Investigação mostra para onde vão roupas doadas a programas de reaproveitamento de redes de varejo

Programas de retorno prometem que roupas doadas e sem vida útil sejam recicladas ou reutilizadas. Mas investigação da Changing Markets mostra que muitas acabam em lixões.


Investigação descobre para onde vão roupas doadas à programas de retorno e reaproveitamento de redes de varejo e fast fashion como C&A, Primark e H&M
Cemitério de roupas usadas no Atacama. Foto: Getty Images



Programas de retorno – take-back, em inglês – são estratégias utilizadas por algumas redes de departamento no exterior, como C&A, Primark e H&M, para reduzir o desperdício de roupas ou dar um fim responsável à matéria-prima utilizada. Mas o sistema é falho e não funciona como divulgado, aponta investigação realizada pela organização Changing Markets.

A proposta da ação é que o cliente devolva peças não mais utilizadas para que elas possam ser revendidas, reaproveitadas em upcycling ou transformadas em panos de limpeza. Caso nenhuma dessas opções seja possível, elas então são trituradas e usadas no isolamento de paredes. 

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No entanto, esse não parece ser realmente o destino das roupas doadas. De acordo com a investigação, uma grande parte dos itens é despejada em aterros e lixões, sem ocorrer nenhum tipo de reaproveitamento prévio. 

Para o estudo, a organização cedeu 21 peças de brechó a diferentes programas de retorno e rastreou seus percursos ao longo de um ano por meio de um sistema de bluetooth. Do total, apenas cinco roupas foram revendidas. O restante foi destruído, reciclado para um material de menor qualidade, guardado em armazéns ou enviado para mercados de segunda mão em países da África. O continente recebe uma quantidade exacerbada de roupa.

“Marcas apontam esses esquemas de retorno como parte da solução. Eles passam a ilusão de que existe algo bastante útil para se fazer com a roupa após o fim de seu uso, mas, na maioria dos casos, isso simplesmente não acontece”, disse George Harding-Rolls, gerente da campanha da Changing Markets, ao site The Business of Fashion.

Uma saia verde levada por George ao take-back de uma loja da H&M, em Londres, acabou despejada nos arredores da cidade de Bamako, em Mali, depois de passar alguns meses viajando entre depósitos na Inglaterra e nos Emirados Árabes Unidos. 

No final da investigação, um moletom cinza dado à Primark foi encontrado em um terreno vazio na Polônia e uma calça esportiva devolvida à C&A, na Alemanha, foi localizada em um estabelecimento próximo que utiliza tecidos como combustível para fornos de cimento. 

Algumas marcas contestaram os resultados da investigação. A Primark, aliás, rebateu que o moletom doado pela Changing Markets, na verdade, teria ido para uma loja de revenda em Budapeste. A H&M reconheceu as limitações de seu programa e revelou que mudará  a partir de janeiro do próximo ano os parceiros envolvidos, como forma de fortalecer suas responsabilidades. 

Entre os principais desafios está a rastreabilidade – muitas empresas terceirizam o processo a partir do momento em que as roupas saem de suas lojas – e a triagem das peças doadas. A decisão do que deve ser revendido, reciclado ou reutilizado ainda é feita de forma manual. O assunto, por outro lado, é urgente: estima-se que cerca de 12 quilos de roupas são descartadas por pessoa anualmente somente na União Europeia.

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