Diamantes de laboratório: qual é o seu valor?
Com as mesmas qualidades das pedras naturais, os diamantes de laboratório chamam a atenção pelo preço atrativo e a promessa de maior sustentabilidade.
“Diamonds are forever”, já cantava Shirley Bassey, em 1971, no filme 007, Os Diamantes são Eternos, um dos mais icônicos de James Bond. Se isso vale para as pedras preciosas criadas pela natureza, o mesmo se pode dizer dos diamantes de laboratório que, nos últimos anos, invadiram o mundo da joalheria, numa tendência tão sedutora quanto polêmica.
“Os diamantes cultivados em laboratório são diamantes por definição, científica, química, física e opticamente. A única diferença é que foram produzidos em um laboratório, enquanto que os diamantes naturais se formaram há bilhões de anos, durante o ciclo dos supercontinentes”, afirma Avi Levy, presidente na América do Norte do IGI, Instituto Gemológico Internacional, uma das autoridades de certificação mundial de pedras preciosas.
Levy contradiz uma das grandes críticas feitas aos chamados lab grown diamonds por seus detratores: a de que não são de fato diamantes, se comparados aos extraídos pela mineração. De acordo com Avi Levy, em 2019, quando começou o boom desse tipo de pedra no mercado estadunidense, o então vice-presidente sênior de fornecimento de diamantes e joias da Tiffany, Andy Hart, declarou que a marca, principal negociadora de diamantes naturais do mundo, não considerava o lab diamond como um produto de luxo.
No documentário Nothing Lasts Forever (2022), que está disponível na Netflix, empresários do ramo do diamante natural apelam para a simbologia que a variante com bilhões de anos conquistou para diminuir a versão feita em um mês e que brilha tanto quanto. Gemólogo há mais de trinta anos e professor do IBGM, Instituto Brasileiro de Gemas e Metais Preciosos, Daniel Berringer rebate: “O granito da pia da sua cozinha também tem bilhões de anos, e isso não faz dele uma joia.”
Diamantes de laboratório: prós e contras
Se gigantes da joalheria de luxo resistem aos lab diamonds, jovens marcas investem nesse tipo de pedra por conta do valor sustentável agregado. É o caso da brasileira GAEM, de Julia Blini e Luna Nigro. Lançada em 2021, é a única empresa do ramo de joalheria no país a obter o Selo B, certificado de sustentabilidade. “O diamante de laboratório é o futuro da joalheria: é o mesmo produto, igual ao diamante de mineração, mas não vem de zonas de conflito e não faz estrago no planeta”, diz Luna.
Ela se refere às duas principais críticas, desta vez dos defensores do lab diamond, aos diamantes naturais. Além da mineração ter impacto prejudicial no meio ambiente, muitas pedras vêm de minas localizadas em regiões de conflito armado, dominadas por milícias que controlam a venda dos diamantes.
“Os diamantes cultivados em laboratório são diamantes por definição, científica, química, física e opticamente. A única diferença é que foram produzidos em um laboratório, enquanto que os diamantes naturais se formaram há bilhões de anos, durante o ciclo dos supercontinentes.” – Avi Levy, presidente na América do Norte do IGI, Instituto Gemológico Internacional
A Tiffany, por exemplo, garante publicamente não utilizar diamantes de zonas de conflito e divulga um rastreamento das pedras, disponível para seus clientes.
Segundo Julia, a GAEM tem uma clientela que compra as joias justamente por elas não carregarem essa herança controversa. “São geralmente pessoas mais jovens, entre 30 e 45 anos, que se preocupam em saber de onde vem o que estão consumindo”, diz. “Há noivos, por exemplo, que não querem dar para a futura mulher um anel de noivado que tenha uma história de conflitos territoriais e prejuízo ao planeta”, completa Luna.
Outro ponto a favor é o preço. Como exemplo de comparação, se um quilate (a medida de peso da pedra, que equivale a 0,20 gramas) de diamante de mineração pode custar em torno de 12 mil dólares, a versão de laboratório com as mesmas qualidades sai por cerca de 300 dólares no mercado internacional. Já no Brasil, por conta dos impostos de importação, as donas da GAEM afirmam que um anel de diamante de laboratório com a mesma certificação de um diamante de mineração sai cerca de 40% mais barato.
Diamantes de laboratório: testes de qualidade
Embora não exista nenhuma lei que obrigue a avaliação de diamantes, a certificação é uma garantia de qualidade e procedência da pedra. Desde os anos 2000, as principais empresas certificadoras de joias do mundo passaram a certificar também os lab diamonds. O IGI foi o primeiro, em 2005, seguido pelo GIA (Gemological Institute of America), em 2007.
“Os diamantes de laboratório são avaliados com as mesmas nomenclaturas e considerando os mesmos aspectos examinados nos diamantes naturais: o quilate, a cor, a clareza (ou transparência) e o corte (ou lapidação)”, conta Daniel.
Afinal, a pergunta que não quer calar é: há diferenças entre os diamantes naturais e os de laboratório? Tanto o presidente do IGI quanto o gemólogo brasileiro são categóricos ao dizer que, a olho nu, ambos são idênticos e, embora haja um teste extremamente sofisticado realizado com um aparelho específico, nem sempre ele detecta a diferente procedência.
“Em alguns casos, pode haver características internas microscópicas que apontam para a possibilidade de a pedra ter sido cultivada em um laboratório, mas isso não é conclusivo”, afirma Avi. O especialista, no entanto, acredita que todos os diamantes de laboratório deveriam ter a inscrição “lab grown”, “lab created” ou “LG” visível quando ampliados no microscópio por uma questão de transparência profissional.
