Desvendando Burle Marx

Tema de duas publicações recentes, obra do paisagista pode ser conferida ao vivo em novo hotel-boutique na Serra Fluminense, nas ruas do Rio de Janeiro e no sítio onde ele viveu.


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Quase três décadas após sua morte, Roberto Burle Marx (1904-1994) continua a ser uma presença marcante no paisagismo brasileiro. A força de seu legado pode ser conferida em dois livros lançados recentemente, O tempo completa – Burle Marx, clássicos & inéditos, criação da Casa Roberto Marinho, e Folhas em movimento – Cartas de Burle Marx, da editora Luste.

O primeiro é o livro-catálogo produzido a partir da exposição de mesmo nome, que ficou em cartaz na Casa Roberto Marinho, no Rio de Janeiro, do final de 2021 a fevereiro deste ano. A mostra foi a primeira ação pública do acervo do Instituto Burle Marx, criado em 2019. “Ela ocupou a Casa Roberto Marinho inteira só com obras nossas”, conta Isabela Ono, diretora-executiva do instituto. De fato, material não faltava. Paisagista, pintor, desenhista, gravurista, escultor, tapeceiro e designer de joias, Burle Marx era conhecido por ser extremamente produtivo, plural e multidisciplinar.

Folhas em Movimento, lançado no final de junho, traz correspondências ilustradas do artista com sua família e nomes da cena internacional, como Walter Gropius, Richard Neutra, Eero e Aline Saarinen, Thomas Church, Garrett Eckbo, Lawrence Halprin, Diego Cisneros, entre outros. São trocas sobre projetos, engajamento, defesa ambiental e também temas sobre a vida no Brasil e no exterior.

Para além das páginas, no entanto, a melhor maneira de entender a importância do trabalho de Burle Marx é conhecer de perto suas obras. O artista plástico carioca Luiz Aquila, que foi muito amigo do paisagista, costuma dizer que, no Rio, as pessoas “andam por Roberto”. “Desde a chegada, no aeroporto, passando pelo aterro do Flamengo, depois o calçadão de Copacabana, é um passeio completo”, diz Aquila. O projeto da Avenida Atlântica é um verdadeiro painel artístico em espaço público, com 4 quilômetros de extensão. A obra, que acaba de completar 130 anos, virou um dos mais conhecidos cartões-postais brasileiros.

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Croqui da Avenida Atlântica.Foto: Rafael Adorján / Acervo Instituto Burle Marx

Dois outros lugares destacados por Isabela Ono para se visitar no Rio são o Instituto Moreira Salles, na Gávea, e a própria Casa Roberto Marinho, no Cosme Velho, que abrigou a exposição citada anteriormente. “Roberto era um ativista ambiental, por isso, visitar os seus jardins é muito importante. Ele foi precursor de questões que hoje são levantadas. Valorizava o que era nosso, tinha uma relação humana e generosa com a natureza. Não era radical, usava também adaptações, plantas exóticas, mas sempre privilegiando as tropicais, as pedras brasileiras”.

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Projeto de jardim para residência de Walter Moreira Salles, Foto: Sergio Guerini / Acervo Instituto Burle Marx

Já na Serra Fluminense, uma atração mais recente possibilita uma imersão no trabalho do paisagista: é o hotel-boutique Casa Marambaia, aberto em 2021, em Corrêas. Instalado em uma fazenda da década de 1940, o hotel tem apenas oito suítes, todas no casarão principal, onde os hóspedes podem tomar café da manhã de frente para um estonteante jardim de Burle Marx, que foi inteiramente refeito a partir dos projetos originais. Lá, é possível caminhar pela obra viva, circundando um lago e se encantando com bromélias gigantes e a vegetação que forma uma rica paleta de cores, com destaque para o vermelho e amarelo em meio ao verde. O hotel tem ainda uma queda d’água aos pés de um painel de Burle Marx, um dos últimos projetos realizados por ele.

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Vista aérea do hotel-boutique Casa Marambaia.Foto: Emir Pena

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Vista para o jardim da Casa Marambaia.Foto: Divulgação

Por fim, para fechar o roteiro, uma visita ao Sítio Santo Antônio da Bica, em Barra de Guaratiba, no Rio, é extremamente reveladora. Essa é a propriedade onde Burle Marx viveu e que foi doada em vida por ele, em 1984, ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). “No sítio, pode-se ter a experiência completa”, afirma Isabela. “Era a casa dele e cresceu de forma orgânica: toda a sua potência está ali.” Do jardins às pinturas, passando por suas coleções, tecidos e joias, Burle Marx está por todos os cantos da propriedade. As visitas ao sítio, com 365 mil metros quadrados, devem ser agendadas.

Para os próximos meses, o Instituto Burle Marx planeja outras ações para manter vivo o legado do paisagista. “São sete décadas de artes plásticas, de projetos paisagísticos, da relação do homem com a natureza”, diz Isabela que é filha de Haruyoshi Ono, sócio, parceiro e co-autor de projetos ao lado de Burle Marx por mais de 30 anos. Ela adianta que a próxima parada será uma grande exposição em São Paulo ainda este ano, mas não pode dar mais detalhes.

“Nosso acervo está muito bem organizado, dos croquis aos resultados, os processos criativos completos. Mostra o quanto ele valorizava o Brasil, amava os biomas e trazia o mato para as cidades”, afirma.

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