Figurinista de “Casa Gucci” fala à ELLE sobre os bastidores do filme
Janty Yates detalha as roupas do longa, conta sobre seu mergulho no arquivo da grife, da participação ativa de Lady Gaga e da parceria com Ridley Scott.
Janty Yates fez um mergulho no arquivo da Gucci — autorizado e disponibilizado por Alessandro Michele, diretor criativo da grife — para criar o figurino de Casa Gucci, que estreia nesta quinta-feira (25.11). Os reveses da história da marca, recheada de controvérsias, traições e até assassinato, chamaram atenção do diretor Ridley Scott, diretor do filme, que reuniu Lady Gaga, Adam Driver, Al Pacino, Jared Leto e Salma Hayek no elenco.
Janty Yates na premiere de “Casa Gucci” em Londres.Getty Images
Apesar da história da Gucci começar na década de 1920, quando o italiano Guccio Gucci carregava malas no Hotel Savoy, em Londres, Casa Gucci se concentra entre 1960 e 1990, quando os herdeiros do fundador assumiram o controle da marca, e no casamento de Maurizio (Adam Driver) com Patrizia Reggiani (Lady Gaga). Jeremy Irons interpreta Rodolpho Gucci, pai de Maurizio, e Al Pacino vive Aldo Gucci, tio de Maurizio e pai de Paolo (Jared Leto, irreconhecível).
Segundo Janty, Lady Gaga, desde já cotada para o Oscar, foi peça fundamental para a criação de Patrizia Reggiani (futuramente Gucci). “Eu estava apavorada”, confessa. “Mas logo na nossa primeira reunião por Zoom, Lady Gaga me disse: ‘Eu quero me vestir como a minha mãe’. Foi música para os meus ouvidos, afinal a mãe dela era uma mulher italiana.'”
Apesar de ter começado a trilhar seu caminho como figurinista pela televisão, em séries como Yellowthread Street (1990), Janty logo escalou para o cinema. Entre um filme e outro, esbarrou com Ridley Scott, com quem já trabalhou em mais de uma dezena de filmes, entre eles Cruzada (2015), Prometheus (2012), Perdido em Marte (2015), Alien: Covenant (2017) e Gladiador (2000), que lhe rendeu o Oscar de melhor figurino. Confira a entrevista completa de Janty para a ELLE:
A Lady Gaga é muito participativa! Ela ama cabelo, maquiagem, roupas […] Por muita sorte, ela também nos ofereceu acesso ilimitado ao seu guarda-roupa.
Como você se tornou figurinista?
Janty Yates: Na verdade, comecei a costurar muito jovem, na máquina da minha avó. Um grande clichê, mas é a verdade. Em cerca de dois anos, eu estava fazendo todas as minhas roupas. Costumava me ajoelhar no chão para cortar os moldes, estampas, calças boca de sino, que eu sabia que iriam servir perfeitamente. Eu também desenhava todos os dias. Depois, estudei moda na faculdade, o que me ensinou muito, mas eu não tinha dinheiro nem talento para seguir trabalhando em grandes marcas, como John Galliano e Alexander McQueen. Eu amava moda e queria, de alguma forma, continuar trabalhando com aquilo. Então. meu parceiro na época sugeriu: “Por que você não procura um emprego na televisão?”. Com não conhecia ninguém, comecei como a assistente do assistente do assistente e trilhei meu caminho a partir daí.
Você já fez outras parcerias com o diretor Ridley Scott. Qual a diferença dos demais filmes para Casa Gucci?
JY: Todas as vezes que o Ridley me convida para um projeto novo, eu me deparo com um mundo desconhecido. Nunca fazemos a mesma coisa, nunca posso assumir que será algo garantido. Até o momento já fizemos três filmes intergalácticos — Prometheus (2012), Perdido em Marte (2015) e Alien: Covenant (2017) —, três medievais — Cruzada (2005), Robin Hood (2010) e o Último Duelo (2020) —, e este será meu terceiro filme com ele que se passa entre as décadas de 1970 e 1990. Basicamente, cobrimos toda a história da humanidade (risos). Apreendi muito. Ver o Ridley trabalhar é fenomenal, é um gênio. Ele também é um pouco obcecado com o figurino dos filmes, o que ajuda bastante, ele gosta de participar. Então, é sempre uma experiência inusitada.
Como foi trabalhar com peças do arquivo da Gucci e qual te chamou mais atenção?
JY: Bom, nós tivemos acesso ao arquivo da Gucci, e a melhor parte é que todas as peças serviram perfeitamente na Lady Gaga, como se tivessem sido feitas para ela. Particularmente, eu gostei de todas, mas a minha preferida foi um terninho com o logotipo da marca que ela usa quando descobre toda a podridão por trás da Gucci. É bastante icônico.
Qual a peça mais valiosa com que vocês trabalharam?
JY: Nós trabalhamos com muitos casacos de pele de Mink, que custavam mais que qualquer outra peça de roupa. Mas, falando das joias, usamos peças da Bucherer e da Bulgari que eram escoltadas no set de filmagem por dois seguranças o dia todo, para que elas não desaparecessem — nós tivemos que nos acostumar com a presença deles.