Com uma linha de diamantes de laboratório desde 2016 chamada Created Diamonds, a Swarovski lança em novembro uma nova coleção assinada por sua diretora criativa, Giovanna Battaglia Engelbert. E todos os diamantes serão avaliados e certificados pelo IGI. Como regra geral, a classificação é feita em pedras que tenham a partir de 0,15 quilates.
Assim, não há dúvidas de que se trata de fato de um diamante, algo que no Brasil ainda gera dúvidas. “O brasileiro ainda tem preconceito. Acha que é uma imitação, ou réplica. Às vezes perguntam: ‘é uma zircônia?’. Não, não é, porque a composição química é diferente. É um diamante mesmo”, reforça Daniel.
Diamantes de laboratório: como são feitos
Há duas maneiras de produzir diamantes de laboratório e todas elas envolvem a reprodução das condições ideais encontradas na natureza, só que dentro de uma câmera de vácuo onde o diamante cresce, átomo por átomo, a partir de moléculas de carbono. O processo é bem mais rápido, o que resulta numa pedra produzida em cerca de três semanas (mais ou menos, dependendo do tamanho).
Uma das técnicas usadas em laboratório é o método de alta pressão e alta temperatura (HPHT), no qual prensas mecânicas pesadas e calor intenso são combinados para reproduzir as condições sob as quais os diamantes naturais se formaram há bilhões de anos. A segunda é a Deposição Química de Vapor (CVD), um processo que superaquece o gás em plasma, liberando átomos de carbono para “construir” um cristal.
“Os diamantes de laboratório são avaliados com as mesmas nomenclaturas e considerando os mesmos aspectos examinados nos diamantes naturais: o quilate, a cor, a clareza (ou transparência) e o corte (ou lapidação).” – Daniel Berringer, gemólogo e professor do IBGM, Instituto Brasileiro de Gemas e Metais Preciosos
Ambos os métodos produzem diamantes. No entanto, um processo (CVD) monta o diamante em camadas verticais e o outro (HPHT) usa um catalisador de metal para então dissolver o carbono componente. “Essas diferentes técnicas podem produzir inclusões microscópicas (características internas) que diferem das observadas nos diamantes naturais, mas nem sempre. Depois de polidas, as pedras preciosas produzidas por HPHT e CVD têm aparência idêntica à dos diamantes naturais”, conta Avi.
Uma das vantagens do método de cultivo em laboratório é o ambiente controlado que dá mais chances de produzir um diamante com características específicas. Esse é um dos aspectos pelos quais a Tag Hauer, por exemplo, se interessou quando adotou os lab diamonds em alguns de seus relógios.
“Decidimos usar diamantes cultivados em laboratório onde esta tecnologia oferece algo que os diamantes naturais não podem oferecer. Ficamos orgulhosos de revelar um diamante rosa cultivado em laboratório no modelo TAG Heuer Carrera Date 36 mm, algo que seria muito difícil de obter naturalmente”, afirma Emmanuel Dupas, head do TAG Heuer Institute.
Diamantes de laboratório: são mais sustentáveis?
Ao contrário do que pode parecer, na maioria dos casos, os diamantes cultivados em laboratório não são totalmente sustentáveis. Ainda que não pratiquem mineração invasiva da terra nem tenham envolvimento com zonas de conflito, as prensas e os reatores que os cultivam exigem energia abundante, além da maioria ser produzida com a queima de combustíveis fósseis.
Por outro lado, alguns produtores de diamantes de laboratório passaram a usar energia hidrelétrica e solar, tornando, aí sim, as peças mais sustentáveis (como os usados pela GAEM). É o caso também da Pandora que, neste mês, lança a sua primeira coleção de joias com lab diamonds, a Diamonds by Pandora, estrelada por Pamela Anderson.
“Tem lugar para ambos. Quem prioriza o consumo consciente, a sustentabilidade e/ou quer um produto mais barato, pode investir nos diamantes de laboratórios. Já quem dá valor ao que é raro, ou que associa o natural e antigo ao mágico e histórico vai preferir o diamante natural.” – Daniel Berringer
“Nossos diamantes são cultivados, cortados e polidos usando energia 100% renovável. Um diamante Pandora cultivado em laboratório tem cerca de 9,17 kg de emissões de carbono por quilate lapidado e polido. Isto significa que a sua pegada de carbono é cerca de 95% inferior à de um diamante extraído da natureza e que tenha o mesmo tamanho”, explica a marca.
Respeitando normas éticas e investindo nas soluções mais sustentáveis que cada setor pode oferecer, há muita gente que aposta na coexistência das pedras naturais e de laboratório, cada uma delas com as suas especificidades. “Podemos nos beneficiar das diferentes oportunidades que cada um oferece. Esta mensagem tem sido bem compreendida e, portanto, a recepção aos nossos diamantes de laboratório é, em geral, positiva”, diz Emmanuel, da TAG Heuer. E essa realmente deve ser a abordagem comercial das grandes empresas frente a variedade.
Do lado acadêmico, o professor Daniel faz igual ponderação. “Tem lugar para ambos. Quem prioriza o consumo consciente, a sustentabilidade e/ou quer um produto mais barato, pode investir nos diamantes de laboratórios. Já quem dá valor ao que é raro, ou que associa o natural e antigo ao mágico e histórico vai preferir o diamante natural.”
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