No filme cult do momento Rivais (2024), dirigido por Luca Guadagnino, dois jovens jogadores de tênis se apaixonam pela mesma garota, Tashi, protagonizada por Zendaya. A tensão sexual formada pelo triângulo amoroso prende os olhos dos espectadores, mas outros detalhes também chamam a atenção no longa: a visibilidade de algumas marcas.
Um dos responsáveis pelo feito inusitado no cinema – que não se trata de uma publicidade escancarada – foi Jonathan Anderson. O diretor criativo da Loewe e da JW Anderson, responsável pelo figurino, justificou a escolha ao dizer que, se no mundo real os logos aparecem por todos os lados, não havia motivo para escondê-los no filme – ainda mais em um universo esportivo, tradicionalmente forrado por patrocinadores.
Cenas do filme Rivais, em que tênis, moda e romance se misturam.
Daí que rolam takes generosos dos atores em uma festa da Adidas, usando um conjuntinho Uniqlo e bebendo Gatorade. Na fase adulta do trio, quando enfim surge um casal desse arranjo (prometemos não contribuir com spoilers), ela veste Chanel, ele usa On.
A opção pela última label mencionada acima pode parecer nichada, mas é a mais verossímil. A On é uma marca suíça, há 14 anos no mercado. Lançada pelos amigos David Allemann, Olivier Bernhard e Caspar Coppetti, ela tem o tenista Roger Federer como sócio desde 2019. Com roupas, sneakers e acessórios esportivos, a etiqueta nasceu focada em corrida, mas ganhou fãs de outras modalidades – incluindo até a da moda.
O contexto de mundo também colaborou aqui. Athleisurewear, peças de alta-performance ou roupas focadas em desempenho, não importa o nome. O fato é que o mercado do vestuário esportivo com tecnologia agregada tem crescido há uma década. No entanto, foi durante a pandemia de covid-19, com gente cada vez mais valorizando o conforto e praticando esportes ao ar livre, como a corrida, que rolou o grande boom.
Entre os furacões de microtendências das redes sociais, uma delas se destacou naquele período: o gorpcore, consagrando peças de roupas que valorizam o utilitarismo, em especial elementos de montanhismo. Blusas de fleece com isolamento térmico e doudones superprotetores de marcas especializadas no segmento, como a The North Face e a Patagonia, foram parar nos carrinhos de compras virtuais de gente que nunca pensou ou praticou tais atividades.
Designers e grandes marcas de moda sacaram o sentido dos ventos e desenvolveram produtos similares ou firmaram parcerias. No resort 2025 da Balenciaga, desfilado em Xangai, China, o diretor de criação Demna revelou uma dobradinha com a Under Armour. E tem as collabs de longa data: Stella McCartney com Adidas, Victoria Beckham com Reebok e, no Brasil, Alexandre Herchcovitch com Olympikus.
Não se trata de uma aposta às cegas. Segundo o Grand View Research, o mercado de moda athleisure deve alcançar 660 bilhões de dólares até 2030. O que não quer dizer que é fácil conquistar o pódium desse nicho.
Por isso, vale analisar a estratégia de crescimento constante e firme da On. Para chegar aos esportistas, se garantiu na tecnologia, a exemplo da sola de amortecimento CloudTec. Os amantes da moda, por sua vez, foram impactados quando a etiqueta lançou, em 2022, uma coleção cápsula com a nada óbvia Loewe. Desde então, foram cinco parcerias com a grife espanhola.
A piada interna é de que a marca alcança a “high performance” e o “high fashion”. Em 2023, a atleta olímpica queniana Hellen Obiri venceu a maratona de Boston com um tênis On. Em junho deste ano, a etiqueta anunciou uma colaboração com a grife sul-coreana PAF e a it-girl das it-girl, Zendaya, como sua mais nova embaixadora. Para Martin Hoffmann, copresidente-executivo e diretor financeiro da marca, bastam dois anos para as vendas chegarem a 4 bilhões de dólares.
No geral, quem já tinha relevância no mercado foi o primeiro na fila de consumidores endinheirados, com desejo de associar seu jeito de vestir com bem-estar. A canadense Lululemon, lançada há 26 anos, viu os preços de suas ações atingirem o maior valor de sua história aos três meses de quarentena, enquanto o resto da indústria quebrava.
Grifes mais novas, como a estadunidense Vuori, lançada em 2014, pegaram carona na subida. Fundada por Joe Kudla e com um nome que significa “montanha” em finlandês, o negócio opera mais de 50 lojas nos EUA. Em comum, as duas casas não são baratas e, ainda assim, têm itens que somem rápido das prateleiras.
Zendaya, a nova embaixadora da On, e a parceria entre Loewe e On. Divulgação
O marketing da performance
Quem entra no jogo agora, precisa expandir o negócio com novos conceitos para não cair na mesmice. A Girlfriend Collective, de Washington, nos EUA, reforça sua preocupação com a sustentabilidade e com uma grade que vai do XXS ao 6XL. Já a californiana Alo Yoga conta com a divulgação pesada de influenciadoras, com o termo wellness sempre na ponta da língua.
Acontece que o cliente quer mais do que um estilo novo. Ele tem interesse em todo um lifestyle, pautado por uma relação melhor consigo mesmo e com o mundo. Essa virada de vida, inclusive, foi o ponto de partida para o desenvolvimento da etiqueta-irmã da Pace, queridinha do streetwear brasileiro, criada pelo casal Felipe e Juliana Matayoshi. A DT2 nasceu da necessidade da dupla em associar os treinos à sua vida e às suas preferências estéticas.
Segundo o duo, o segredo da construção da neomarca é entender que, mais do que uma rede de clientes, ela deve fomentar uma comunidade de interessados. “Não importa se você é do boxe, ioga, corrida ou crossfit, a ideia é reunir pessoas que gostam de moda e de praticar exercício”, explicam. Uma das iniciativas da casa é promover encontros de corrida.
Lookbook da DT2, marca mais nova da Pace. Divulgação
De acordo com um relatório de 2024 da McKinsey & Co., a América Latina registrou, no ano passado, o maior crescimento do mundo no setor esportivo: 22%. É por isso que Paula Kim, designer formada pela Saint Martins com experiências na Dior e na Tommy Hilfiger, decidiu investir na grife própria, a Lapô Sports. O negócio, no entanto, é desenvolvido em cima de interesses reais de mudança, como o uso de fibras recicladas e biodegradáveis em roupas de treino com um design interessante o suficiente para caminhar tranquilamente em outras esferas da vida.
Trata-se de uma moda realmente ativa, que não só vem para gerar mais movimento entre quem a usa, mas avança com os novos desafios que aparecem. E uma coisa é certa: as Olimpíadas 2024, em Paris, devem não só dar mais fôlego a essa estética, como aumentar a competitividade nesse negócio, em frequente expansão.