Telfar encerra NYFW em clima de caos, gritaria e transformação. E foi ótimo!

A marca do estilista libério-americano apresenta duas coleções em palco estilo Polishop, além de um novo modelo de bolsa e uma nova forma de fazer e mostrar moda.


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Fotos: Getty Images



Quem viveu os anos 1980 e 1990 deve lembrar dos infomerciais da televisão, tipo Polishop, Medalhão Persa ou o estadunidense QVC. Alguns eram verdadeiros programas de TV, com apresentadores andando pelo palco e apresentando de um tudo: eletrodomésticos, mobiliário, roupas e joias. Pois bem, foi exatamente essa a inspiração para a mais recente apresentação da Telfar.

Com o mote “não é para você, é para todos”, o estilista libério-americano Telfar Clemens criou mais que um hype, uma marca forte o suficiente para dar o tom do encerramento da semana de moda de Nova York. Esse é, provavelmente, um daqueles desfiles-acontecimentos que seria importante estar lá para presenciar e entender toda a sua magnitude. Com duração de uma hora, os convidados assistiram a dois episódios da TelfarTV, um reality show/canal de varejo lançado pela etiqueta em setembro de 2021, no ar 24h por dia. Entre os apresentadores, o músico Ian Isiah, a artista Aya Brown e o poeta Fred Moten dividiam os microfones e até faziam o papel de vendedores. Tudo pelo show.

Circle Bag, Telfar.

A Circle Bag, Telfar.

Durante a performance, foram apresentadas duas coleções e uma bolsa nova, a Circle Bag. Hoje pela manhã, no Twitter, ao procurar por “Telfar”, os resultados eram, em sua grande maioria, pessoas felizes por ter adquirido o acessório ou tristes, pois o modelo esgotou em segundos. Vale lembrar que a marca fez história com sua Shopping Bag, também conhecida como “Bushwick Birkin”, em alusão ao bairro em que a marca foi criada. O motivo do sucesso foi a abordagem de um luxo mais acessível – a novidade custava 567 dólares, e a it-bag cerca de 200 –, que fez com que a label explodisse e conquistasse uma parcela da clientela que curte moda, mas que não consegue pagar milhares de dólares em uma peça nova. Trazer essas pessoas para a conversa faz toda a diferença.

Com a pandemia, reimagina a passarela, repensar o desfile se tornou assunto quente – urgente até. Mas na Telfar, nada disso é novidade. A marca já fez show no Irving Plaza, com direito a mosh do estilista na platéia, projeção de filmes e até mesas extensas de jantar em vez de passarela. Aproximar sua moda de algo que todo mundo já viu e viveu tira o estigma de exclusividade e segregação que, muitas vezes, as apresentações comuns carregam.

Shopping Bag, Telfar.

Shopping Bag, Telfar.Foto: Getty Images

Na roupa, ele faz igual: pega peças que todos têm no guarda-roupa e transforma de um jeitinho só seu, tornando-as reconhecíveis por qualquer pessoa antenada em moda. Nesta temporada, percebemos a influência que criar o uniforme para a equipe liberiana nas Olimpíadas de Tóquio, no ano passado, trouxe a sua moda. Eram peças bem mais esportivas, mas com um toque elegante: camisas de basquete como vestidos longos, camisetas de time com os ombros de fora ou de uma manga só, tops de ginástica assimétricos, regatinhas coloridas, meiões de futebol como polainas e saias midi feitas de moletom. É como se ele tivesse reimaginado todos os códigos de uniforme esportivos como conhecemos. A elegância encontro o conforto do qual falamos tanto nos últimos anos.

A coleção também chega mais completa, com uma maior oferta de produtos. Tinha jeans, vestidos inspirados em silhuetas de alta-costura, roupas esportivas, básicos e mais uma penca de acessórios, como botas cowboy, Mary Janes, mocassin e as tão desejadas bolsas.

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Unir algo tão banal e popular, como um programa de vendas, a um desfile de moda é – e sem carregar nas tintas aqui – genial. Cria um senso de comunidade, já que aproxima o espectador do criador. Quem estava presente contou que, em dado momento, o estilista e parte de sua trupe giravam uma espécie de roda da fortuna para escolher a cor do acessório que seria presenteado à platéia. O lúdico, aqui, vai além das histórias e mundos fantásticos, incorporando um elemento popular e muito real que há muito não se via.

Com dezenas de pessoas no palco, esse desfile poderia muito bem ter virado um enterro, se me permitem o tom de meme. Mas é nesse caos, barulho, confusão e gritaria que a magia da Telfar acontece – e ver um designer negro destruindo e transformando as estruturas desse jeito é muito significativo.

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