Meteoro Angélica

Em uma conversa franca, a maquiadora e influenciadora Angélica Silva compartilha com a ELLE View a história emocionante por trás de sua escalada até se tornar uma das maiores referências em beleza do país.

Quem olha para os mais de 120 mil seguidores que Angélica Silva tem no Instagram não imagina a longa caminhada que ela percorreu até encontrar o sucesso online. Na verdade, sua jornada dentro do mundo da beleza nem era para ter acontecido, se não fosse por sua insistência, sua inteligência e sua força de vontade. “Eu ouvia da minha mãe que, quanto mais estrutura e quanto mais pessoas brancas há em um recinto, mais eu deveria me afastar dele”, lembra a maquiadora em entrevista à ELLE View, dias depois do seu aniversário. “Não julgo minha mãe por ter dito essas coisas. Eu senti na pele o preconceito e o racismo atendendo mulheres em domicílio. Já fui acusada de roubo inúmeras vezes, por exemplo. Hoje mesmo ainda tenho muita dificuldade em entender e assimilar o sucesso. Essa não é a história esperada de uma mulher gorda, preta e pobre no Brasil.”

Durante a nossa conversa, Angélica não escondeu as lágrimas. Os momentos em que seus olhos enchiam d’água aconteciam quando ela contava alguma dessas conquistas inesperadas. Uma delas foi a ocasião em que nos conhecemos. Ela foi uma das pouquíssimas convidadas para o jantar de 10 anos da Nars no Brasil – um evento que aconteceu na Galeria Verve, no centro de São Paulo, em que a embaixadora da marca Rafaella Crepaldi decidiu chamar à mesa “pessoas que contribuem para repensar a beleza no Brasil”. 

De fato, se você entrar no perfil de Angélica no Instagram, rapidamente vai perceber que a maquiagem, para ela, não é brincadeira. “Tenho amigas que compram absolutamente tudo que ela indica”, diz a repórter de beleza Bárbara Rossi. Suas análises são sagazes e objetivas e os looks que ela compõe em frente da câmera de seu celular têm sempre um toque de ousadia, que é a sua marca registrada. “Para ser bem honesta, eu comecei com o Instagram em 2020 com dois objetivos: o primeiro, é claro, era mostrar o meu trabalho como maquiadora, e o segundo, me conhecer cada vez mais. E, nessas de mergulhar no autoconhecimento, fui percebendo que amo os makes mais malucos, mais divertidos. Adoro quando descubro que alguém se abriu para uma loucurinha a mais depois de assistir meus vídeos”, revela.

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Furando a bolha

“É curioso. Quando penso na minha trajetória, consigo entender o quanto tudo foi muito difícil, mas na época, por alguma razão, eu não achava nada daquilo impossível. Era só o que eu tinha que fazer. Como se não houvesse outra opção, sabe?” Aqui ela se refere, por exemplo,  a quando começou a trabalhar como autônoma para ter horários mais flexíveis e concorreu a uma bolsa para fazer o curso profissionalizante da L’Oréal, em São Paulo. “A gente tinha que estar sempre de branco e o sapato não podia estar sujo. Eu ia de havaianas no ônibus, para ninguém pisar no meu sapato, e os vestia só quando chegava lá. Muitas vezes, eu não tinha dinheiro para o almoço e, como já era muito avançada por ter aprendido tudo no salão, dizia para os meus colegas: ‘Te dou um intensivão de escova se você pagar o meu almoço por uma semana’. Foi assim que eu fui me virando para terminar o curso.” 

Vendo o esforço da filha em perseguir um sonho, a mãe finalmente deu o braço a torcer: “Lembro que eu tinha uma chapinha que era azul e na L’Oréal a gente só podia usar aparelhos pretos. Por isso, minha mãe e eu encapamos juntas a chapinha em fita isolante. Usei essa chapinha até o curso acabar!” Vale dizer que foi por volta dos 18 anos que Angélica fez o curso da L’Oréal. Isso implica que a sua vida no salão começou aos 14, quando sua tia – que trabalhava em uma loja de cosméticos – insistiu para que a dona do empreendimento deixasse a futura beauty expert trabalhar. “Eu comecei trocando toalhas e fui crescendo. Salão de bairro não tem isso de cabeleireira ser uma coisa e maquiadora outra. Todo mundo tem que saber fazer tudo. Fiquei cinco anos ali”, recorda. 

Depois disso, ela abriu um salão de garagem na Vila Sônia e chegou a fazer mais de dez escovas progressivas em um só dia. “Já estava fazendo mal para a minha saúde. Meus pulmões sofriam, meus pulsos abriram, não aguentava mais. Foi aí que decidi que queria me especializar na maquiagem. Sempre foi o que eu mais gostei.” Com sua coragem característica, ela então fechou as portas do salão, vendeu tudo e foi fazer um curso na Escola Madre, uma das instituições mais renomadas de ensino de maquiagem em São Paulo. 

“Nessa época, eu já tinha começado o Instagram e sabia que, ao me matricular no curso, ganharia uma caixa com 50 produtos. Logo pensei em todos os conteúdos que poderiam surgir daquilo.” Nesse ínterim, a Fenty Beauty chegou ao Brasil. “Meu marido me emprestou dinheiro – eu estava totalmente zerada depois da venda do salão – e comprei alguns produtos da marca. Fiz um look e postei no Instagram, marcando a Fenty. Dias depois, recebi uma mensagem em inglês dela e achei que era propaganda. Nem dei bola, nunca respondi. Na verdade, eles estavam me pedindo para compartilhar o meu visual no dia de São Valentim – o Dia dos Namorados, dos Estados Unidos – no perfil deles. E foi assim que eu fui notada pela Rihanna”, lembra, brincando.

Mesmo sem ter obtido resposta, a Fenty publicou a foto de Angélica usando o Uncensored – icônico batom líquido e vermelho da marca. De lá para cá, os seguidores foram se acumulando, as parcerias com marcas foram crescendo, os vídeos foram se aprimorando. Hoje, ela é agenciada pela Coolab, a mesma empresa que cuida de personalidades como a atriz Bruna Marquezine e a influenciadora e empresária Francesca Monfrinatti. “Para mim, o mais legal é mostrar tanto para quem está longe quanto para quem está perto de mim que é possível, sabe? Minha trajetória teve um impacto muito grande na percepção que a minha família tem de si mesma. Sinto que estou honrando o que minha mãe me disse. Ela dizia assim: ‘Olha, Angélica, eu não posso te dar nada de presente, mas o que eu desejo é que você conquiste tudo o que eu não consegui, que você faça o que eu não consegui fazer’. No meu aniversário, ela me ligou, dizendo que quer que eu realize todos os meus sonhos. Eu nunca tinha ouvido isso antes. Nem dela, nem de ninguém. Achava que esse tipo de coisa não era para mim. Eu também estou aprendendo a acreditar que tudo é possível.”

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