Donas de lojas virtuais dão dicas para criar a própria marca

Da criação dos produtos até a postagem dos pedidos no correio, são elas que cuidam de tudo. Três empreendedoras mostram como é possível ter um negócio de qualidade sem um enorme investimento inicial.


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Brinco da Zizi Glow



Criatividade, boa vontade e confiar nos próprios instintos são algumas das dicas primordiais para criar uma marca própria e montar uma loja virtual. Quem acha que é preciso fazer um investimento financeiro muito alto ou esperar para ter uma superequipe pode nunca encontrar o momento ideal para embarcar nessa aventura.

Criações despretensiosas, que inicialmente ficavam restritas às pessoas mais próximas, podem se tornar um negócio com alcance nacional a partir de uma divulgação caprichada no Instagram. É o caso da jornalista Luana Maitelli, 28 anos, que criou uma marca de acessórios artesanais com pegada hi-lo, depois de muitas amigas pedirem para comprar as peças que ela desenvolvia para si.

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“Gosto muito da mistura de pérola de água doce, que é mais nobre, com elementos mais lúdicos. Como lá em 2018 só lojas estrangeiras faziam isso e eu não tinha acesso, comecei a desmontar meu acervo e criar peças assim para que eu mesma pudesse usar”, relembra a criadora da Lulux. No início, tudo era feito apenas sob encomenda “na base da pressão”, como ela mesma gosta de dizer. Quando as amigas começaram a compartilhar seu trabalho nas redes sociais, Luana viu cada vez mais pessoas interessadas nos seus produtos e percebeu que era a hora de transformar o passatempo em um negócio de verdade.

Já a especialista em visual merchandising Isabela Paro, 30 anos, decidiu se jogar na criação de acessórios como uma forma de abstrair do trabalho em uma marca de calçados, que andava pouco estimulante. “Comecei a fazer presilhas de miçangas mais como uma brincadeira”, relembra. Foi assistindo tutoriais no YouTube e pegando dicas com a mãe de um amigo que ela aprendeu a fazer o ponto e produziu as suas primeiras 40 peças. “Levei para o escritório e vendi tudo no mesmo dia”.

O sucesso imediato desses itens estimulou Isabela a desenvolver novos produtos e assim nasceu a Zizi Glow, especializada em acessórios de acrílico transparente. Mas foi só com a aproximação do Carnaval que ela realmente viu a força do seu negócio. “Tive uma demanda absurda, tanto que falei para o meu namorado ‘vou te ensinar a fazer’ e coloquei ele para me ajudar.” De lá para cá, a empresa em que Isabela trabalhava teve cortes por causa da pandemia e, com a demissão, ela pode colocar foco total na sua loja própria.

 

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Uma publicação compartilhada por ZIZI GLOW | Acessório (@_ziziglow) em 8 de Jun, 2020 às 4:43 PDT

 

A pesquisadora de tendências Loo Nascimento, 33 anos, começou a empreender em 2011 vendendo camisetas atreladas ao seu blog Dresscoração, em que compartilhava referências ligadas ao empoderamento negro. “Sempre fiz um trabalho de militância estética, tanto no conteúdo, quanto nos meus produtos”, diz após comentar que, naquela época, não havia tanta ativação de pessoas negras que expressassem a sua africanidade na forma de se vestir, como já acontecia nos EUA, por exemplo.

“Logo comecei a garimpar tecidos no Brasil inteiro que tivessem uma estética herdada da África. Em qualquer lugar que eu fosse, estava pronta para comprar tecido”, comenta Loo. Assim, a Dresscoração foi ganhando peças baseadas na amarração, um estilo também muito característico no continente africano, e o conteúdo passou a ser um complemento às vendas e não o contrário.

No ano passado, ela fez uma pausa para repensar o seu negócio e passou a estudar bastante sobre joias de crioula, peças usadas pelas mulheres negras no período colonial. Foi desenvolvendo acessórios inspirados nelas que Loo decidiu criar também a Iloostre. “Sou virginiana, gosto de cada coisa no seu quadrado [risos]. Até porque, mais para a frente, conseguirei fazer colaborações que tenham mais a ver com uma marca do que com a outra.”

