Claudia Raia: “Eu era a síntese dos anos 1980”

Em seu livro de memórias escrito por Rosana Hermann, a atriz relembra seu gosto pelos looks exagerados, seus amores e repassa seus 35 anos de carreira.


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Quando recebeu a proposta da editora HarperCollins para escrever sua biografia, Claudia Raia pensou que aquilo não era para ela. Aos 53 anos e com inúmeros planos de vida, a atriz se considerava muito nova para pôr a trajetória no papel. Foi convencida por um de seus empresários, Marcus Montenegro, de que já tinha conteúdo de sobra para um livro, e se apaixonou pela ideia.

A princípio, ela queria que a amiga Fernanda Torres escrevesse o texto. A agenda apertada da atriz/escritora não permitiu e Claudia fechou com outra Fernanda, a Young. Pouco antes da primeira reunião entre as duas, no entanto, Fernanda Young morreu em decorrência de uma crise de asma. “Quase pensei em voltar atrás com o projeto”, conta Claudia. Entrou em cena, então, a jornalista Rosana Hermann, apresentada por Montenegro. “Foi um match total”, define a atriz.

O resultado dessa parceria chega às livrarias nesta segunda, dia 16 de novembro. Nas 256 páginas de Sempre raia um novo dia, Claudia passeia por sua história e relembra momentos divertidos e emocionantes. Em entrevista à ELLE, a artista reflete sobre sua trajetória e dá alguns spoilers de sua bem recheada biografia.

Ao vivenciar alguns momentos de sua vida na obra, passou um filme pela sua cabeça? Você reviveu os sentimentos da época?

Com certeza! É muito emocionante. Mas reviver os sentimentos daquela época, não. A maturidade me faz olhar para minha trajetória com gratidão. Tudo o que aconteceu comigo passou, e ficaram as lembranças e as alegrias. Estou em paz com a minha história e muito segura dela.

Claudia Raia e um lobisomem em foto PB

Em Roque Santeiro, a primeira novela: “Comigo era tudo muito: muito cabelo, muita roupa, muito brinco”.Foto João Miguel

Hoje, ao ler a sua biografia, consegue refletir e perceber onde poderia melhorar?

Eu acredito que a gente sempre pode melhorar. Estamos nessa vida para isso. Eu acho, por exemplo, que tenho ainda que aprender a ficar mais quietinha (risos). Eu sou capricorniana, amor. Meu nome é trabalho. Mas é preciso ter equilíbrio. E isso eu estou aprendendo com a pandemia. Percebi que não tenho controle de nada, por mais que venha a me iludir achando que tenho. E olha que nesse quesito eu já mudei bastante. Costumo brincar que, agora, vivo no modo econômico: tenho mais consciência das minhas prioridades, por exemplo. A vida da gente é isso: aprender e evoluir. Por isso, não me arrependo de nada. Sabe-se lá onde eu estaria se tivesse feito uma coisa diferente? Tudo que eu vivi me trouxe para onde estou hoje. E, neste momento, sou muito feliz e agradecida. Então, no fim das contas, tudo valeu a pena.

O relacionamento com Alexandre Frota abre sua biografia. Entram nesse capítulo brigas, traições e frustrações?

Já começamos o livro por aí, esse grande devaneio adolescente que foi o meu casamento com o Alexandre. Foi uma cerimônia religiosa muito suntuosa, uma festa para 500 pessoas, muito vestido, muita cauda, muito véu (risos). Uma loucura! Além do casamento, conto toda a nossa história. Vocês vão descobrir um pouco mais sobre isso…

Você escreveu no livro que jogou todas as roupas de Alexandre Frota na Lagoa e ainda trocou a fechadura da porta…

Conto! E isso foi na época da separação. No livro, revelo porque tomei essa atitude drástica (risos).

Você também revive os momentos com sua mãe, dona Odette Raia. O que identifica como próximo na relação entre vocês e que hoje traz para o seu relacionamento com sua filha Sophia?

O amor e a parceria de mãe e filha. Eu e Sophia somos muito próximas, amigas, mesmo! Mas claro que imponho limites. Dou uma opinião que, às vezes, ela não fica tão feliz em ouvir (risos). Com a minha mãe era assim também. Nós éramos muito próximas e eu a ouvia muito. Ela foi a minha grande mestra.

Foto PB com quatro mulheres atras de um bolo de festa

Mulheres da família: da esq. para a dir., a mãe, Odette; a irmã, Olenka; Claudia; e a avó, Ernestina.Foto Arquivo pessoal

Num mundo em que ainda há uma violência absurda contra a mulher, até onde vai a sua sororidade com Sophia?

A minha sororidade é total, tanto com Sophia quanto com todas as mulheres. Temos que nos ajudar, nos apoiar, criar e cultivar essa rede de apoio entre nós. Só nos unindo é que vamos mudar as coisas, que conseguiremos a igualdade que tanto queremos.

No livro você também fala sobre o assédio que sofreu em Nova York na adolescência. Foi duro reviver esse momento?

