No dia de sua despedida

Uma carta aos fãs de Alber Elbaz





Simpatia é mais rara na moda do que uma silhueta realmente nova. Há outras virtudes, sem dúvida, mas de cada uma delas emanam coisas diferentes. Até os defeitos graves podem dar em boas criações, e de fato dão. Mas simpatia é algo bem específico pra alguém que desenha roupas.

Alber Elbaz foi um designer simpático, o que, quero convencer vocês, não é pouco. De fã para fã. Divertido mas não sempre engraçado. Um sorriso nem sempre tão aberto, um detalhe, uma observação, mas não a piada inteira, pronta. Um talento para essa presença que alivia as tensões do ambiente. Uma praticidade de viver sem os clichês da praticidade. Um simpático prático que gostava de charme, a simpatia da graça.

Eu fiquei gostando dele na época da Lanvin, como a maioria, antes não acompanhava tanto. Acho que foi ali que ele tomou conta da coisa que queria fazer, que se descobriu de um jeito mais evidente. Na moda, se ligar a um acervo de uma casa que outra pessoa criou pode revelar um estilo próprio, tudo questão de perspectiva, é a nova perspectiva que às vezes dá àquela casa seu melhor. Uma liga através do tempo, que dá certo só de vez em quando, depende de um match especial, de um encontro improvável de ideias separadas por décadas e mais décadas. Madame Lanvin, se é que os mortos podem escolher seus visitantes, aposto gostaria de agradecer e comentar.

Aqueles rosa-choque, vermelhos, laranjas com volume. Aliás os volumes. Não super, não extra, não dramáticos. Volumes simpáticos. Simpatia com a mulher que os veste, simpatia da inteligência de olhar o outro. Uma gola, uma manga, uma fofura ali, uma ousadia aqui. Nada bobo, tudo vivo, às vezes um monte de tecido voando, se mexendo. Às vezes uma modelo vinha andando e a gente olhando, do nada, sorria.

Em 2012, Alber fez 10 anos de Lanvin. Paris, semana de moda, aquele esquema. Mal cheguei e tinha doce, bolo pra comer. Subi pro meu lugar lambendo um treco delicioso dos dedos e do outro lado da passarela vi a Tilda Swinton. Fiquei com um pouco de vergonha, mas, enfim, a famosa era ela, que não podia comer porque estava sendo megafotografada. Tenho certeza que ela ia curtir o docinho, os franceses sabem botar a mão num açúcar. E combinava tanto ali aquela coisa de aniversário que a gente vai, se diverte, ri, come, se lambuza. Coisa de anfitrião simpático.

Agora caiu um cisco aqui. Um palco com uma aura vermelha, lustre no centro. O senhorito Alber Elbaz, dono da noite, sobe e faz um discurso curto, fofo, simpático. E canta: “que será será, whatever will be will be”. No dia, bêbados de chantilly, chocolate e outras delícias, cantamos com ele.

O que será foi essa partida tão dessemelhante de sua elegância, tragado por uma doença brutal, essa mesma que no Brasil do caos tem sido cultivada com determinação por quem à vida é incapaz de oferecer um sorriso.

A Alber, com carinho, a nossa saudade.

Salve, simpatia ❤️

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