Team do Passinho, um dos expoentes e pioneiros do gênero, os três irmãos são a cara da nova geração. Mais que uma dança, o movimento em torno do funk surgiu nas comunidades cariocas em 2008 – também a partir de um vídeo feito no quintal de casa, a de Rodrigo Silva da Costa (apelidado de Bitala), que então comemorava o aniversário dançando com amigos. Postado no YouTube com o título de “Passinho foda”, o vídeo explodiu e deu origem a uma das manifestações culturais mais marcantes do Brasil nas últimas décadas.
Foto: Divulgação/William F. Santos
Desde então, o movimento se transformou, mas sempre seguiu apoiado nas redes sociais e nos conteúdos trocados entre os dançarinos das comunidades. Documentarista, diretor de A batalha do passinho (2012) e cientista social, Emílio Domingos vê nos 22 do Passinho os traços da nova geração. “O passinho tem como característica essa transformação contínua. Faz parte da dança essa absorção de tudo o que está ao redor, é antropofágico. Ele veio se transformando, se adequando e se adaptando a tudo, e está agora num novo estágio”, avalia o cineasta. “‘Os 22 são dessa turma nova, que usa Instagram e Tik Tok, diferente daquela geração que criou o passinho e que usava YouTube e Orkut.”
No Instagram, os meninos têm pouco mais de 40 mil seguidores. No TikTok, são mais de 310 mil. Outra característica da nova geração que os três irmãos incorporam é a coreografia, com passos previstos. “A formação de bonde, da dança em grupo, sempre existiu, mas a coreografia é algo mais recente. Eles agora vão criando coreografias coletivas e dançando na laje”, diz Domingos.
É numa laje no morro do Cantagalo que “Os 22 do Passinho” aparecem nas cenas finais do novo clipe. Os gêmeos cantam e abraçam a mãe, Carmen. Aos prantos, ela ouve os versos do refrão: “Sabe como é que é, né? O coração de um sonhador/ Sabe como é que é, né? O favelado acreditou”. Gegê também abraça a mãe, Luciana. “A gente sempre enfrentou diversas dificuldades, e nossas mães nos ensinaram que tempestades vão embora. Temporais são temporários”, repete Faiska. Mais uma vez, o temporal passou.
Foto: Divulgação/William F. Santos
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