Para Mateus Cardoso, a roupa vem antes de moda

Jovem estilista mineiro é um dos principais nomes nacionais a dar vida e cara nova à tradição da alfaiataria.


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CONTEÚDO APRESENTADO POR SOU DE ALGODÃO

Você já deve ter ouvido a história da pessoa que nasceu numa pequena cidade de interior, aprendeu a costurar com os avós, começou a fazer roupas para as bonecas, depois para os amigos da escola, para si próprio até que virou estilista. Pois bem, essa não é a história de Mateus Cardoso. Na verdade, sua trajetória não poderia ser mais diferente.

Nascido em Monte Belo, no sul de Minas Gerais, ele é o caçula de sete filhos de uma família de agricultores de café – e o único que não trabalha no ramo. Seu sonho era ser piloto de avião. Passou boa parte da adolescência estudando e se preparando para isso. “Não sei onde estava com a cabeça”, diz em uma conversa por Zoom. “Quer dizer, hoje, com terapia, eu sei sim”, continua.

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A ideia provavelmente tem a ver com independência, algo caro a Mateus e objetivo recorrente de suas lutas e conquistas. Foi em busca dela que saiu de casa, aos 16 anos, para estudar em Poços de Caldas, cidade vizinha a sua. Foi também por ela que desistiu do curso de graduação em Relações Internacionais, após apenas um semestre. “Não me via trabalhando com aquilo”, explica. É que trabalho, para ele, não faz sentido só por dinheiro. Precisa ter algo mais envolvido, uma satisfação, um encontro, uma paixão.

O problema era descobrir essa paixão – e como sobreviver dela. “Foi necessário algum tempo revivendo experiências de infância, recuperando memórias para encontrar o que realmente me interessava”, relembra. Na mesma época, conheceu um amigo que sugeriu um curso de moda. Mais especificamente, na Faculdade Santa Marcelina, em São Paulo.

“Foi um tiro no escuro, não conhecia nada sobre o assunto. Também não podia pedir para os meus pais, porque, certamente, eles não deixariam.” A solução foi se jogar por conta própria. Passou no vestibular, conseguiu uma bolsa e, em 2016, já estava morando na capital paulista, prestes a iniciar a graduação que mudaria a sua vida.

Mateus não tinha ideia do que aprenderia nas aulas. Diferente de seus colegas, não sabia nem desenhar. “Meus trabalhos do primeiro ano da faculdade eram horríveis, joguei tudo fora. Mas foram erros necessários, como não sabia nada, cheguei de cabeça aberta e pude absorver bem cada etapa do processo e, aos poucos, descobrir o que gostava.”

A confiança de que estava no caminho certo veio quando aprendeu a costurar. “Foi a primeira coisa que me despertou interesse”, confessa. Tanto que saiu à procura de cursos extracurriculares para fazer no tempo livre. Encontrou um de camisaria na Associação dos Alfaiates e tomou ainda mais gosto pelo processo de construção das peças. Logo em seguida, veio a paixão pela alfaiataria, porém um curso focado na técnica era caro demais e em horários incompatíveis com os seus.

“Decidi aprender por conta própria, quer dizer, do meu jeito. Saí batendo de porta em porta pelos poucos alfaiates que restam na cidade, perguntando se poderia passar algum tempo ali, acompanhar e ajudar no trabalho.” Ouviu mais não do que sim, até que um senhor de 92 anos se animou com a ideia. “Era uma alfaiataria bem tradicional, com tudo feito à mão. Foi onde aprendi a importância de um bom acabamento, da precisão no corte…”

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Mateus começou a gostar de roupa antes de gostar de moda, e isso é importante para entender seu trabalho. Sua paixão está na técnica, no material, na construção. Seus tecidos favoritos são aqueles mais rígidos, que permitem um maior controle na elaboração de formas e estruturas, como a lã e o algodão. Seu processo criativo não é pautado por temas ou inspirações pontuais. Tudo começa com uma peça, a qual deixa por alguns dias num busto e vai aos poucos burilando. Ou melhor, desconstruindo, alterando detalhes e proporções.

“A ideia sempre foi essa. Já na faculdade, eu pegava toda a tradição que aprendia no ateliê de alfaiataria e tentava desconstruir de várias maneiras. Percebi que o mesmo processo ou técnica de uma camisa podia ser aplicado numa calça ou alterar a estrutura de um blazer.” O resultado é uma das propostas de alfaiataria mais frescas e interessantes dos últimos tempos. A objetividade e foco com qual Mateus trabalha garantem a qualidade de um clássico, com o olhar fresco e atualizado de uma mente sempre em movimento.

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No fim de 2018, ainda na faculdade, ele se inscreveu no 1º Desafio Sou de Algodão, para concorrer ao prêmio de 30 mil reais e uma vaga no line-up da Casa de Criadores, evento do qual sempre sonhou participar (aliás, as inscrições para a segunda edição do concurso já estão abertas e vão até dia 15 de outubro. Para saber mais acesse: soudealgodao.com.br/desafio). O ano seguinte foi intenso, com TCC e o projeto para o concurso – “apresentei meu desfile uma semana antes de entregar minha monografia”, relembra. Mas valeu a pena. Mateus saiu vencedor.

No fim de 2019, adaptou seu desfile de formatura e o apresentou oficialmente como integrante da Casa de Criadores, colecionando apenas elogios e boas críticas. O que ele não estava preparado era para os pedidos de compra, sentia que não tinha estrutura para atendê-los. À época, recém-formado, o estilista não sabia que rumo seguir: investir na marca própria ou tentar algum emprego na área. A independência, de novo, falou mais alto.

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“Aqueles primeiros pedidos foram cruciais nessa decisão, estava tudo acontecendo,” fala ele. No início de 2020, Mateus já estava recebendo clientes em casa para pedidos sob-medida ou para apresentar alguma peça da coleção desfilada no ano anterior. “Mas o espaço era pequeno, pouco profissional, meu gato vivia pulando nas pessoas.” Foi atrás de um ambiente separado e encontrou uma sala na região, no tamanho e no preço que queria. Assinou o contrato de aluguel, pegou as chaves e o mundo parou.

Na mesma semana, começaram as quarentenas e lockdowns em combate à pandemia de Covid-19. Mateus ficou sem chão, sem saber o que fazer, sem dinheiro, com medo do vírus e de precisar voltar para a casa dos pais. Um mês depois, decidiu que não podia ficar inerte e decidiu agir. “Tinha um monte de peças em acervo, dos desfiles e do tempo de faculdade, e percebi que poderia vendê-las.”

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Em poucas semanas estava quase tudo esgotado. “Foi minha primeira experiência real com venda e o que ajudou a me manter pelos meses seguintes.” Na mesma época, chegaram os primeiros pedidos de peças sob-medida, hoje responsáveis pela maior parte da receita da marca. “O processo também foi um aprendizado, porque vestir modelos é fácil, pessoas normais, com medidas diferentes é mais complexo”, comenta. Ah, e algumas dessas pessoas são Duda Beat, Pabllo Vittar e Jão.

Ainda assim, a criação livre de compromissos comerciais ou sem briefing específico fez falta. “Gosto muito das duas partes, mas acho importante existir uma separação”, explica. É o trabalho por dinheiro versus aquele que te dá satisfação, reconhecimento e prazer, sem amarras, sem pedir nada em troca. De novo, tem a ver com paixão, liberdade e independência. E o resultado de tudo isso poderá ser visto, em breve, na próxima edição da Casa de Criadores.

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