Como é ser o perfumista da Chanel? Olivier Polge responde!

Depois de passar pelo México e pela Argentina, o nariz da grife francesa – responsável pela criação da linha Les Eaux de Chanel (um sucesso no Brasil) – aterrissou por aqui e contou tudo sobre a posição que herdou de seu pai, o histórico perfumista Jacques Polge.


chanel
31 Rue Cambon é um perfume de Les Exclusifs, a linha de alta perfumaria da Chanel Foto: Gabriel Cabral



À princípio, Olivier Polge não queria seguir os passos do pai. “Pelo contrário, tudo o que eu menos desejava era isso!”, conta dando risada ao lembrar da adolescência. “Mas, claramente, acabei mudando de ideia”, admite.

O francês atualmente ocupa na Chanel a posição que antes foi de seu pai, Jacques Polge, um dos quatro perfumistas que tiveram a chance de ser “o nariz” da maison. “Sempre amei perfumes, mas foi aos 20 anos de idade – quando comecei a trabalhar no laboratório – que descobri que também amava fazer perfumes”, continua.

Entre as mais notáveis criações de Olivier está a linha Les Eaux de Chanel – todas inspiradas em destinos idolatrados pela fundadora da marca. Paris-Paris (R$ 1105, 125ml), por exemplo, é um eau de toilette – como todos os perfumes da linha – que combina rosa damascena com cítricos, pimenta rosa e patchouli. Já Paris-Venise, (R$ 1105, 125ml) é mais refrescante, tem neroli no coração e fundo de baunilha com fava tonka.

olivier polge

 

Olivier Polge durante workshop da Chanel, em São Paulo. Foto: Divulgação

Além disso, Olivier cria diferentes versões de clássicos já consolidados da etiqueta. O Nº5, por exemplo, ganhou a versão Nº5 L’Eau (R$ 1150, 100ml), mais delicada e leve do que a original. O hit masculino da grife, o Bleu de Chanel, evoluiu com duas novas fórmulas criadas por ele. Um eau de parfum (R$ 1065, 100ml) que inova com um toque de cedro e um parfum (R$ 1320, 100ml) – superconcentrado – que surpreende com um pouco de sândalo na nova composição.

À ELLE o perfumista revelou quais são os seus principais desafios e como os encara com austeridade e rigor, como pede a cartilha de estilo da própria Gabrielle Chanel.

O que mais te fascina no processo de criar perfumes?

São duas coisas que eu amo na perfumaria e, curiosamente, elas são um pouco antagônicas. Por um lado, é um trabalho muito pé no chão. Você trabalha com flores, com madeiras, com temperos, com diferentes métodos de extrair tudo isso. Ao mesmo tempo, você também precisa criar algo totalmente imaterial a partir disso, que é o cheiro. Esse contraste me fascina.

O que você considera mais complicado: inventar uma nova fragrância ou reinventar um clássico?

Essa é uma ótima pergunta, mas não sei se, de fato, as duas coisas se opõem, sabia? De fato, são processos diferentes, mas eu gosto de sempre ter em mente que, se estamos criando um perfume, estamos falando do novo, almejando isso de alguma forma. Mesmo no caso do Nº5 L’Eau: ainda que o original seja muito icônico, tentamos manter apenas um fio de ligação entre os dois. Você sabe que ele é da mesma família, mas o Nº5 é mais elegante, imponente, enquanto o L’Eau – devido ao cedro e ao sândalo – tem algo mais casual.

Lily Rose Depp na campanha de Nº5 L'Eau, criação do perfumista Olivier Polge

Lily Rose Depp na campanha de Nº5 L'Eau – de Chanel, por Olivier Polge. Foto: Divulgação

Não deve ser fácil mexer em fórmulas tão reconhecidas e consagradas, imagino…

Olha, eu tenho a sensação de que certa restrição é até bom para o processo criativo, sabe? É como quando você constrói uma casa. Tem certas estruturas, certos pilares, que você não pode quebrar. Mas dentro de cada cômodo, dá para fazer o que quiser.

Sim, ao mesmo tempo, a Chanel tem perfumes superexclusivos – como os da linha Les Exclusifs – e outros mais mainstream – como o próprio Nº5 e o Bleu de Chanel. Como é trabalhar a mesma linguagem de marca em diferentes públicos?

