“Me conecto com pessoas reais, que passam perrengue, que vivem altos e baixos e têm histórias para contar. Gosto de falar sobre a minha trajetória a partir de um lugar de vulnerabilidade”, diz Bianca Andrade em entrevista à ELLE View. Quem acompanha a influenciadora e empresária sabe que é exatamente dessa forma que ela encara a vida – e os negócios. 

Nascida e criada no Complexo da Maré, bairro formado por um conjunto de comunidades no Rio de Janeiro, Bianca começou a criar conteúdo para a internet em 2011, com apenas 16 anos. “Não existia nada palpável que me fizesse acreditar que eu poderia construir tudo o que construí. Mas algo no meu coração dizia que esse era o meu caminho”, lembra. E era mesmo. Em pouco tempo, com o nome Boca Rosa, ela se tornou a maior YouTuber de beleza no Brasil. 

Em 2018, em parceria com a Payot, nasceu a Boca Rosa Beauty, marca de maquiagens comandada pela influenciadora. Os produtos, que já eram hit na internet, se tornaram um sucesso ainda maior de vendas em 2020, depois de sua participação na 20a. edição do Big Brother Brasil, da Rede Globo. Agora, a influenciadora comemora o faturamento milionário da marca e começa a planejar os próximos passos.

“Quero muito levar a Boca Rosa Beauty para o mundo: quero contar a história da menina da favela do Rio de Janeiro e motivar outras meninas que têm origens parecidas com a minha.”

Aqui, Bianca revê sua trajetória, conta os bastidores da Boca Rosa Beauty e ainda compartilha suas maiores estratégias de marketing. 

Qual foi seu primeiro contato com a beleza? 

Quando eu era bem pequenininha, adorava pegar o nécessaire da minha mãe para me maquiar. Era uma verdadeira paixão! Tanto a beleza quanto a moda sempre foram ferramentas importantes para que eu pudesse me expressar – por isso tive uma fase em que só usava cor-de-rosa. (risos) Na adolescência, entrei de cabeça na beleza através de vídeos de tutoriais no YouTube. Tive a sorte de conhecer esse universo quando ele ainda estava começando.

Quando você percebeu que queria começar a gravar vídeos também? 

Logo quando assisti o primeiro tutorial, tive a intuição de que aquilo era para mim. Era um vídeo da Andreza Goulart, que é provavelmente a primeira YouTuber de beleza no Brasil. Não parava de pensar: “Será que consigo fazer isso também?” Nessa época, eu morava na favela e trabalhava no bufê da minha mãe. Todo dinheiro que recebia, investia em itens para que pudesse fazer vídeos: câmeras, produtos de maquiagem etc. Sempre fui muito sonhadora, sempre quis ser grande. Desde muito nova, questionava como a Beyoncé havia chegado no lugar onde ela estava e isso me inspirava. (risos) 

Você imaginava que ia fazer esse sucesso ou foi uma surpresa? 

Não havia nenhum incentivo para que isso acontecesse. Uma adolescente que morava na favela, com tantas limitações… Não existia nada palpável que me fizesse acreditar que eu poderia construir tudo o que construí. Mas algo no meu coração dizia que esse era o meu caminho. Eu me divertia muito fazendo vídeos, mesmo com todos os perrengues – se faltava luz na comunidade, por exemplo, eu precisava parar no meio das gravações.

Quando você percebeu que as coisas estavam começando a dar certo? 

Não houve um momento de explosão, de uma grande virada, minha história não aconteceu assim. Na verdade, acho que foram vários pequenos momentos que me mostraram que eu estava no caminho certo. Como empresária, com certeza foi com o lançamento da Boca Rosa Beauty. Eu estava em Orlando, nos Estados Unidos, e era meu aniversário. Estava tomando um banho energizante, alinhando os chacras… Aquele banho pensado para virada de ciclo, sabe? Lembro de, nesse momento, me sentir extremamente insegura com o lançamento da marca, mas também ter a clara sensação de que tinha encontrado meu propósito de vida, que o meu sucesso na internet tinha acontecido para que eu chegasse ali. Eu não sabia o que ia acontecer, mas tudo aquilo me fez pulsar.

