Fez-se a luz! Conheça as sombras de Steven Klein
Livro documenta 30 anos da obra do fotógrafo americano que levou o underground à moda e revelou traços da pasteurização estética dessa indústria.
O mundo das imagens precisa de Steven Klein. Para continuar causando em um mercado dominado pelo mainstream, é preciso não apenas estômago, mas também noções de tempo, espaço, classe e passado. Por isso, talvez, ele seja referenciado como o fotógrafo que “transformou a imagem das celebridades”. Muito disso se deve ao fato de ele lidar com a pasteurização da indústria conservando a aura de lado B das fotos.
Reprodução do livro Steven Klein, lançado pela Phaidon Press.
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É aquele gosto dark, surgido no século passado na esteira do movimento anti-moda” e na contramão das imagens focadas apenas em agradar, sem nenhuma nuance de erros. A moda, sabemos, precisa de Steven Klein.Tanto que ele acaba de ganhar um livro inteiro, que comemora seus 30 anos de carreira imagética.
Lançado pela Phaidon Press, o calhamaço de 464 páginas leva seu nome e é a primeira monografia de suas três décadas dedicadas aos cliques. Fotos de Brad Pitt, Madonna, Lady Gaga, Kim Kardashian e outros nomes icônicos são chamarizes, principalmente para uma juventude acostumada à estética do Instagram. Por meio das fotos do fundador da Showstudio, ela terá nas mãos novas abordagens de seus ídolos, ou, para usar a expressão dos 1980, padrões alternativos de imagem.
Clipe de Alejandro, de Lady Gaga, dirigido por Steven Klein.
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O alternativo compreendia tudo o que era considerado erro, anti-establishment, anti-arrumado, anti-convencional. A imagem de moda naquela década era a de um tipo de sucesso e poder que se levava a sério. Nos 1990, o alternativo desponta como reação a isso. A ideia do anti-moda era chocar para não se enquadrar. Propositadamente. Klein se cria neste período estético de anti-heróis, como os garotos “losers” e irresponsáveis do filme Trainspotting. É uma era gestada nas chuvas de sangue dos filmes de Tarantino e nos looks zumbi das raves e na body art.
Klein toca na imagem das celebridades para nos orientar na procura por um gosto conceituado, embasado e original em registros que passariam batidos. Poderia ser apenas lindo e superficial, mas existe um caminho profundo por trás.
Ele cria um relacionamento, uma evocação artística mútua com os fotografados que, claro, querem embarcar em seus conceitos. Uma collab entre artistas. Como no ensaio de Madonna, capa da V Magazine, em 2021. A ideia inspiradora foi recriar a atmosfera do último ensaio fotográfico de Marylin Monroe antes de ela morrer, quando a atriz ficou três dias numa suíte de hotel com o fotógrafo Bert Stern.
Madonna em ensaio de Steven Klein para a V Magazine, de 2021.
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O encontro de Kim Kardashian e Steven Klein foi outra colaboração de sucesso. Ele, com seu olhar dark e irônico, fotografou, em 2017, a uber influencer vestida de Jackie Kennedy, causando turbulências de amor e ódio no público.
Vários personagens famosos que seriam inevitavelmente fotografados, passaram por suas lentes. Klein conseguiu desvirtuar o lugar desses ícones, retirá-los da monotonia glossy para lhes dar um apelo trash e hiperrealista. Brad Pitt de pernas abertas foi um escândalo. Natalia Vodianova, convertida em um animal cibernético, desafiou sua própria beleza. Posar para ele, ao que parece, era um escapismo de tudo.
CRIA E CRIATURA
A trajetória de Klein começou aos 13 anos, quando ele ganhou uma máquina fotográfica dos pais. Em entrevistas, contou que se sentia deslocado, que gostava de Picasso e Francis Bacon, enquanto seus colegas gastavam o tempo em outras atividades. Largou a pintura pela fotografia, e poderia neste ponto ter ido para uma linguagem mais simples.
Porém, rapidamente foi capturado pelo mundo na moda, em 1985, em uma campanha da Christian Dior. E, com a moda, chegaram cenário, produção, make e proximidade com as celebs –as portas de um mundo mais seguro que o underground.
Reprodução do livro Steven Klein, lançado pela Phaidon Press. Reprodução
Beirando os 60 anos, Klein se encaixa no século XXI e continua estrelando as imagens das labels, dos editoriais de moda editoria e dos retratos dos ícones contemporâneos. Seu lugar fica no meio termo entre a fotografia crua de Nan Goldin, a explosão de La Chapelle, a sexualidade de Guy Bourdin e o rigor de Helmut Newton.
Talvez não faça mais sentido pensar que ele é um “alternativo”, porque neste 2022, o que era maldito tornou-se habitual, o que nos choca não é mais a estética do hiperreal, nem mesmo a sexualidade. O que nos choca parece estar no morno de um normcore conservador, ou mesmo na paleta instagramável que esconde e confunde intenções. Por isso é tão necessário, nos dias de hoje, um pouco da provocação que um dia Klein nos presenteou.
Reprodução do livro Steven Klein, lançado pela Phaidon Press. Reprodução
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