Perfumista da Calvin Klein conta como é criar uma fragrância do zero

Responsável pela criação do CK Everyone EDP, perfume vegano e sem gênero, Gabriela Chelariu equilibra as expectativas dos clientes com memórias olfativas e outras referências.


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Se você viveu os anos 1990, certamente conheceu alguém que usasse o CK One – isso se você mesmo não fosse um dos fãs da icônica fragrância da Calvin Klein. Sem gênero, com frasco minimalista e campanhas ultracool, o perfume logo se tornou um dos mais vendidos em todo o mundo. Duas décadas depois, a marca lança o CK Everyone, com a proposta de simbolizar o espírito da nova geração de jovens, que é múltipla e inclusiva. Agora, a linha cresce mais uma vez com o lançamento da versão eau de parfum, que vem com uma proposta sustentável – desde sua fórmula vegana feita com ingredientes naturais até a embalagem feita de materiais reciclados. À frente desse lançamento está a perfumista Gabriela Chelariu. À ELLE Brasil, a romena abre os bastidores da criação da fragrância e fala sobre a relação entre a perfumaria e a sustentabilidade.

Como a perfumaria entrou na sua vida?

Minha trajetória é um pouco diferente da maioria dos perfumistas. Na verdade, eu sou farmacêutica. Quando eu estava no último ano da universidade, estudei moléculas de aromas usadas na perfumaria e comecei a me familiarizar com os processos da indústria. A partir desse momento, já tinha me apaixonado completamente! No final dos anos 1990, eu visitei Grasse, na França, e lá pude conhecer um pouco mais sobre o processo artesanal que existe na criação de uma fragrância. Foi ali que eu decidi que era isso que eu faria pelo resto da minha vida – eu não sabia exatamente como isso aconteceria, mas se tornou um sonho. Não muito tempo depois, eu já estava trabalhando em grandes casas de perfumaria.

Conta para a gente como funciona o processo de criar uma fragrância do zero?

Em primeiro lugar, é importante entender muito bem a marca, sua história, sua persona e suas intenções ao lançar essa nova fragrância. Também é essencial ter em mente as expectativas dos clientes mais fiéis, porque, no final das contas, nós criamos para eles. Depois, recebemos o nome do projeto, as cores e outros detalhes que nos ajudam a compreender ainda melhor o que esse produto representa. A partir disso, começamos a fazer conexões entre as informações recebidas e as notas olfativas que já conhecemos. Às vezes começamos com um único ingrediente e construímos tudo a partir dele. Tudo depende da inspiração que vem ao receber o briefing da marca.

Onde você busca essa inspiração?

Na maioria das vezes, na natureza. Eu cresci na Romênia e não lembro de uma época em que não estivesse envolvida com os cheiros do ambiente ao meu redor. Aprendi a reconhecer o mundo pelo olfato – tudo para mim tinha um cheiro específico. Eu tinha, por exemplo, as descrições olfativas de cada mês do ano. Maio, para mim, tem cheiro de peônias. (risos) Eu ainda uso essas memórias olfativas da minha infância. Além disso, gosto muito de viajar, de conhecer novas culturas e pessoas, e isso vem com um background olfativo. A primeira coisa que eu reparo quando chego em um lugar novo é o cheiro. E claro que isso influencia muito meus processos criativos.

As fragrâncias da Calvin Klein são bastante icônicas, especialmente as da linha CK. Como foi entrar nesse universo?

Elas são realmente muito icônicas e muito fiéis à essência da Calvin Klein. É uma grande responsabilidade fazer parte disso e estar trabalhando com uma marca que está sempre inovando e acompanhando as transformações dos jovens. Todas as criações capturam a energia da juventude de cada geração, além de serem inclusivas e conversarem com todas as pessoas. Tem sido uma alegria e uma honra poder fazer parte disso junto com Alberto Morillas, o criador do CK One. Criar o EDP foi um processo interessante, porque cada uma das pessoas envolvidas tinha uma visão. Mas, no final das contas, conseguimos transformá-las em uma única fragrância belíssima.

Qual é a história por trás do CK Everyone EDP?

Tanto para o CK One quanto para o CK Everyone, existem certos elementos e notas que nós precisamos capturar. Um ingrediente que está no DNA da linha é o chá: o verde, no CK One, e o azul, no CK Everyone. Para o EDP, nós queríamos manter essa identidade, mas trazer mais intensidade. Descobrimos um chá preto do Sri Lanka que é perfeito para o que estávamos querendo trazer para o blend – ele é fresco, ao mesmo tempo que é esfumaçado e rico.

O mercado de beleza tem se tornado cada vez mais sustentável. Como tem sido essa evolução na perfumaria, especificamente?

A indústria de perfumes, em geral, tem se preocupado com a sustentabilidade já faz um bom tempo. O que mudou é que a conversa se tornou pública, o que é muito importante, porque as pessoas começaram a entender o que é ser sustentável, o que é uma fragrância “limpa”, o que é usar ingredientes reutilizados ou que venham de fontes naturais renováveis. Acredito que seja uma combinação de consumidores querendo mais transparência e, da nossa parte, uma maior abertura para falar dos processos.

Ser sustentável na perfumaria tem muito a ver com proteger os ingredientes naturais que são produzidos por comunidades ao redor do mundo. É importante que nós estejamos sempre atentos para que elas consigam seguir produzindo essas matérias-primas tão especiais. Sustentabilidade tem a ver com o meio ambiente, mas também com as pessoas – das que produzem às que utilizam os produtos.

Como isso afeta o seu trabalho?

Pode ser desafiador, porque, às vezes, precisamos deixar de usar certos ingredientes com os quais já estamos habituados e que fazem parte da perfumaria há muito tempo. Mas acredito que essa é uma oportunidade para que sejamos mais criativos. Quando algo falta, quando existe alguma limitação, a gente tem a chance de explorar novas formas de trabalhar.

O que você espera para o futuro da perfumaria?

Eu acredito que a sustentabilidade vai estar cada vez mais em alta, o que vai influenciar muito a indústria como um todo. Além disso, acho que os perfumes passarão a ser utilizados como ferramentas de bem-estar – levando em consideração muito mais como elas nos fazem sentir. No processo de criação em si, acredito que as fragrâncias serão construídas de forma diferente: a estrutura de notas de cabeça, coração e fundo vai ser repensada, trazendo mais liberdade aos perfumistas.

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