“Acompanhei muito o modelo de negócios da Kylie Cosmetics – a partir dele, entendi que, se fosse lançar algo, queria ser diretora criativa.” 

Ter uma marca sempre foi um desejo seu ou foi algo que simplesmente aconteceu?

Desde o momento em que criei a persona Boca Rosa, já sabia que iria lançar um batom cor-de-rosa. Imaginava que teria uma linha com dez batons em diferentes tons de rosa – o que hoje, de fato, tenho no portfólio da marca. Com o passar do tempo, algumas empresas, vendo o sucesso que meu canal fazia no YouTube, começaram a fazer propostas de parceria para o lançamento de linhas de cosméticos, mas nenhuma delas tinha a minha cara. Mas isso fez com que eu ficasse mais atenta para o que estava acontecendo no mercado. Isso aconteceu bem na época em que as Kardashian-Jenner, que também eram influenciadoras, lançaram suas marcas. Acompanhei muito o modelo de negócios da Kylie Cosmetics – a partir dele, entendi que, se fosse lançar algo, queria ser diretora criativa, e não apenas emprestar o meu nome. Desabafei sobre isso durante uma reunião com a Payot, com quem eu estava fechando um contrato publicitário, e na hora eles falaram que gostariam de entrar nessa comigo. A ideia era que eles cuidassem da distribuição e da fabricação, e eu ficasse com desenvolvimento de produto, marketing e divulgação. A marca seria minha! 

Essa divisão ainda continua? 

Sim. A Payot cuida da fabricação e todas as ideias nascem de mim. Hoje tenho um time de 26 colaboradores dentro do escritório Boca Rosa Beauty e consigo delegar muito mais tarefas, mas tudo parte do meu feeling. Além de empresária, sou maquiadora, então sei exatamente o que funciona e o que quero lançar. Quando estou com a agenda muito cheia e não tenho tempo para estudar, fico desesperada! Porque é um universo que eu realmente amo. 

O que você mais gosta de fazer dentro da marca? 

Me envolvo em tudo: do desenvolvimento do produto à estratégia de marketing. Quando vamos lançar algo, crio na minha cabeça o que é o produto, ao mesmo tempo que penso como quero que ele seja comunicado para o público. Mais do que ninguém, eu conheço minha comunidade. Cada lançamento é atrelado a uma história minha – acho que esse é o grande segredo do marketing digital, porque as pessoas gostam de se conectar com histórias. A partir disso, vem o brainstorming com o meu time: contrato profissionais muito bons e conto muito com eles para agregar ainda mais valor a tudo o que eu faço. Gosto que me provoquem!

“Eu falei para o Boninho: “Só entro se eu puder usar a minha maquiagem!”

Você é a rainha do marketing. Quais foram as estratégias que mais deram certo na Boca Rosa Beauty? 

Acho que o próprio lançamento da marca – foi uma estratégia megalomaníaca, do jeito que eu gosto. (risos) Escolhemos uma casa na Avenida Paulista, em São Paulo, para ser a Boca Rosa House. Ela foi toda estampada com boquinhas e, à noite, era iluminada com uma luz que a deixava todinha cor-de-rosa. Foram três dias de experiência. As pessoas podiam testar os produtos com maquiagens feitas por grandes experts de beleza. As 500 primeiras que comprassem produtos recebiam o kit da minha mão. Foi importante para mostrar que eu não era apenas o rosto da marca, e, sim, a alma.  

Você entrou no Big Brother Brasil pensando em alavancar a marca também? 

Sim! Eu falei para o Boninho: “Só entro se eu puder usar a minha maquiagem!” Assim que ele me deu o ok, criei uma estratégia crossmedia. Na hora em que o programa entrava ao vivo, por exemplo, minha equipe postava uma foto no Instagram em que eu estava com exatamente o mesmo visual – para todo mundo me achar louca mesmo. (risos) Acredito que uma boa empreendedora é aquela que valoriza todos os espaços – não é porque sou da internet que diria não para a TV. Meu público ainda estava na bolha das redes sociais e eu também precisava atingir quem estava fora dela. Fui com a cara e com a coragem, porque nunca tive medo de ser cancelada ou de errar em público. Sempre soube fazer do limão uma limonada. Saí amada e odiada. Mas sou muito grata ao programa porque, se eu sou essa mulher hoje, é também por causa do que eu vivi nele. É por causa do BBB que tenho esse alcance.

