Como não errar no preparo do bacalhau
O maior expert no assunto, o chef português Vitor Sobral, dá dicas preciosas e ensina como fazer a tradicional receita de bacalhau com natas para sua Páscoa.
Quando se trata de bacalhau, todos os portugueses se consideram mais ou menos especialistas no assunto. Mas até mesmo lá, em Portugal, ninguém discute que o chef Vitor Sobral é uma das maiores autoridades no preparo desse pescado. Proprietário de um grupo que reúne restaurantes em sua terra natal e no Brasil, entre eles, a Tasca da Esquina, com unidades em Lisboa e em São Paulo, Sobral é autor do livro As minhas receitas de bacalhau (Senac), uma verdadeira enciclopédia que pesa mais de 2,6 kg e reúne nada menos do que 500 receitas.
Acostumado a ter um pé aqui e outro na terrinha, o chef conhece bem os nossos hábitos e não economiza na crítica: “Vejo brasileiros cometendo crimes no preparo do bacalhau”, dispara. Um dos mais graves, na opinião dele, é remover espinhas e pele antes do cozimento. Quer saber por quê? Confira as dicas preciosas do chef e a receita de um dos pratos mais apetitosos da Tasca da Esquina – o bacalhau com natas, uma delícia com vocação para comida de festa, que parece ter nascido para ser a estrela do almoço de Páscoa.
Como escolher o bacalhau?
O bacalhau sempre vem das águas geladas do norte dos oceanos Atlântico e Pacífico. Pela legislação brasileira, só três espécies de peixes podem ser comercializadas como bacalhau: o Gadus morhua, pescado no Mar da Noruega; o Gadus macrocephalus, do Pacífico Norte; e o Gadus ogac, do Mar da Groenlândia, que sequer chega ao mercado nacional. A expressão “bacalhau do Porto” ficou conhecida porque, no passado, todos os lotes que chegavam ao país saíam da cidade portuguesa. Para evitar confusão, melhor atentar para a espécie do peixe – os comerciantes são obrigados a dar essa informação.
– O Gadus morhua é o mais nobre. Rende um corte alto e bem claro, de coloração palha, conhecido como lombo de bacalhau, que forma lascas bonitas depois do cozimento. O Gadus macrocephalus, também conhecido como bacalhau do Pacífico, é parecido, mas em tamanho menor.
– A Noruega exporta para o Brasil outros peixes salgados e secos. Beneficiados a partir da mesma técnica, rendem produtos distintos que custam até 50% menos: o Ling, mais estreito e de carne branca; o Saithe, mais escuro, cuja carne desfia com facilidade; e o Zarbo, o menor de todos, bom também para desfiar. O sabor, diz Sobral, é o mesmo. “A diferença é só uma questão de textura”, ele garante.
– Escolha o corte em função da receita que pretende preparar. É desperdício, por exemplo, investir um dinheirão em um corte de bacalhau Gadus morhua para fazer bolinho ou bacalhau à Brás, que vai ao prato bem desfiadinho. Se a intenção é servir uma posta alta, inteira, ou até um prato de lascas bem definidas, não tem jeito – só o bacalhau verdadeiro salva.
– Antes de escolher o bacalhau já dessalgado pela praticidade, faça as contas e compare os preços. “Se você dessalga em casa, o aproveitamento é maior, já que o peixe ‘cresce’ até 40% ao ser demolhado”, ensina Vitor Sobral.
Como dessalgar o bacalhau?
– Esqueça a ideia de usar leite, muito difundida na internet. “O certo é usar água gelada, a menos de 8ºC”, crava o chef. Depois de lavar a peça em água corrente para remover o excesso de sal, coloque-a dentro de um recipiente com água e mantenha na geladeira.
– Não remova pele nem espinhas nessa etapa. “O bacalhau é um peixe quase sem gordura. Nas águas geladas, é o colágeno, concentrado na pele e nas espinhas, que fornece calor. Quando você os remove antes do cozimento, o sabor vai embora e ficam só as fibras”, diz o chef.
– Importante: a pele é impermeável e, por isso, deve ficar voltada para cima enquanto o peixe é dessalgado. Se ficar por baixo, ela impede que o sal se solte do bacalhau e vá para o fundo do recipiente.
– Não adianta ter pressa. Em seu livro, Sobral ensina que a dessalga leva de 24 a 48 horas, dependendo do tamanho da peça. Ele não recomenda os truques que prometem acelerar o processo, como ferver a água ou acrescentar farinha de mandioca à água. “Quando você apressa a demolha, quebra as fibras do peixe e perde toda a textura.”
Como armazenar o bacalhau?
– Nossos avós costumavam manter as peças de bacalhau penduradas na cozinha, uma prática que caiu em desuso. Mesmo que ainda esteja seco e salgado, guarde o peixe na geladeira – e pincele azeite para evitar que resseque.
– Depois de dessalgado, o bacalhau pode ser congelado. Antes, nem pensar.
Receita de bacalhau com natas
Foto: Divulgação
Rendimento: 4 porções
Tempo de preparo: 1 hora
Ingredientes
1 kg de lombo de bacalhau dessalgado
Azeite o quanto baste para assar o bacalhau
90 g de manteiga
90 g de farinha de trigo
1 litro de creme de leite fresco
Sal a gosto
2 folhas de louro
Noz-moscada ralada a gosto
200 g de cebolas laminadas
Azeite para refogar
Óleo para fritar
300 g de batata asterix descascadas, cortadas em rodelas de 1 cm de espessura
100 g de queijo meia-cura ralado
Salsinha picada a gosto
Modo de fazer
1. Em uma assadeira, coloque bacalhau dessalgado, regue com um pouco de azeite, cubra com papel-alumínio e leve ao forno a 180ºC, por 10 minutos. Separe em lascas e reserve.
2. Em uma panela, derreta a manteiga e acrescente a farinha de trigo aos poucos, mexendo sem parar até obter um creme levemente dourado.
3. Adicione o creme de leite aos poucos, mexendo sempre até obter um creme liso e homogêneo. Tempere com sal, louro e noz-moscada ralada e reserve.
4. Refogue a cebola laminada em azeite até caramelizar. Reserve.
5. Aqueça o óleo e frite as batatas até que estejam crocantes por fora e macias por dentro. Reserve.
6. Em um refratário, disponha as batatas no fundo, coloque as lascas de bacalhau por cima e, em seguida, as cebolas douradas. Cubra com o creme de natas, salpique o queijo e a salsinha e leve ao forno preaquecido a 180°C, por 25 minutos.
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