Conheça a Da Silva Santos Neves, marca do jovem estilista paraibano

Vinicius dos Neves, de apenas 19 anos, chamou a atenção pela coleção madura que mistura referências evangélicas e da cultura ballroom num dos melhores desfiles da mais recente edição da Casa de Criadores.


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A religião evangélica e a cena Ballroom da Paraíba podem parecer mundos distantes, mas é justamente da mistura entre esses dois universos que nasceu uma das melhores coleções desfiladas na mais recente edição da Casa de Criadores, em julho passado. O responsável por aquelas roupas brancas, de corte preciso e imagem aparentemente simples, ainda que sofisticada, é Vinícius dos Neves, estilista e fundador da Da Silva Santos Neves.

Com apenas 19 anos, o estudante nascido na região metropolitana de João Pessoa, mudou para São Paulo recentemente para continuar o curso de moda e têxtil, na Universidade de São Paulo (USP), o qual já fazia à distância por um ano. O interesse pela costura e pela moda, contudo, vêm de bem antes, ainda na infância, quando se divertia observando o que as pessoas ao seu redor vestiam. “Minha mãe sempre teve esse olhar muito voltado para a moda como artifício de se sentir melhor”, diz.

O poder transformador da moda e da vestimenta a qual se refere é também uma das bases da cultura Ballroom. E foi justamente nesse meio que o sonho em se tornar estilista começou a tomar forma. Ainda menor de idade, Vinícius entrou para a Casa das Milhões, uma das primeiras casas do gênero em João Pessoa. Lá, criava looks e ajudava na produção de eventos, editoriais e filmes de moda, como nesse aqui abaixo:

A partir da vivência dentro da casa cheia de personalidades e artistas de todos os tipos, Vinícius começou a construir a própria identidade – e a de sua marca. Trazer referências tanto da cidade onde nasceu e cresceu, um misto de centro urbano com natureza selvagem, é essencial para o paraibano. “É muito comum, na moda, olhar para o que vem de fora, mas comecei a ter essa visão mais voltada para a minha realidade”, explica.

Foi assim que referências aos trajes usados por evangélicos encontraram caminho para sua primeira coleção completa, aquela desfilada no evento paulista. Em entrevista antes da apresentação, o estilista contou que o visual de uma das crenças que mais cresce no país foi muito presente na cidade e região onde cresceu, ainda que ele nem sua família sejam praticantes. A ideia, contudo, era trabalhar aqueles elementos de forma isolada para ressignificá-los a partir de seu próprio olhar de moda, repensando padrões e subvertendo seus códigos.

Daí vem as saias jeans longas, como as usadas pelas mulheres na igreja, só que combinadas a cuecas samba-canção e calcinha fio dental aparentes. Do culto também vem as roupas masculinas adaptadas a um shape mais justo, como as polos e as camisas transformadas em tops. Da região canavieira onde nasceu, aparecem os chapéus, bonés e acessórios tipo balaclavas usados por trabalhadores para proteger a cabeça e o rosto do sol. Os looks de tecidos mais pesados recebem um contraponto mais suave em slip dresses de seda e detalhes de renda, fazendo uma das combinações mais interessantes da apresentação.

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Da Silva Santos Neves.Foto: Marcelo Soubhia/@agfotosite

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Da Silva Santos Neves.Foto: Marcelo Soubhia/@agfotosite

Vinicius conta que a coleção já estava desenhada há algum tempo, mas só saiu do papel após uma consultoria com Carol Barreto, professora do departamento de estudos de gênero e feminismo da UFBA e colaboradora do Instituto Casa de Criadores. O convite para participar do evento, aliás, veio de uma tentativa frustrada em participar do Desafio Sou de Algodão. “Ele se inscreveu no projeto, mas como não concluiu algumas etapas de inscrição, acabou desclassificado”, explica André Hidalgo, fundador da CdC. “Só que o trabalho dele me chamou muita a atenção, fiquei muito impactado, a ponto de chegar para a Sou de Algodão e falar: acho que perdemos um possível vencedor.”

A mentoria de Barreto foi essencial para que o desfile da Da Silva Santos Neves fosse um dos grandes destaques dessa edição do evento. Pela sua pouca idade e falta de experiência no mercado, era ainda mais importante entender como expressar sua identidade de forma clara e precisa dentro de uma coleção – foi aí que entrou o trabalho da professora. Mas engana-se quem acha que isso tem a ver com costura ou modelagem: ao lado de cerca de 20 outros nomes da Casa de Criadores, o estilista teve aulas de como potencializar seu discurso de forma mais política e humana. “Ele tem um viés de trabalho muito focado na desconstrução dos padrões da cisheteronormatividade, de gênero e de sexualidade. Eu o vi expressando muito do seu próprio lugar de existência, de maneira muito informal, produzindo imagens de moda potentes no sentido de visibilizar as paisagens periféricas”, comenta Carol, responsável pela grade pedagógica do Instituto, ao lado de Karlla Girotto.

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Da Silva Santos Neves.

Dos Neves também teve ajuda do Coletivo Metana Criativa, um laboratório de experimentação têxtil da USP, na produção de seu primeiro desfile. A costura, no entanto, foi feita majoritariamente por Vinicius, que pretende vender as peças sob medida, apesar de querer disponibilizar um pequeno estoque à pronta entrega ainda este ano. E para o futuro? “Quero que a Da Silva Santos Neves continue brincando com a modelagem de itens essenciais e criando peças que podem ser misturadas, super versáteis e com menor impacto no meio ambiente”, finaliza o estilista que, apesar da pouca idade, já se mostra como uma grande aposta da indústria.

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