Molduras da alma

Óculos escuros e de receituário passaram de objetos de necessidade a elementos de estilo pessoal. Conheça histórias inusitadas de amantes, famosos e anônimos, desses acessórios atemporais.

Você com certeza já ouviu uma história de alguém que não precisava de verdade usar óculos, mas achava os acessórios tão incríveis que decidiu incorporá-los ao seu estilo pessoal – mesmo que, para isso, precisassem dar uma forçadinha na visita ao oftalmo. Por muitos anos, quem precisava deles para enxergar era chamado de nerd, quatro olhos ou professor. Essa percepção mudou e as lentes coloridas, com armações diferentonas e formatos inusitados, ganharam espaço no guarda-roupa dos fashionistas. Mas não só no deles.

Muitas personalidades se valem dos acessórios, seja por construção de identidade, no caso dos escuros, seja por hipersensibilidade, nos de receituário. ELLE colheu casos curiosos sobre a relação dessas pessoas com seus objetos de estimação.

Chantal Goldfinger

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Chantal Goldfinger se apoiava nos óculos de grau na infância porque era muito tímida. Por vários meses, tentou convencer a mãe e o oftalmologista de que não enxergava bem, até que, aos 10 anos, comprou uma armação Dolce & Gabbana. “Com os óculos, eu podia fazer tudo. Sem eles, eu não era ninguém”, diz, rindo, ao lembrar que por trás das lentes havia uma menina segura, que levantava a mão na sala de aula e ia à balada.

Atualmente consultora de “eyewear” e dona da marca de chocolate GoldKo, ela percebeu uma falha no mercado: os óculos ainda eram vistos como uma espécie de aparelho fixo para os dentes, um acessório que ninguém queria usar ou falar a respeito. Havia um estigma. Decidiu se jogar nesse universo e aumentou a coleção de 70 para 1.200 modelos. “Muitas mulheres me contavam histórias de horror sobre seus óculos, que preferiam não enxergar a usá-los ou que os maridos as achavam feias com eles”, conta.

Uma das entusiastas mais famosas sobre o assunto no país, ela decreta: “Não acredito em óculos certos para cada formato de rosto. Se eu acreditasse, só poderia usar um formato de óculos. Os óculos, na verdade, vestem nossa personalidade”.

Bono Vox

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Vocalista da banda U2, Bono Vox não faz parte da turma que aposta nos óculos como ferramenta de estilo, ainda que as lentes quadradas coloridas já façam parte de seu DNA fashion. Em entrevistas publicadas em 2014, durante o lançamento do álbum Songs of innocence, o cantor e filantropo revelou que tem glaucoma há 20 anos e o uso de óculos o ajuda com a hipersensibilização dos olhos. Em 2015, Bono também se uniu à marca Revo na campanha Buy Vision, Give Sight, ajudando a arrecadar fundos para pessoas com problemas de visão.

Rafaela Bagagli

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Rafaela Bagagli já foi muito questionada na vida real e nos stories do Instagram sobre os motivos de estar sempre usando óculos escuros. A estrategista de comunicação vive a bordo de um Miu Miu – na academia, em casa, à noite ou no trabalho. Ela não é muito afeita à claridade e prefere sempre a meia-luz. Com ar de cool girl e zero grau de miopia, Rafaela prefere modelos mais inusitados, que complementam e trazem informação de moda ao look.

“A lembrança mais engraçada que eu tenho é de uns óculos lilás da Miu Miu que perdi dentro da loja do Marc Jacobs, enquanto comprava uma mochila, que também carrego pra lá e pra cá. Quando peguei o celular, o Co-Star (aplicativo de horóscopo diário) dizia que, para ter uma coisa, você tem de perder outra. Não acreditei! Fiquei muito triste”, relembra. E perdeu mesmo.

Stella Pilagallo

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Quem transita pela noite underground paulistana com certeza já deu de cara com Stella Pilagallo em alguma festa. Jovem, descolada e sempre com os melhores looks da boate – muitos são feitos ou garimpados por ela –, sempre pensa na armação certa para completar o visual. “Procuro modelos diferentes e me apego muito à estética deles como um acessório. Se eu gostei, mesmo que seja uma lente cujo grau mal me deixa enxergar direito, estamos aí, segurando o lookinho e enxergando meio mal!”, diz, brincando.

