Conversamos com o mestre da perfumaria Alberto Morillas

Ele é o nariz por trás de clássicos como CK One (Calvin Klein), Acqua di Giò (Giorgio Armani) e Daisy (Marc Jacobs) e acaba de assinar mais uma fragrância para o Boticário.


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Foto: Divulgação



Em dado momento de sua adolescência, o jovem espanhol Alberto Morillas conheceu enquanto lia uma revista o trabalho de Jean-Paul Guerlain, herdeiro da marca que carrega o sobrenome de sua família. Curioso por essa profissão tão inspiradora, a de perfumista, não demorou para que ele corresse para a sede da Firmenich (maior empresa de fragrâncias do mundo), na Suíça, e pedisse um emprego. Assim mesmo, aos 21 anos, na lata. “Eles me disseram que seria impossível uma vez que não tinha formação em química ou em qualquer coisa relacionada à perfumaria”, relembra em entrevista exclusiva à ELLE Brasil. “Eu insisti, insisti, insisti… E deu certo! Estou aqui até agora”, diz, bem-humorado. Na nossa conversa, ele conta como criou fragrâncias icônicas como CK One (Calvin Klein), Bloom (Gucci), Acqua de Giò (Giorgio Armani), Daisy (Marc Jacobs) e, agora, o Malbec Bleu, da brasileira O Botícário.

Como é, para você, o processo de criação de um perfume?

É como qualquer processo criativo. Primeiro, eu crio para mim, não para os outros. Preciso acreditar na ideia, no conceito, antes de qualquer coisa. Estou sempre brincando com novos acordes e novas ideias olfativas. Tudo pode ser fonte de inspiração: uma memória, uma receita, um novo ingrediente sintético, uma música, etc. Às vezes, esses acordes acabam em algum perfume. Quando não, reservo-os no meu repertório de possibilidades.

O que você leva da sua personalidade para os seus perfumes?

Criar perfumes é sobre traduzir emoções. E emoções podem ser evocadas com diferentes cheiros. Os cheiros da Espanha, das minhas memórias de infância, da natureza, do mar… Tudo isso carrega muito significado. Para mim, tudo o que evoca o mar Mediterrâneo, aquelas águas azuis e profundas, me faz bem. Sou muito apegado, por exemplo, aos cítricos, às notas marítimas e a algumas flores como jasmim, tuberosa, neroli e flor de laranjeira. Acho que são a expressão de um tipo específico de alegria, um prazer sofisticado.

“Acho que esse fator emocional, de reconexão, é o que está guiando a perfumaria agora e é o que vai continuar na dianteira deste mercado”, Alberto Morillas

Como as coisas mudaram no processo de fabricação de um perfume desde que você começou a trabalhar nesse mercado?

Eu devo ser o último perfumista a escrever minhas fórmulas à mão. Isso nunca vai mudar para mim. Além disso, a Firmenich é a responsável pela criação de uma série de moléculas específicas que amo utilizar. Acredito que, com a ajuda dos laboratórios da casa, consigo fazer uma ponte bonita entre o meu conhecimento clássico e o que há de mais moderno na perfumaria. O Aquazone que vai no Malbec Bleu de O Boticário, por exemplo, é uma dessas moléculas.

Quais são as maiores tendências do mercado de perfumes atualmente?

Nos últimos meses, temos vivido uma situação terrível com o isolamento social. A perfumaria tem cumprido um papel muito importante nesse momento tão delicado. O olfato é que tem trazido de volta, na medida do possível, a sensação de conforto, segurança e afeto. Estamos usando perfume não para os outros, mas para nós mesmos. Acho que esse fator emocional, de reconexão, é o que está guiando a perfumaria agora e é o que vai continuar na dianteira deste mercado.

Você foi responsável por perfumes que, até hoje, fazem muito sucesso. CK One e Acqua di Gió são, talvez, os seus maiores hits. Por que eles são tão queridos?

Tenho muito orgulho do CK One. Era um sonho criar esse perfume e vê-lo reconhecido ao redor do mundo me traz muita alegria. Ele continua fresco e moderno. Acqua di Giò, por sua vez, parece que vai, para sempre, me trazer aquela sensação de viagem, de juventude, de mar. São duas fragrâncias que têm o frescor que é a minha assinatura.


Anúncio televisivo mais recente (2018) do CK One, perfume unissex, hit da Calvin Klein
Calvin Klein

 

Você pode falar um pouco sobre o conceito por trás da sua marca própria, a Mizensir, por favor?

Claro! Eu comecei ao lado de minha esposa. Nosso objetivo era criar uma coleção de velas. Cada uma delas tinha que representar uma emoção. Anos depois, minha filha, Veronique, me disse que seria bom expandirmos para a perfumaria de fato. Ela queria ver o que eu poderia fazer com total liberdade criativa e eu queria criar algo para mim, não para os outros. Por isso, qualidade é a minha principal prioridade na Mizensir.

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Solar Blossom é um eau de parfum da linha fresca da Mizensir, marca autoral de Alberto Morillas.Foto: Divulgação

 

O que você acha que uma perfumaria precisa ter hoje para alcançar o sucesso?

Acho que, ao mesmo tempo em que o mercado está criando ótimos perfumes, tenho a sensação de que o investimento, por vezes, está mais no frasco do que no “suco”. Acredito que estamos vivendo um momento importante na perfumaria. Os consumidores estão de frente com uma gama enorme de produtos, mas os perfumes pirateados e de qualidade duvidosa também entram aí. Chegou a hora da indústria se profissionalizar ainda mais para que possamos trazer de volta o nosso esplendor.

Como você acredita que será o futuro da perfumaria?

A tecnologia e a biotecnologia estão nos ajudando muito a desenvolver possibilidades olfativas que são produzidas pensando no impacto que terão no planeta. Perfumes que são bons para quem usa e para o planeta são o futuro.

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