Patricia Urquiola fala sobre a carreira e o papel transformador do design

Arquiteta e designer espanhola esteve no Brasil para inauguração da Cassina Store São Paulo.


Patricia Urquiola
Patricia Urquiola fala à ELLE Decoration Brasil sobre carreira e nova loja paulistana da Cassina. Foto: Divulgação



Um casarão neoclássico na Avenida Brasil, nos Jardins, em São Paulo, é o novo endereço da Cassina, grife quase centenária de mobiliário italiano. Aberto em colaboração com a brasileira Casual Móveis, ele foi decorado com peças de mestres do design. Há mobiliário de Charlotte Perriand, Le Corbusier, Pierre Jeanneret e Gerrit Thomas Rietveld ao lado de criações contemporâneas. Entre estas, há as de Patricia Urquiola, diretora artística da grife há 10 anos.

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A espanhola esteve no Brasil para a inauguração do espaço, no último dia 11. Antes, passeou por Brasília, visitou o Instituto Inhotim (MG), conheceu os Lençóis Maranhenses (MA) e foi ao Rio de Janeiro. Ela estava acompanhada do companheiro, o italiano Alberto Zontone, com quem fundou seu próprio escritório em 2001 e participou da entrevista.

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Cassina abre nova loja em São Paulo. Foto: Marco Antonio Foto



“Foi uma visita muito profunda”, disse Urquiola à ELLE Decoration Brasil. “Eu adoraria voltar para Brasília com minha filha, ela estuda arquitetura. Temos outra filha que tem também curiosidade sobre todas essas coisas. Seria fantástico retornar com elas”.

Nessas décadas de carreira, ela desenvolveu amplo portfólio, apoiado em sua formação como arquiteta e designer. Criou objetos, mobiliário, projetou hotéis, residências e exposições. Colaborou para Mutina, Louis Vuitton, B&B Italia, Driade, Salvatore Ferragamo, entre outras. Hoje, é considerada um dos nomes mais relevantes do design mundial. 

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São nessas incursões por diversos países e culturas que Urquiola encontra inspiração para criações de seu estúdio multidisciplinar, baseado em Milão, onde também reside. Em 2012, resolveu levar o trabalho à própria morada, para se manter mais próxima da filha caçula quando ela ainda era pequena. 

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Loja reúne clássicos do design e talentos contemporâneos. Foto: Marco Antonio Foto

“Eu queria que ela se sentisse muito confortável na minha vida. Se houvesse distância entre o trabalho e a vida normal, ela não me veria”, disse. “Talvez fosse importante a transparência entre o que era minha vida pessoal e meu trabalho. Porque, para mim, no fim das contas, design e arquitetura não são uma profissão. São realmente um modo de vida. É impossível parar e definir um horário para a minha vida pessoal e para o meu trabalho”. 

Apesar disso, rejeita a pecha de workaholic. Diz-se grata pela profissão e apaixonada desde o início, nos anos 1990, quando ainda nem pensava em ter a própria marca. “Vocês colocam nós, designers , em qualquer lugar e nós apreciamos as possibilidades de criar diálogos e de repensar comportamentos. Porque, no fim das contas, nosso trabalho não é criar objetos ou ferramentas. É sobre criar comportamentos para a vida”.

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Foto: Marco Antonio Foto

Sobre a nova loja paulistana, onde os 310 m² decorados reproduzem áreas de jantar, estar, escritório e quarto, cita o que entende como “perspectiva da Cassina”. “Não se trata apenas de conectar passado e presente, que é uma das nossas premissas, mas sim de tentar entender as coisas de um outro ponto de vista, como todos esses legados convivem”, disse.

Parte dessa visão foi impressa na ocasião da Semana do Design de Milão deste ano, numa celebração dos 60 anos da edição do mobiliário de Le Corbusier, Pierre Jeanneret e Charlotte Perriand chamada Staging modernity. Para a ocasião, o escritório italiano Formafantasma, fundado por Andrea Trimarchi e Simone Farresin, ocupou o Teatro Lirico Giorgio Gaber com performance de atores cercados por mobiliário. A imagem deste palco com Andrea e Simone ilustra uma das capas do volume 04 de ELLE Decoration Brasil.  “Em 2027 será o centésimo aniversário da Cassina. Já começamos a pensar o que podemos fazer, o que vai representar”, disse Urquiola.

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Foto: Marco Antonio Foto

Sobre os rumos do design, ela cita o uso de tecnologias e aproveitamento de materiais. “A matéria tem que ser muitas vezes renovada, repensada, regenerada, e temos que encontrar muito mais biomateriais que possam se transformar em outros e resolver os problemas de maneiras diferentes”, diz.

“Hoje somos 8,2 bilhões (de pessoas no mundo) e seremos 10,4 milhões em 60 anos. Temos que encontrar soluções porque teremos 2 bilhões de pessoas a mais no mundo e com recursos limitados”, complementa Alberto Zontone. 

O crescimento exponencial da população guiou a criação de uma instalação da Bienal de Arquitetura de Veneza deste ano, que eles colaboraram, chamada The other side of the hill (2025). O trabalho também analisa comunidades microbianas e como elas equilibram o consumo de recursos.

Patricia Urquiola

Foto: Marco Antonio Foto

Questionada se há projetos que ainda não conseguiu realizar, Urquiola responde que prefere ser provocada a criar algo novo. “Eu deixo-me surpreender por alguém que vem até mim e pergunte ‘Você poderia nos ajudar a fazer essa nova pesquisa?’, ‘Você poderia nos ajudar a fazer essa instalação?’, disse. “ Quando você tem um briefing, há um ponto de interrogação. Você começa a questionar coisas que existem, faz perguntas, e isso é muito interessante”.

E quais qualidades um designer precisa ter hoje? “Obviamente todos sabemos que a curiosidade é a primeira regra”. Além disso, cita a necessidade de estar aberto para se comunicar com outras disciplinas. “Acho que é um trabalho que, mesmo que você cometa muitos erros e falhas, precisa fazê-lo e não consegue nem explicar o motivo”, disse.

“Porque você realmente entrou nesse tipo de vocabulário (do design), essa linguagem que não é verbal, mas é tão interessante. E você pode modificar, crescer, repensar e se reconectar o tempo todo. Eu me sinto mais confortável (com isso) do que com palavras.”

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