Isso é o que eu mais gosto do meu trabalho na Chanel. São muitos territórios para serem explorados e cada um à sua maneira. Acho que, em Les Exclusifs, tem algo mais singular. Os pontos de partida para a criação dos perfumes são muito específicos – quase todos pautados pela vida da própria Mademoiselle Chanel. Um deles, por exemplo, se chama Coromandel (R$ 2975, 200ml) e faz alusão aos painéis de madeira que decoravam o apartamento dela. Por isso, trata-se de um amadeirado quente, misterioso, escuro.

Paris-Paris é a mais recente criação de Olivier Polge à vir ao mundo.

Paris-Paris é a mais recente criação de Olivier Polge à vir ao mundo. Foto: Divulgação

O oposto aconteceu quando criei Gabrielle (R$ 1150, 100ml). Aqui, a fonte de inspiração era a própria Chanel como um todo. Então, fiquei pensando: se o perfume vai levar o nome dela, quais ingredientes devo usar? Pois bem, durante a sua vida, ela sempre colocou flores brancas em suas fragrâncias. Então, esse foi o meu ponto de partida.

Falando do gosto pessoal de Gabrielle Chanel, sinto que, até hoje, há uma assinatura olfativa nos perfumes da maison. Algo ligado a essa sensação de limpeza – pela qual ela se tornou obcecada ao viver no orfanato de freiras durante a infância. Enquanto para a maioria das pessoas, conforto e nostalgia tem tonalidades mais quentes, para Chanel, tudo era mais frio e austero.

É curioso, as pessoas, de fato, dizem isso: “tem cheiro de Chanel”. Tem algo ali que elas entendem, que é difícil de explicar, mas acho que isso acontece porque não se trata de um fator tão material. Por exemplo, essas notas aldeídicas – pelas quais a Chanel ficou muito reconhecida – não são necessariamente aplicadas a tudo. Acho que, na verdade, existe um intuito de sempre representar esse frescor, essa limpeza, de diferentes aspectos e talvez acabe dando uma unidade para os perfumes da casa. Aliás, uma coisa que é legal de dizer a respeito da Chanel é que nunca vamos fazer uma fragrância chamada “O Jasmim” ou “A Rosa”. O ingrediente nunca é o ponto de partida. A Chanel era uma estilista que contava histórias e a gente quer fazer o mesmo com os perfumes que levam a sua assinatura.

Pensando nessas histórias, na linha Les Exclusifs tem um perfume chamado Misia – em homenagem à grande amiga de Chanel que a apresentou para o circuito artístico de Paris – e outro chamado Boy – fazendo referência ao Boy Capel, talvez o maior romance vivido pela couturier. Como é transformar temas tão complexos em cheiros?

Os perfumes sempre te levam para algum lugar, se você parar para pensar. Pessoas como Boy e Misia influenciaram profundamente a vida de Chanel e foram fundamentais para a construção do seu estilo mundialmente conhecido e ovacionado. A partir disso você vai puxando fios: objetos que te lembram daquela pessoa, a personalidade dela, a maneira como ela se vestia, o que ela trouxe para a vida de Chanel, e por aí vai. No caso de Boy, gostei de misturar elementos masculinos e femininos para criar uma ambiguidade. Já em Misia – responsável por apresentar Chanel ao gênio do ballet russo Sergei Diaghilev – tem algo talcado que lembra das maquiagens usadas pelos dançarinos da época. Dá para ir muito longe!

O que você sente que está mudando no mundo da perfumaria e como a Chanel está navegando por essas novidades?

Acho que as pessoas começaram a perceber que estavam usando cheiros muito parecidos, muito similares uns aos outros. Portanto, há uma nova vontade de encontrar perfumes mais exclusivos – ainda que para isso, por exemplo, você precise misturar diferentes fragrâncias. Além disso, a divisão da perfumaria por gênero está sendo cada vez mais desafiada e isso é fantástico. Na Chanel, sinto que estamos muito abertos a tudo isso. Les Exclusifs talvez responda a esse desejo por algo único, Les Eaux por algo mais leve e, no fim das contas, todo mundo pode usar qualquer um dos perfumes da maison.

Por fim, quais são os cheiros que agradam pessoalmente seu nariz tão treinado?

Não é fácil responder isso, mas uma maneira de fazer isso é citando a íris. Gosto muito da raiz desta flor. Sou apaixonado por cítricos, ao mesmo tempo, então não é fácil (risos). Por isso que, para mim, é tão bom poder trabalhar com linhas tão diferentes. Sinto que posso explorar a minha paixão pela perfumaria de diferentes – infinitas – maneiras.

Para ler conteúdos exclusivos e multimídia, assine a ELLE View, nossa revista digital mensal para assinantes