Pe\u00e7as da Dresscora\u00e7\u00e3o e Iloostre

Peças da Dresscoração e IloostreFoto: Juh Almeida

Com suas narrativas singulares e formações distintas, Luana, Isabela e Loo têm em comum o fato de serem responsáveis pela maior parte das atividades internas dos seus negócios. Além de fundadoras, as três são responsáveis por tudo, do desenvolvimento de produtos à postagem das encomendas nos correios, passando pela divulgação e interação com os clientes, entre outras coisas. Abaixo, elas compartilham dicas valiosas para quem quer seguir um caminho parecido e criar a sua própria marca do zero com foco em vendas digitais.

ESCOLHA UMA NARRATIVA

“Não copie os outros. Olhe para você, para as suas referências e tente ser original”, destaca Luana. Para a dona da Lulux, acreditar no seu ‘feeling’ é fundamental. “Confie no que você acredita e não tente fazer algo só porque está todo mundo fazendo ou porque recebeu um elogio”.

Isso contribui para a sua marca ganhar autoridade, acrescenta Isabela. “Assim, o cliente consegue entender o que procurar na sua loja e para quem indicá-la”. Além disso, entender o que torna os seus produtos únicos ainda facilita muito o trabalho. “Quem cria tem milhões de ideias. Estabelecendo um nicho, você tira várias dúvidas da sua cabeça”. Foi por isso que ela decidiu focar no acrílico transparente como matéria-prima principal da Zizi Glow. “No começo, tentei fazer de tudo e fiquei meio louca”, confessa.

CRIE UMA IDENTIDADE VISUAL

Para Loo, também é essencial estabelecer uma identidade visual logo no começo. “O apelo estético conta muito porque estamos em uma era visual”. Logomarca, paleta de cores, linguagem nas redes sociais e embalagem são alguns dos elementos que fazem parte disso — e, claro, tudo isso ajuda a criar a narrativa que comentamos acima.

Essa é uma das partes mais importantes para pedir ajuda caso não seja a sua área, já que ela vai influenciar diretamente na forma como enxergam a sua marca. “Eu sou uma negação em design, então liguei para a minha amiga Carol Kazumi e ela me ajudou a desenvolver toda essa parte”, comenta Luana após desabafar que, antes disso, muita gente ainda via a Lulux como uma “marquinha de Instagram”.

CAPRICHE NO INSTAGRAM

Apesar da conotação pejorativa da expressão acima, as redes sociais são essenciais no fortalecimento de qualquer loja, principalmente as virtuais. Por ser muito imagético e seguir em alta há bastante tempo, o Instagram é a aposta certeira. “Fiquei uma semana sem postar nada e tive uma baixa significativa nas vendas”, diz Isabela. Ela indica que o ideal é postar Stories todos os dias e ter consistência nas postagens no feed.

“Sempre falo que, sem o Instagram, a Dresscoração não chegaria onde chegou”, acrescenta Loo, que diz ser “a louca do feed”. “Nem é preciso abrir a foto para ver o produto. É só ir descendo a tela que está tudo em harmonia”, comemora. A dica para deixar o perfil mais atrativo é criar blocos de imagens que tenham uma unidade, como uma paleta de cor específica ou uma estampa em comum.

 

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Uma publicação compartilhada por (@iloostre) em 27 de Jul, 2020 às 8:28 PDT

 

Também é legal intercalar imagens de produto com uma espécie de moodboard. Luana costuma pedir autorização para compartilhar fotos das clientes usando suas criações, além de fazer uma curadoria de artistas que conversem com o universo da sua marca. “É muito importante creditar todas as fotos e não ferir nenhum direito autoral”, enfatiza.