O duro, na verdade, é pensar que esse é um assunto que vemos com tanta frequência nos dias de hoje, que as mulheres continuam sendo submetidas a tantos tipos de violência. Que bom que agora, pelo menos, estamos falando cada vez mais de feminismo. As mulheres começam a se sentir mais à vontade para falar sobre as suas experiências. Precisamos falar e, mais do que isso, mudar essa realidade.

Edson Celulari está nas páginas de Sempre raia um novo dia. Você conta tudo: casamento, filhos e separação?

Falo sobre o começo do nosso relacionamento, o casamento e a separação. Está tudo lá! E, claro, sobre Enzo e Sophia. Ser mãe é, sem dúvida, o maior papel da minha vida e há uma parte especial dedicada aos meus dois filhos.

Vocês eram rotulados como um casal ideal. Foi um susto perceber que não existia o casamento perfeito?

Acho natural essa “romantização” quando você não vive o dia a dia. Nós tínhamos uma relação tranquila, amorosa. Edson me ajudou a encontrar o meu tamanho. Antes, comigo era tudo muito: muito cabelo, muita roupa, muito brinco. Eu era a síntese dos anos 1980 (risos). Já o Edson é um cara low profile. Essa combinação foi importante. E fomos muito felizes. Foi um casamento lindo e que deu certo. Só que o nosso “felizes para sempre” tinha data para acabar. Só isso. Não quer dizer que deu errado.

claudia raia em foto PB, entre malas, no aeroporto

A caminho de Nova York: a atriz teve de enfrentar um episódio de assédio quando viveu na cidade.Foto Arquivo pessoal

Há um capítulo dedicado a Jarbas Homem de Mello?

Conto sobre esse nosso encontro de almas. Quando disse que falaria de todos os amores é porque são todos mesmo (risos). Nossa relação é linda, especial e não poderia faltar em um livro sobre as minhas memórias.

Você termina a biografia com uma história de encorajamento…

É uma história de esperança, fé e que tem a ver com outra passagem da minha história, da época em que, ainda adolescente, me apaixonei por um domador de elefantes de um circo que passou por Campinas.

Essa biografia é o seu primeiro ato?

Sem dúvida. Agora já estou me preparando para o próximo livro, que vai contar o segundo ato (risos). Se esse já tem tudo isso, imagina o próximo?! Até porque o segundo é sempre mais interessante que o primeiro.

Qual foi a sensação ao chegar à última folha da biografia?

Senti muita alegria em poder contar as minhas histórias. Quando peguei nas mãos os dois livros – Sempre Raia Um Novo Dia e a fotobiografia Raia – fiquei emocionada, porque estou segurando neles a minha história. E compartilhá-la com as pessoas que sempre me acompanharam, que me ajudaram a chegar onde estou, é maravilhoso. Meus fãs são muito especiais para mim.

Falando na fotobiografia Raia, que fotos você escolheu como conteúdo?

Esta obra é a celebração dos meus 35 anos de carreira. Escolher as imagens foi uma loucura, porque tenho muitas fotos. As pessoas vão ver as fotos da minha carreira, dos meus personagens e também as imagens inéditas que fiz especialmente para o livro. Além disso, nele ainda tem textos lindos de amigos e da minha família. A fotobiografia vai por outro caminho, com pessoas importantes da minha vida contando a minha história. É muito emocionante.

capa do livro Sempre raia um novo dia

Foto Divulgação

Gostaria que você escolhesse um trecho do livro para presentear os leitores da ELLE…

Vou contar uma história engraçadíssima que aconteceu comigo antes de subir ao palco em Cinco vezes Comédia. A minha personagem era uma mulher hilária de Copacabana, que vendia drogas nas gôndolas do supermercado, coisas da cabeça de Miguel (Falabella). Um dia, durante a apresentação do espetáculo, eu estava muito gripada, toda entupida, até que uma produtora passou com uma bombinha de asma e eu, em um impulso, arranquei o remédio da mão dela — que, em vão, tentou me avisar que eu não devia usar aquilo. Eu, que não sou asmática, apertei algumas vezes a bombinha, inalei e, como era de costume, entrei em cena pela plateia. No meio do público, fui ficando com o meu lado esquerdo todo anestesiado, a minha língua foi enrolando, eu andava meio cambaleante. Estava no Canecão (Rio) lotado e tinha que subir uma escadinha de três degraus para chegar até o palco e fazer o meu monólogo, sozinha num cenário ambientado como se fosse a minha casa, com um sofá, uma cadeirinha e um telefone. Não sei como subi aqueles degraus e cheguei até o sofá, porque eu só pensava que estava tendo um AVC ou enfartando. Tentava pegar o telefone e ele pesava duzentos quilos. Até que parei e disse “desculpa”, mas com a língua toda enrolada, passando muito mal. Todo mundo se levantou. Luiz Fernando (Guimarães), que estava maquiando o corpo para entrar depois de mim, vivendo um stripper de boate, saiu do jeito que estava, entrou no palco de cueca e me pegou no colo. Uma ambulância, que sempre ficava de plantão no Canecão, já tinha sido acionada e estava me esperando na saída. Luiz me enfiou no veículo e me levaram para o hospital. Graças a Deus não era nada grave, só a minha falta de lucidez em não seguir a regra de “nunca use medicamentos sem orientação médica”.

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