MFW: Fendi inverno 2024
Com referências aos New Romantics, ao classicismo romano e ao estilo das herdeiras da família Fendi, o diretor de criação Kim Jones apresenta uma de suas coleções mais interessantes para a marca.
Roma, Inglaterra, Virginia Woolf, ilustrações de Antonio López, desenhos de Karl Lagerfeld. Já rolou inspiração em um tudo desde 2020, quando Kim Jones assumiu a direção criativa da Fendi. Porém, tem uma constante, a norteadora suprema: as mulheres e herdeiras da família que fundou e deu nome à marca.
Para o inverno 2024, não é diferente. No release, o estilista conta que quando conheceu Silvia Venturini Fendi, a matriarca, ela estava com um terno utilitário “muito chique”. “Isso moldou fundamentalmente a minha visão do que é a Fendi: é como se veste uma mulher que tem algo a fazer, que faz”, escreveu Kim Jones.
Fendi, inverno 2024. Foto: Getty Images
Fendi, inverno 2024. Foto: Getty Images
A observação e admiração do estilo das mulheres Fendi pode ser resumida nas qualidades funcionais e práticas de roupas sofisticadas, precisas, embora nunca sérias demais. Na passarela, a ideia ganha vida em looks de alfaiataria de tons sóbrios, com silhueta alongada e fechada.
No entanto, o corte central do blazer é arredondado, marcando a cintura de leve. A modelagem da calça é ampla e seu caimento, suave. Vez ou outra, rola até uma sobressaia de seda na produção. Só não chega a ser 100% esvoaçante porque as botas de cano alto, que têm tudo para virar hit de vendas, mantém a imagem final com os pés bem firmes no chão.
Durante a pesquisa para coleção de inverno 2024, Kim Jones ficou preso em alguns croquis de 1984, assinados por Karl Lagerfeld, então diretor de criação da Fendi. E segundo Jones, neles é fácil perceber a influência de movimentos culturais que ganhavam força naquele momento.
Fendi, inverno 2024. Foto: Getty Images
Fendi, inverno 2024. Foto: Getty Images
Um deles era a cultura japonesa que começava a se misturar com a moda europeia com a chegada de estilistas nipônicos, como Kansai Yamamoto, Issey Miyake, Yohji Yamamoto e Rei Kawakubo. Outro era a música e o estilo dos New Romantics.
Os New Romantics sucederam a revolução explosiva do punk. No Volume 12 da ELLE impressa, o chapeleiro britânico Stephen Jones, ele próprio um novo romântico naquela época, explicou: “Com o declínio do punk, surgiu um vácuo cultural, que nos permitiu fazer o que quiséssemos. Percebemos que a história poderia ser interessante. Em conexão direta com o pop, com os sintetizadores e com outras manifestações criativas contemporâneas, ela era capaz de produzir algo realmente novo”.
Fendi, inverno 2024. Foto: Getty Images
Fendi, inverno 2024. Foto: Getty Images
História, no caso, é o passado. Elementos de períodos anteriores, como golas vitorianas, rendas, babados, além de uma alfaiataria despojada, muita maquiagem, acessórios, lenços e o flerte com uma ideia de nobreza decadente. Dá um google aí em Boy George, Judy Blame, Steve Strange (do Visage), Princess Julia ou Leigh Bowery.
O movimento New Romantics, em Londres, foi formativo para alguns dos criadores mais célebres do fim do século 20 e início de 21 – John Galliano e Alexander McQueen, por exemplo. De modo que, até hoje, fotos, relatos, vídeos e qualquer documentação do público assíduo da boate Blitz vivem aparecendo em moodboards.
Fendi, inverno 2024. Foto: Getty Images
Fendi, inverno 2024. Foto: Getty Images
Kim Jones não só participou do finalzinho daquele auê, como é (mais) um obcecado pela riqueza visual e cultural que rolava lá. Quem olhar com atenção, vai identificar algumas referências na linha dos ombros, nas sobreposições de tricôs ou lenços sobre eles, nas golas das jaquetas viradas para cima, na proporção soltinha da alfaiataria, nos volumes das calças.
A partir daí, o estilista entra num jogo de opostos:, opaco e transparente, estruturado e fluido, neutro e colorido, alfaiataria e tricô. Sim, de novo o tricô – já falamos que é tendência certa para o inverno 2024. Aqui, ele vai dos grossos (com padronagens tradicionais) aos superfinos. Tem a própria peça, tem o material em recortes variados e justapostos à lã, couro e seda.
Um recurso marcante no desfile é a ideia de sobreposição. Blazers têm ombros ou mangas tramadas, como se houvesse um suéter jogado por cima ou não completamente vestido. Faixas ajustadas na cintura parecem colocadas sobre o vestido ou jaqueta, quando, na verdade, estão embutidas nas peças. A brincadeira, porém, sai do controle em alguns momentos e complica sem necessidade uma boa ideia.
Fendi, inverno 2024. Foto: Getty Images
Fendi, inverno 2024. Foto: Getty Images
Ainda assim, o saldo é positivo. Um dos pontos altos desta coleção é justamente quando esse balanço dá uma descompensada. Rola um equilíbrio desequilibrado bem interessante entre a nonchalance blasé inglesa com o calor clássico romano. Na parte final, com as estampas de esculturas, a composição de todos os elementos já citados neste texto causa tensão e relaxamento ao mesmo tempo.
Fendi, inverno 2024. Foto: Getty Images
Fendi, inverno 2024. Foto: Getty Images
O toma lá, dá cá entre Londres e Roma é outra constante no trabalho de Jones à frente da marca. Aqui, ela se apresenta da maneira mais interessante até o momento. Ah, e para quem quer saber das bolsas, os destaques vão a Peekaboo molenga e para o novo modelo mais amplo, chamado Simply Fendi.
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