TER UM SITE FAZ TODA A DIFERENÇA

Quando se é responsável por quase tudo no seu negócio, ter um e-commerce ajuda a economizar boa parte do seu tempo, já que as informações cruciais estão lá: coleção, disponibilidade, preço… “Até podem mandar mensagem para tirar uma dúvida ou outra, mas normalmente você só precisa lidar com a decisão final da pessoa”, explica Loo.

Além disso, as vendas por direct podem fazer você perder aquela compra espontânea, feita no calor da emoção de quem se apaixona por uma peça à primeira vista, como alerta Isabela. “Falo isso como empreendedora e como cliente. Já desisti muitas vezes de comprar porque a pessoa só me respondeu no dia seguinte.”

Existem plataformas gratuitas que valem a pena experimentar quando se está começando, mas para um negócio mais profissional o ideal é pesquisar bastante as possibilidades e entender o que funciona melhor para você. “Se você tem condição de pagar alguém para configurar o seu site é melhor, até mesmo para aumentar a sua aparição nos mecanismos de pesquisa”, sugere Isa.

O que não significa que é preciso desistir de tudo caso você não possa fazer esse investimento tão cedo. Luana, por exemplo, se cadastrou em várias plataformas de e-commerce e passou três meses estudando cada uma até encontrar a que fosse perfeita para as suas necessidades.

APROXIME-SE DO SEU PÚBLICO

Enquanto o site não ficava pronto, a dona da Lulux foi atendendo clientes por demanda no Instagram, o que acabou sendo bom para que ela entendesse melhor quem são elas. “Mas é melhor ainda não passar por isso. O site tira a parte mais trabalhosa e aí fica só a parte legal que é o contato via feedback.”

Além da troca de mensagens, que já até contribuiu para a criação de peças muito solicitadas, Luana gosta de fuçar o perfil de quem interage com a marca e até passa a seguir alguns. “Assim eu tenho acesso ao universo imagético da pessoa. Consigo ver porque ela está no Instagram, como ela é, os lugares que frequenta…”

Essa aproximação com o público também é importante para criar fidelidade. Durante a criação da Iloostre, Loo chegou a pausar a Dresscoração por um ano. “Uma marca que não tem relação com seus clientes não consegue se reconectar com eles como eu fiz. Meu produto não é só para cobrir o corpo, existe uma narrativa a mais”, justifica.

CRIE ESTRATÉGIAS DE DIVULGAÇÃO

Não existe um modelo único de divulgação que funcione para todas as marcas, produtos e clientes. Caprichar nos pontos acima facilita a entender a melhor forma de fazer o seu negócio alcançar mais pessoas. No caso da Zizi Glow, Isabela decidiu apostar no envio de produtos para influenciadores para chamar mais atenção para a marca.

“Fiz uma lista de pessoas, analisei o perfil de cada uma para entender se usariam as minhas criações e foquei muito no Rio de Janeiro porque peças bem coloridas, como as minhas, fazem sucesso por lá pelo clima de Carnaval o ano inteiro”, conta. Ter esse cuidado em vez de sair enviando peças para um monte de gente com base apenas no número de seguidores é fundamental — não só para que o influenciador realmente use os presentes, como para atingir um perfil de seguidores que conversem de verdade com o que você tem a oferecer.

Já Luana, que teve a vantagem de conseguir esse tipo de alcance logo no início com amigas conhecidas, tem medo de fazer muitos ‘seedings’ (como essa prática é conhecida) e não dar conta da demanda. “Já aconteceu de influenciadoras comprarem na minha loja e eu mandar um brinde para não perder a oportunidade, mas ainda não tenho estrutura para vender de qualquer jeito, então tomo cuidado”.

Sua maior preocupação, aliás, é dar conta de manter a qualidade do seu produto e serviço sem deixar ninguém na mão. Ela usou isso como estratégia de marketing no lançamento do seu site. “Fomos a primeira marca a ter acessórios com Smiley no Brasil em um momento que esse ícone voltou a ser febre”, diz. Quando a linha esgotou, Luana passou três meses sem a matéria-prima principal para fazer novas peças e recebia muitas mensagens de pessoas pedindo para serem avisadas da reposição.

