Ponto de interrogação

E aí, beleza?

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Ilustração @viamagalhaes

Falar sobre beleza é problema. Sempre fica alguém, alguma coisa de fora, nunca dá pra cobrir, nem pra mostrar, nem pra agradar todo mundo. Sempre um descontentamento, um “não ter se visto”. O que fazer, né? Falar sobre beleza é solução. Não definitiva, mas de definitiva basta a morte, e mesmo assim nem sabemos de fato se confere a informação. Uma descarga possível, um discurso que não acaba, uma conta que só fecha na medida em que segue aberta. Falar sobre beleza é social. Não tem essa de beleza universal. Existem repetições, processos de transmissão. Não adianta botar na linha do tempo, as imagens não somem, as palavras e os arranjos que definem quem e o que é bonito não cessam de circular, desmontando e rearticulando gerações de significados. Nada é neutro. Falar de beleza é individual, é sobre cada um viver com a genética que recebe, com o carinho e a rejeição que experimenta a partir de sua aparência e de seu corpo. Corpo esse que é em parte inconsciente, que tem uma imagem inconsciente. Ela não se resume a questões sobre beleza, mas também pode passar por esse tema. Falar de beleza é sobre o que somos, o que percebemos, sobre prazer e dor, aceitação e segregação. Falar de beleza é sobre diversão e sacrifício, pode ser suave ou extremamente pesado. Atenção. Aqui não estamos no terreno das influenciadoras vazias, moinhos de discursos de vento, suas barrigas de troféu e intermináveis verões mesmo no meio da peste. Até porque isso é uma das definições e imagens mais contemporâneas do que seria a extrema feiura. Também fugimos dos truques de autopromoção, priorizando uma visão mais política. Falar de beleza é falar do tempo, da obrigação de ser novinha a qualquer idade ou uma senhora “de respeito”. É falar dos meus novos 40, dos novos 50, 60, da vida que é mais longa ou mais curta a depender da cor da pele, não dessa ideia naturalista de saúde, que simplesmente não existe. Falar de beleza é falar de poder. Mas é muito. Uma discussão séria, importante. Com espaço para o humor, sempre, porque ele não só é um recurso criativo como também nos ajuda a lidar com aquilo que muitas vezes é duro demais pra ser abordado à queima-roupa, o que escapa. Essa semana li uma coisa falando sobre dramas dos 40. Nunca estive tão tranquila comigo, é o que tenho a dizer às navegantes que também entraram nessa década. As sentenças patéticas do patriarcado, mantenho longe de mim e, apesar dos privilégios e desigualdades atrozes, vejo amigues de todas as idades, raças e classes sociais se libertando. Faz parte de um processo maior e muito mais amplo e necessário. Tá on. A essa altura vocês já sabem, mas essa é uma edição sobre beleza. Bora falar.