Sem fronteiras

O b-beauty está em alta: com uma boa variedade de ingredientes e muita inovação, os cosméticos brasileiros já são referência. Mas será que as marcas nacionais estão lucrando com o mercado internacional?

Lola Cosmetics, Simple Organic, Bruna Tavares, Hela Beauty e Be Belle são apenas algumas das marcas de beleza que investiram, nos últimos tempos, na internacionalização de seus produtos. Uma safra que ganhou o apelido de “b-beauty”, ou beleza brasileira. Elas entraram em mercados competitivos, como o europeu e o dos Estados Unidos, ou expandiram os negócios para outros países da América do Sul, como Argentina e México. 

O Brasil exporta, de acordo com dados do Ministério da Economia, cosméticos e produtos de cuidados pessoais para pelo menos 170 países. O superávit comercial do setor ultrapassou, em 2020, o valor de 23,4 milhões de dólares. E esse número deve aumentar nos próximos anos. O caminho, no entanto, não é assim tão fácil: para conquistar o mundo, as marcas brasileiras têm que lidar com desafios logísticos e conquistar também a confiança dos estrangeiros. 

Começar do zero

A Lola from Rio, a marca da Lola Cosmetics fora do Brasil, está presente, atualmente, em 44 países, incluindo EUA, Itália, Espanha, Emirados Árabes e Austrália. Por mais que já seja uma queridinha do setor de cabelo no Brasil, a empresa teve que começar do zero quando decidiu expandir os negócios para fora de nossas fronteiras. “Os maiores desafios no momento de promover marcas brasileiras, principalmente em países desenvolvidos, estão relacionados à credibilidade e à competição com grandes players”, explica Vaclav Filho, gerente de Comex da Lola from Rio. 

“É necessário um conhecimento profundo dos mercados em que as marcas querem entrar. As empresas precisam mapear os canais de venda e também entender o comportamento de consumo dos clientes em potencial”, afirma Daniela Ferreira, profissional de marketing estratégico da UP4 Market e consultora especialista em formação internacional do Sebrae-Rio. Não adianta tentar explorar um território sem fazer um mapa do tesouro para guiar a busca pelas melhores fontes de renda. 

O ponto de partida também é uma decisão crucial quando o assunto é expandir os negócios pelo desconhecido. A especialista em marketing estratégico mora em Lisboa, Portugal, há quatro anos. A cidade é uma das principais portas de entrada para as marcas brasileiras no mercado europeu. Foi por onde a Lola Cosmetics começou a sua internacionalização, por exemplo. Os motivos: a língua é semelhante, bem como o clima. Isso não impede, no entanto, que haja diferenças culturais.  

“Costumo dizer que os europeus não leem a frente do rótulo, mas a parte de trás. Eles estão mais preocupados com os ingredientes. Outra questão é que, no Brasil, a beleza é tão importante quanto a higiene. Na Europa, é mais vista como algo supérfluo”, fala a profissional. Sustentabilidade, consciência social e impacto no meio ambiente também são questões muito importantes, que interferem na decisão de compra dos consumidores dessa região. Assim, em alguns casos, as marcas precisam estar de acordo com as diretrizes do mercado, mas também do gosto de quem vai comprar. 

Ritmo novo

“O consumidor brasileiro é movido pela novidade. Algumas marcas nacionais de beleza se especializaram em lançar dezenas de novos produtos todos os anos. Nos mercados internacionais, especialmente nos mais desenvolvidos, não existe um apetite tão grande por lançamentos frequentes”, diz Vaclav Filho. “O caminho para a notoriedade é criar algo que seja muito especial, que tenha uma diferenciação realmente notável em relação às marcas locais e globais.”

E não apenas na forma que as pessoas consomem esses produtos: há diferenças em relação a onde eles são encontrados nas prateleiras. “No Brasil, um xampu pode ser vendido nas farmácias. Em Portugal, por sua vez, não encontramos cosméticos, apenas os que têm alguma função de tratamento, como os xampus anticaspa”, complementa Daniela. 

Essas diferenças técnicas incluem, ainda, a regulação sanitária e a legislação. A marca de skincare Be Belle começou a vender seus produtos em Portugal em janeiro deste ano. Ludmila Bonelli, fundadora e CEO da empresa, lembra que um dos maiores desafios foi exatamente estar de acordo com essas regrinhas sem que seus produtos perdessem a qualidade. “Muitas dúvidas surgem em relação aos requisitos básicos para as exportações de dermocosméticos, mas vale ressaltar que cada destino segue uma norma e é preciso um estudo sobre a legislação para que a empresa faça tudo corretamente.” 

Além de exigências de licenças e certificados, muitos países também solicitam que a rotulagem siga um padrão, sem falar nos ingredientes que podem ser proibidos em algumas regiões. Para que tudo corra bem, as marcas ainda precisam ter distribuidores de qualidade, bem como centros de logística e protocolos que sigam a maneira pela qual cada mercado funciona. “Na Europa, as lojas não costumam fazer estoque. Realizam compras mais picadas. Assim, a estrutura precisa comportar esse tipo de distribuição. Ter uma relação de confiança com essas empresas é uma das partes mais críticas do processo de internacionalização”, comenta Daniela Ferreira. 

Ufa, parece uma trabalheira. “Na verdade, não é tão difícil se a empresa for bem assessorada”, diz a profissional de marketing estratégico. Do ponto de vista fiscal, o Brasil incentiva bastante a exportação. Assim, não pesa tanto no bolso das empresas que queiram fazer esse movimento. É interessante que empreendedores brasileiros estejam captando recursos em outros países. Basta planejamento, o que as empresas do Brasil, que lidam com desafios muito mais complexos por conta da extensão de nosso país, tiram de letra. 

Próxima parada: dominação mundial

Os consumidores internacionais se interessam pelos nossos produtos. “Temos uma grande variedade de ingredientes”, diz Daniela. A nossa flora permite que tenhamos uma cartela maior de ativos naturais. “E, como somos um mercado muito grande, muito competitivo, o mercado de beleza brasileiro está sempre inovando. Ele é muito rápido em aplicar novos ingredientes e na criação de embalagens e rótulos diferentes.” 

Então, se é um caminho completamente possível de ser feito com bastante planejamento e tem um público-alvo ávido pelo que temos a oferecer, por que não há mais marcas brasileiras bombando no exterior, mesmo com a nossa boa fama na estética? De acordo com Daniela Ferreira e Ludmila Bonelli, o principal motivo é o desinteresse dos empreendedores nacionais. 

“O Brasil ainda está se iniciando na exportação. Temos um mercado muito grande, que compra e vende muito, então não precisamos olhar tanto para fora. A defasagem está mais relacionada a essa cultura do que a qualquer outro motivo”, arremata a especialista em marketing estratégico. A sorte está lançada!