Carta da editora

Eu cresci com medo de Freddy Krueger e, por mais que hoje eu ache o personagem esteticamente tosco, quase naïve, ainda consigo lembrar da sensação paralisante que ele me provocava. O medo de dormir e de não acordar mais.

Corte no enredo, algumas décadas depois, me deparo com terrores reais, desses que assombram a gente quando estamos de olhos bem abertos, com que eventualmente podemos trombar. Desemprego, inflação, um certo fantasma de uma Terceira Guerra Mundial pairando no ar… Ascensão da extrema direita e do discurso de ódio. Medo até de usar vermelho, e olha que amo vermelho. Temores de gente grande, conhecidos também como contas a pagar, lugares a evitar ou, pior, medo de que algo ruim aconteça com um filho, com quem eu amo.

E, talvez para nos desviar desses cenários com Freddys Krueger bem mais assustadores – dê play no vídeo A hora do pesadelo e perceba que qualquer semelhança com a realidade não é mera coincidência! –, que intimidam não só eu, mas muitas pessoas, a gente tente transformar o medo em entretenimento. Num filme aterrorizante que tranquilize, porque sabemos que vai acabar, que é faz de conta, numa série teenager, num Halloween, com fantasias fashionistas e sustos controlados, que têm tempo cronometrado para passar.

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Nesta edição especial de Halloween, típica de outubro (confira também a do ano passado) e que teve sim direito à festa, falamos sobre medos reais e imaginários. Pra começar, a editora especial e psicanalista Vivian Whiteman pergunta (e responde) em Ponto de Interrogação por que o medo fascina, por que fugimos dele e, ao mesmo tempo, desejamos encontrá-lo, confrontá-lo nem que seja à distância, na segurança de quem tem um lar.

Quer um exemplo? A atual obsessão coletiva por séries e podcasts de true crime. Eles fazem tanto sucesso hoje em dia que, perdoe o trocadilho, chega a espantar. Nosso editor de arte e escritor sagaz Gustavo Balducci se debruça sobre o fenômeno e mostra na matéria Elas não têm medo de apertar o play como as mulheres saem na dianteira no quesito narrar boas (ou más?) histórias.

Direto pra uma moda feita pra usar, Giuliana Mesquita, que passa a integrar nosso time real oficial (ela é colaboradora de ELLE de longa data), mostra como a estética gótica volta justamente em tempos sombrios, quase apocalípticos na Balenciaga. Já Lelê Santhana apresenta três estilistas que usam o terror como ponto de partida para criar peças que questionam o conceito de beleza.

Tem mais. Tem perfume com cheiro de gente desaparecida, um medo que inevitavelmente se concretiza ao longo dos pontos finais que a vida nos dita. Numa entrevista em vídeo, Pedro Camargo, nosso editor de beleza, convoca Chriselle Lim, da Phlur, para explicar a fórmula de Missing Person, o perfume que estourou no TikTok e que, juram, têm o cheiro da pessoa da qual sentimos falta. Confesso: já está na minha lista de “queros”, poucas coisas afinal dão mais conforto do que sentir o cheiro de alguém que tenha feito sentido pra gente.

Para coroar esta edição, Juliette, nossa estrela da capa e musa da redação, interpreta diferentes personagens de filmes clássicos do terror em um editorial de moda no estilo “from hell to elle”, capitaneado pelo diretor de criação, Luciano Schmitz. E concede uma entrevista ao jornalista Álvaro Leme, em que fala sobre o medo de não ser tão boa quanto deseja, de se cobrar o tempo inteiro – um medo, vamos combinar, recorrente entre as mulheres. O monstro do patriarcado está sempre à espreita.

Do mundo físico para o digital, Galis, o avatar de Adriane Galisteu, também ganha capa e ensaio exclusivos na ELLE View, com direito a atitude destemida, mesmo em territórios sombrios – confira o encontro imperdível dela com a nossa Ellen em Como sobreviver a um apocalipse.

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Entre um susto e outro dos noticiários, espero que você se divirta com esta edição, se inspire e consiga fazer do medo algo mágico, válvula de escape: um look dark para deixar os dias não tão ensolarados mais bonitos; um make gente estranha, festa esquisita, mas cheio de personalidade; uma partida em um jogo de tabuleiro que sirva para não se sentir mais sozinho.

Um beijo e até a próxima.

RP