De onde vieram as peças que não eram do arquivo da Gucci?
JY: Eu trabalhei com uma equipe sensacional e um cortador incrível. No total, acredito que ele fez 30 vestidos, 10 ternos, 30 blusas, 8 calças, 40 saias — tudo entre setembro e as gravações, que começaram em fevereiro de 2021. Nós também tivemos acesso ao arquivo da Alaïa e da Valentino, e eu comprei algumas peças do EBay e da Boohoo. Por muita sorte, a Lady Gaga também nos ofereceu acesso ilimitado ao seu guarda-roupa.
A Lady Gaga é conhecida pelos seus looks. Ela participou da construção da Patrizia Reggiani das telas?
JY: Ela é fantástica! Muito participativa! Ela ama cabelo, ama maquiagem, ama roupas. Maravilhosa. Muitas vezes ela sugeria: “Acho que a Patrizia usaria isso quando ela conhecesse o Aldo”. Ou ia até o trailer de maquiagem e cabelo e dizia: “Acho que esse penteado seria adequado para quando minha personagem encontrar o Maurizio”. Ela foi ótima durante todo o processo, de verdade.
Como foi seu primeiro contato com Lady Gaga?
JY: Eu estava apavorada, na verdade. Ridley não queria que ela parecesse com a Jane Collins de Dinastia (exibida nos anos 80), com ombreiras, diversas estampas de rosas. Ele queria que Patrizia fosse uma mulher elegante. Mas logo na nossa primeira reunião por Zoom, L.G. me disse: “Eu quero me vestir como a minha mãe”. Foi música para os meus ouvidos, afinal a mãe dela era italiana.
Cada figurinista tem seu próprio método de criar o guarda-roupa de um personagem, mas no seu caso, em Casa Gucci você estava trabalhando com pessoas reais e que estão vivas. Isso interferiu de alguma forma no seu processo de criação?
JY: Não, de forma alguma. Tanto o Ridley quanto eu já fizemos filmes inspirados em eventos reais antes. Então, logo no início, pensamos: “Bom, nós estávamos lá, nós lembramos de como foi”. E, na verdade, foi bem engraçado, porque eu lembro vividamente dos anos 1960, 1970, 1980 e 1990. Então, era como se estivéssemos um passo à frente.
Então você se lembra de quando Maurizio Gucci foi assassinado?
JY: Oh, sim! Eu era a única pessoa na equipe que lembrava. Foi uma grande notícia na Itália, todos comentaram. Eu tenho muitos amigos lá, pessoas que trabalham comigo e que eu considero muito, então fiquei a par dos detalhes. Não acredito que a morte dele tenha tido o mesmo impacto para os estadunidenses e ingleses — ou mesmo os brasileiros — que a de Gianni Versace, por exemplo, morto em Miami e manchete em todos os jornais mundo afora.
Qual seu figurino preferido do filme?
JY: O vestido de casamento da Patrizia! Fiquei muito apaixonada por ele. Foi todo costurado e bordado à mão, demorou cerca de seis a oito semanas para ser feito, era simplesmente glorioso. O engraçado é que ele não tem nada do vestido que ela usou de verdade. Nós consultamos a documentação histórica do evento, o vestido era liso, simples, e nós chegamos a fazer uma réplica. Não decidimos qual seria usado até o dia em que foi gravada a cena do casamento entre ela e o Maurizio. Foi um completo pânico no set! A Lady Gaga experimentou o modelo original, e depois a nossa criação, e nossa! Não tivemos dúvida. Ficou perfeito. O vestido era lindo.
Vestido de casamento de Patrizia Reggiani em “Casa Gucci”Divulgação
E o figurino mais difícil de trabalhar?
JY: Eu diria, de novo, o vestido de noiva. Mas tem também o vestido vermelho que ela usa quando conhece o Maurizio. Até mesmo o Ridley ficou surpreso! Eu fiquei muito orgulhosa porque meu cortador havia trabalhado nele por semanas, e estava perfeito, caiu como uma luva. Mas o Ridley quis filmar uma cena do Adam e da Lady Gaga em um lago, usando o vestido. Então lá, na hora, tivemos que diminuir cerca de 46 cm da barra do vestido para que ela pudesse entrar no barco e gravar.
Lady Gaga em “Casa Gucci”.Divulgação
Você teve acesso ao arquivo da Gucci, à história da grife, de certa forma. Como analisa o desenvolvimento da marca?
JY: Quando o Maurizio estava no comando, tudo era redondo e marrom. Então, começou a era de Tom Ford, que tornou a marca monocromática, colocou a Gucci no topo. As mudanças que ele fez foram incríveis, na Gucci, na moda, em tudo. Basicamente, a Gucci foi uma casa de sapatos e bolsas por 50 anos e eles avançaram sobre as roupas, bom, graças a Deus por Tom Ford! Já o Alessandro Michele, atual diretor criativo da marca, também é um gênio. Claro, ele não está seguindo os passos de Tom Ford, ele fez a Gucci dele. Mas são necessários gênios como Alessandro Michele e Tom Ford para imprimir suas características em uma marca como a Gucci. Eu vejo o que ele está fazendo como algo espetacular, especialmente para os jovens, é glorioso!
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