 

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Uma publicação compartilhada por cOoL sTuF aNd jUnKie pEaRlS (@luluxstudio) em 13 de Mar, 2020 às 1:03 PDT

 

Nesse período, ela foi sinalizando como “importante” todos as mensagens diretas que recebia sobre o assunto no Instagram e, antes de lançar o site oficialmente, liberou o acesso com senha para as interessadas na carinha sorridente terem prioridade nas vendas. “Eram meninas que perguntavam sempre, então foi muito legal. Todo mundo se sentiu muito especial com a entrada em primeira mão e acabei vendendo várias coisas de outras coleções também.”

A EMBALAGEM MUDA TUDO

Outro cuidado muito valorizado é a forma de se embrulhar os pedidos. “Acho que uma boa embalagem deixa tudo mais rico e garante uma boa experiência por completo”, comenta a Luana. Seu sonho é conseguir criar algo fofo e reutilizável onde a pessoa possa manter seus acessórios em segurança.

“Queria uma embalagem de bolha colorida com um botão, mas ia aumentar muito o preço do meu produto e não fazia sentido.” Essa consciência do valor final, aliás, também é essencial. É preciso refletir bem para entender no que vale investir e onde é melhor economizar. No lugar do sonhado botão, os produtos da Lulux vêm com um adesivo como lacre, o que não impede que a proteção seja reutilizada, só não dá para ficar abrindo e fechando.

Loo, por sua vez, envia suas roupas dentro de um saquinho de algodão. “Dá para guardar outras coisas nele depois. Isso faz que o cliente e as pessoas com quem ele convive olhem para a sua embalagem constantemente, ajudando a prolongar o alcance da sua marca”. Antigamente, a dona da Dresscoração e da Iloostre costumava usar saquinhos furadinhos de feira para embalar seus produtos, o que era mais econômico, mas, ainda assim, enriquecia a experiência de compra.

CUIDE DO SEU ESTOQUE

Nunca disponibilize para venda aquilo que você não terá como entregar. Nada frustra mais um cliente do que ficar feliz com uma compra e depois receber um e-mail dizendo que ela foi cancelada. Lembre-se de criar uma estratégia de controle para estar sempre por dentro da disponibilidade do seu estoque.

É claro que dá para ir repondo as peças de maior sucesso com o tempo, mas o ideal é só divulgar um lançamento quando tiver reunido uma quantidade de itens que faça sentido com a sua média de vendas. “Alguns dos meus produtos são personalizados com palavras ou frases que a pessoa escolhe, esses são os únicos que produzo com base na demanda”, conta Luana.

“Tem que ter um espaço físico exclusivo da empresa para armazenar as coisas e deixar tudo sempre à mão e o mais organizado possível”, acrescenta Loo. As três fazem isso em um cômodo de suas casas, mas ressaltam a importância dessa separação de ambientes para ficar claro o que são seus objetos pessoais e o que é trabalho.

COMO FAZER A POSTAGEM NOS CORREIOS

Por último, mas também extremamente revelante, está o envio dos produtos. Isabela explica que algumas plataformas de e-commerce incluem serviços de entrega com frete mais barato, o que contribui para aumentar as vendas. “Você paga a taxa online, imprime a etiqueta com todas as informações e vai a uma agência dos Correios só para postar a encomenda, já que eles costumam ter parceria.” Lembre-se disso ao escolher onde hospedar o seu site.

E não precisa se desesperar a cada pedido recebido. O ideal é já incluir no planejamento da sua rotina os dias da semana em que irá ao correio. Nas marcas da Loo, ela promete enviar os produtos até cinco dias após a confirmação do pagamento. “Eu posso ir amanhã ou no quarto dia. Assim eu consigo esperar juntar uma quantidade maior de pedidos para levar de uma vez só.”

SUGESTÕES DE PLATAFORMAS DE E-COMMERCE

 

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