Setenta anos de caminhada

Entenda como o Horsebit, da Gucci, se tornou um símbolo da moda – e sem nenhum sinal de desgaste.

O que Jane Birkin, Zoë Kravitz, Madonna, Donald Glover e Hailey Bieber têm em comum? Além de carreiras estelares em suas respectivas áreas e estilos singulares, todos já foram flagrados usando uma mesma peça de roupa em algum momento da vida. Mais especificamente, um calçado: o mocassim Horsebit, da Gucci. O item, que virou sinônimo da herança e do savoir-faire da grife italiana, completa 70 anos de história este ano e continua a conquistar o coração, ou melhor, os pés de executivos de Wall Street, passando desde os amantes do universo dos loafers até celebridades em tapetes vermelhos de grandes premiações.

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Do começo… 

O ano era 1953 e a Gucci vivia um processo rápido de expansão, com a abertura de sua primeira loja física no Hotel Savoy, em Nova York. Foi nessa mesma rede hoteleira, na unidade de Londres, onde o fundador da grife italiana Guccio Gucci observou de perto e absorveu todo o estilo de vida aristocrático e equestre dos hóspedes, quando trabalhava como carregador de malas no local, durante a adolescência, levando bagagens luxuosas de viajantes do mundo todo.

De volta a 1953. Guccio havia falecido, deixando o negócio nas mãos do filho Aldo, que logo desenvolveu um modelo de mocassim inspirado nas raízes equestres da etiqueta e em resposta ao boom de loafers entre estadunidenses adeptos ao estilo preppy da década de 1950. A criação ganhou couro leve totalmente preto, bico arredondado e freio de cavalo (Horsebit) dourado no cabedal, um detalhe que, além de elevar o design, se tornou umas das assinaturas mais reconhecíveis da marca e um símbolo de status até hoje.

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Originalmente feito para homens, o loafer não demorou muito para ganhar versões femininas e conquistar o coração de italianos e italianas apaixonados por tudo o que representasse o renascimento de seu país no pós-guerra. Enquanto isso, paparazzi se colocavam a postos na porta da loja da Gucci na Via Condotti, em Roma, para flagrar a visita de estrelas como Jane Birkin, Jacqueline Kennedy e Sophia Loren, que frequentemente eram vistas de mocassim Horsebit no pé, fazendo com que o modelo logo virasse o it-shoe do momento e ganhasse apelo internacional.

Ainda que loafers fossem populares durante a década de 1950, o calçado em geral era usado em ocasiões mais formais. Discreto, mas facilmente reconhecido à distância, o modelo Horsebit exalava uma elegância despreocupada, que conversava com um processo de casualização de dress code da época. Novos contextos surgiram com o tempo e o loafer passou a ser usado de formas cada vez mais experimentais e em situações inusitadas. Prova inconteste é a atriz Jodie Foster, ainda adolescente à época, andando de skate em seu mocassim Horsebit na década de 1970.

Novos contextos 

Hoje, a história se repete: loafers estão em alta e disputando espaço com sneakers nas vitrines de grandes varejistas e no armário dos consumidores. Tudo graças à popularização da estética preppy, que tem ganhado notoriedade principalmente na moda masculina. Com o fenômeno, os mocassins, incluindo o Horsebit, receberam interpretações nada convencionais ao longo dos anos e novas formas de combinação.

Figurinha carimbada nas coleções da Gucci, o sapato acompanhou o espírito dos mais diversos tempos com construções inéditas pensadas por diferentes diretores criativos. Em 1995, Tom Ford deu à silhueta ares sexy ao envernizar o couro do mocassim e banhá-lo em um tom vermelho vibrante. Na sua coleção de outono/inverno 2015, Alessandro Michele experimentou arrancar o calcanhar do loafer e transformá-lo numa espécie de mule com pelo de cordeiro no interior. Já Sabato de Sarno, o mais novo diretor criativo da grife italiana, trouxe para a passarela uma versão plataforma da silhueta durante sua coleção de estreia de primavera/verão 2024. E, para celebrar os 70 anos do sapato, o designer desenvolveu uma coleção-cápsula estrelada pelo ator Paul Mescal e pelo embaixador global da etiqueta, Xiao Zhan.

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Além dos tratamentos técnicos, o mocassim Horsebit também foi recontextualizado na maneira como era integrado ao visual. Ele já foi combinado a calças chino por universitários da Ivy League, usado pelo diretor de cinema Francis Ford Coppola, com jaqueta militar, e fez parte do uniforme clássico de executivos de Wall Street de ternos afiados. 

Atualmente, não é raro encontrá-lo em produções mais descomplicadas ao lado de calças jeans baggy, saias midi e blazers de couro. Até em fantasia de Halloween, ele já esteve presente, como no caso da produção da atriz Zoë Kravitz para uma festa típica da celebração, em 2018, onde a cantora combinou o modelo Princetown com pijama e roupão. Nos tapetes vermelhos das maiores premiações do mundo, a presença do loafer Horsebit é tão certa quanto a das celebridades. Harry Styles e Donald Glover, por exemplo, são grandes adeptos da silhueta para essa ocasião. 

Seja em seu mais puro estado, aquele sóbrio de elegância despreocupada, seja remixado com uma pegada mais experimental, o mocassim Horsebit representa o equilíbrio perfeito entre a união da mão de obra italiana, o estilo de vida ao ar livre estadunidense e o hipismo britânico. Elemento de status até hoje, ele pode ser colocado na prateleira das peças mais icônicas da história da moda. Não à toa, faz parte da coleção permanente do Metropolitan Museum of Art de Nova York, o MET, desde 1985. Seu significado vai além de um item que simbolizou a mudança de cenários culturais ao longo dos anos. Ele carrega tudo aquilo que uma marca de moda tem de mais precioso: sua herança.