Ponto de Interrrogação

O Ministério do Amor quer saber: e você, está se guardando para quando o Carnaval chegar?

Ponto de Interrogação

 

Uma das falas mais divertidas da campanha do presidente Lula foi aquela de que no governo dele todo mundo namoraria. Promessa feita, promessa malandramente cobrada pelas redes, que muito rapidamente criaram dezenas de memes e muitos tweets sobre o Ministério do Amor.

Não sei se todo mundo que namora ama, acho que não, mas talvez o lema desse ministério seja aquele do “qualquer maneira de amor vale a pena”. Até os meio de mentira, os que a gente inventa pra treinar ou se distrair. Se bem que amor de mentira é diferente, muito diferente, de amor inventado. Conheço amores inventados verdadeiríssimos, intensos e vividos com muita honestidade, mesmo que extremamente velozes, fugazes.

 

No fundo, acredito mesmo que todo amor de verdade é inventado.

 

Mas o amor de Carnaval talvez seja um desses amores-relâmpago que aparecem e somem muito rápido, deixando um rastro de luz, uma faísca. Não estou falando de beijos na baciada ou sexo estilo “meet and greet”, que mereceriam outras categorias, talvez. Está em questão uma coisa assim emocionada sem vergonha, grande, cuja natureza é o exagero.

Um exagero que a gente às vezes jura de pé junto que é o que faltava chegar, que a gente quer pra sempre, que é capricho dos deuses, que é pro ano inteiro, muitos anos.

E não importa se no fim esse tempo são sete ou 30 dias de calendário, os minutos do amor de Carnaval são outros, mal contados, incontáveis, com desconto.

E é de conhecimento geral que toda pessoa deveria ter o direito de convocar Carnaval pessoal fora de época quando as condições e os contextos assim pedirem. Pode ser uma emergência amorosa incontornável, um cordão que não pede passagem, só atravessa com tudo.

Importante. O amor de Carnaval, mesmo que meio melancólico no sentido teatral da coisa, há de ser alegre. Não precisa ser feliz nem nada, mas andar com alegria. Alegria protege o peito, afasta os pessimamente intencionados, aqueles que saem de casa pra machucar.

O Ministério do Amor não recomenda moderação no Carnaval. Afinal, não é época para isso, basta um sem juízo que seja mais alegre, menos dado ao lado extremo do excesso destrutivo.

Beijar alegremente, por exemplo, mesmo que na xepa, no embalo, maratonando, pode ser alegre, pode ser uma brincadeira bem-vista pelo ministério, uma diversão, uma amorosidade sem compromisso de verão. Mas, se rolar força, constrangimento, grosseria, obrigação, não sobra nada de bom. Não permitam, não pratiquem, não assistam calados.

No livro 1984, clássico-clichê das distopias, os ministérios tinham nomes deturpados, usados para defender o oposto do que prometiam. O Ministério do Amor, por exemplo, era focado em submissão, opressão. Tem gente que acha que amor é isso, que usa o amor como palavra violenta, que não entende nada, não aceita desentender e cultiva ressentimento.

A violência do amor é bem outra. É a subida e a parada da bateria, é aquele pique que a rainha passista dá, é o grito do bloco, a microfonia, é a confusão de pernas, é o estouro das boas primeiras vezes, das boas surpresas.

Se depois do Carnaval todo mundo vai namorar, é coisa do destino, dos horóscopos, dos encontros, dos esforços de quem quiser. Nem todo mundo quer, então a promessa do presidente já inclui máximo respeito a todos esses que estão fora por opção.

Mas também faz pensar em tudo o que precisamos fazer para abrir as fronteiras dos encontros, para arrancar o utilitarismo, os ideais supremacistas e o preconceito dos assuntos do amor. Isso é tão importante e tão complexo que não cabe aqui, mas não custa lembrar.

Por ora, em termos de amor de Carnaval, se eu fosse ministra só desejaria que seja aberto a todo mundo, eternamente alegre e gostoso enquanto dure.