Associar o seu nome a uma marca pode ser desafiador porque as críticas se tornam muito pessoais. Como você lida com isso? 

Sou muito transparente com a minha opinião. Não tenho medo de me posicionar: quando sou quem eu sou, não sinto medo de nada. Sou muito fiel às coisas que acredito. É claro que às vezes dói, mas a longo prazo vale a pena. Porque é a minha história que eu estou contando. E também respeito muito a opinião do meu consumidor – é ele quem me ajuda a construir minha marca. Lembro que no BBB as pessoas falavam: “Não concordo com algumas atitudes da Bianca, mas da maquiagem dela não dá para falar mal”. (risos) Me divirto muito com isso. 

Você já gravou vídeos divertidos reagindo a críticas aos produtos, ao mesmo tempo que também fez mudanças a partir do feedback da comunidade. 

Desde o começo, estabeleci algumas coisas inegociáveis na Boca Rosa Beauty: uma delas é a opinião do meu consumidor. Gosto de humanizar a minha empresa e respeitar aqueles que usam meus produtos. Como figura pública, não posso me esconder atrás da minha marca quando algo acontece. Todo mundo erra, mas como você lida com isso é o que faz sua empresa ser respeitada. Tivemos um produto que causou irritação em algumas pessoas, mesmo com todos os testes de segurança que fizemos – isso é algo que acontece com muitas marcas, mas a maioria delas finge que nada aconteceu. A minha decisão foi fazer um recall e devolver o dinheiro, por mais difícil que isso tenha sido para o negócio. São nesses momentos que mostro o respeito que tenho pelo meu consumidor. 

“Respeito muito a opinião do meu consumidor – é ele quem me ajuda a construir minha marca.”

Quais são os maiores hits da marca? 

A minha base é o carro-chefe. Ela é à prova de choro, suor… Até a Ivete Sangalo já usou em show, acredita? A minha linha de pele, em geral, é muito amada. A Pabllo Vittar sempre fala: “Bicha, seu pó é o meu favorito!” A Anitta também costuma usar bastante. O mais legal é que esses produtos foram pensados para a pele da brasileira.  

No que você tem investido mais no momento? 

Minha marca ainda é um neném, então ainda estamos na fase de investir muito! Não tenho medo de colocar dinheiro nas coisas que estamos fazendo. Meu escritório foi um grande investimento – caríssimo, inclusive. As campanhas também têm muito valor agregado. Outro foco de investimento é o time, porque quero os melhores do mercado trabalhando comigo.

Este ano você investiu bastante em projetos sociais também, né? 

Sim! Estamos patrocinando o time de base do vôlei feminino do Corinthians. A mãe de uma das jogadoras entrou em contato comigo falando que o time precisava de apoio. Sou apaixonada pelo esporte feminino e achei importante trazer mais visibilidade para isso, principalmente porque sou uma figura pública. Queria também chamar a atenção de outras marcas para que também investissem em outros times como esse. Além disso, o Deu Match, meu curso de marketing e empreendedorismo para mulheres da favela, está na segunda edição.  

Quais os próximos planos para a marca? 

Quero muito levar a Boca Rosa Beauty para o mundo: quero contar a história da menina da favela do Rio de Janeiro e motivar outras meninas que têm origens parecidas com a minha. É o que sinto no coração, sabe? Algo me diz que isso vai acontecer. Me vejo na mesma prateleira que a Kylie e a Rihanna! (risos) Também tenho vontade de expandir e abrir novas marcas, mas isso é só para 2024. Neste ano, tenho investido muito em mim e na minha saúde mental, para cuidar da Bianca fora do universo Boca Rosa – algo que eu precisava fazer, principalmente agora, que sou mãe.