Sua coleção conta com cerca de 27 peças, sendo a maior parte vintage. Seus preferidos são os que pertenceram à avó, como o de armação prateada enorme da foto. “Não lembro dos primeiros óculos que comprei, mas sempre falo que minha relação com a moda, e principalmente com peças vintage, veio por influência de minha avó. Antes mesmo de começar a brincar de usar os vestidos dela, as primeiras peças que me chamaram a atenção foram justamente os óculos gigantes dos anos 1970. Muitos estão comigo hoje.”

Elton John

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Durante a quarentena, Elton John realizou um sonho antigo que tinha deixado de lado havia anos: desenhar sua linha de óculos. Conhecido pelos brilhos, pelas extravagâncias e pelos looks icônicos, os modelos usados pelo cantor para cobrir a visão também não ficam para trás no quesito estilo. Nessa coleção, lançada em 2021 no Sam’s Club e no Walmart, ele se inspirou em óculos de diferentes períodos da carreira. Alguns dos mais famosos são os modelos rococó, com penas e formas geométricas, que usava em 1974, os de gatinho, de 1989, os de cristais, de 2015, e um par adornado da Gucci, usado em sua última turnê. Para o músico, quanto mais extravagante, melhor.

Larissa Cunegundes

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A produtora de conteúdo Larissa Cunegundes integra o time dos que sempre quiseram usar óculos desde criança, por achar chique. Quando estava no segundo colegial, seu grau finalmente aumentou e ela pôde realizar o sonho. De tanto experimentar todo tipo de modelo, hoje ela compra óculos até pela internet. Também adora um bom garimpo de peças vintage. Seus modelos favoritos, de padronagem tartaruga, são todos achados. “Amo tanto meus óculos que já revirei lixo para achar um que tinha esquecido na bandeja do avião. Durante o voo de volta em minha última viagem, implorei para a aeromoça deixar eu olhar o lixo, dizendo que os óculos eram muito especiais para mim. No fim, encontrei jogados entre os bancos”, relembra. Quem nunca, não é?

Iris Apfel

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Talvez o nome mais associado a modelos de óculos extravagantes seja o de Iris Apfel. Conhecida por suas lentes redondas e grossas, o ícone de estilo revela em sua autobiografia, Iris Apfel: Accidental icon, que sempre considerou a peça um acessório de estilo – e usava mesmo quando não precisava. “Por algum motivo, armações inusitadas sempre me fascinaram. Quando via modelos únicos, comprava e colocava em uma caixa velha de sapatos de minha mãe que eu guardava no armário”, escreveu.

Quando completou 100 anos, em 2021, Apfel lançou uma colaboração de 100 modelos com a marca de eyewear Zenni, todos inspirados em seu visual atemporal e em seu DNA. São cinco categorias: Live Colorfully, com armações coloridas, Bazaar Treasures, que ela desenhou pensando nos mercados de pulga, Signature Style, com o modelo que a tornou célebre, a Structural Design, inspirada em seu interesse por arquitetura, e Mini Iris, de óculos infantis. Apfel é a prova viva de como um look pode evoluir com o acessório perfeito – no caso dela, os óculos.

Karl Lagerfeld

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É superdifícil achar qualquer foto de Karl Lagerfeld sem seus óculos – e isso não é uma coincidência. O icônico estilista da Chanel, morto em 2019, aos 85 anos, sempre sustentou o look meio misterioso, blasé até. Suas armações escuras faziam parte da persona, um estilo que construiu por anos a fio. O motivo pelo qual ele sempre “se escondeu” por trás das lentes é curioso e foi revelado em uma entrevista: “Pessoas míopes muitas vezes têm olhos um pouco tristes, como um cachorro que está esperando para ser adotado. Você tem de tirar os óculos por duas ou três horas para que isso desapareça, o olhar lamentável. Essa não é a impressão que eu quero passar. Não sou eu”.