Uma espiadinha na casa do futuro

Como serão os lares nas próximas décadas? Seis artistas revelam, com ilustrações em 3D, como imaginam a arquitetura do amanhã. Com cores, texturas e iluminação surreais, estes ambientes devem fazer parte do nosso dia a dia em breve. Mesmo que existam só no mundo digital.


ilustração digital de um ambiente com luminarias brancas e tapete terracota
ilustração: Alexis Christodoulou



Piscinas com colunas imensas, jardins paradisíacos, repletos de plantas desconhecidas, salas com vitrais gigantescos. Em tons suaves, com misturas surpreendentes, entre laranjas e rosas, ou em versões fluo, mais carregadas, e erguidos em lugares desérticos, esses ambientes mais parecem saídos de um storyboard de filme de ficção sobre um mundo perdido no futuro. Uma espécie de Shangrilá para os tempos atuais. Quem curte passear por imagens de décor no Instagram certamente já cruzou com alguns desses cenários, criados em 3D por artistas digitais.

Essas casas intangíveis, construídas como renders, ou seja, desenhadas digitalmente, funcionam como um lugar de experimentação, em que os artistas podem combinar materiais, acabamentos e formatos que nem sempre existem. Tudo está sob o controle deles e não há orçamento ou gosto estético de cliente que limitem a criação, como acontece em um projeto de arquitetura na vida real. “O escapismo é um grande impulsionador desses trabalhos. O resultado são espaços imaginários cheios de humor, alegria e otimismo”, diz Daniela Penteado, especialista em tendências do WGSN.

Além de representarem um mundo perfeito – desejado por muitos, mas, por enquanto, presente apenas na imaginação –, essas imagens sinalizam um estilo de vida baseado em realidade virtual que deve se tornar cada vez mais acessível. Em breve, a gente vai receber os hologramas dos nossos amigos para uma happy hour numa sala toda mobiliada, mas que não existe de verdade. Também seremos capazes de planejar mudanças em nossas casas físicas projetando sobre elas versões digitais.

Isso é só o começo. Tudo indica que o caminho natural seja comercializar esses ambientes como NFTs (non-fungible token, ou token não fungível) – na prática, uma representação virtual de um item exclusivo. São muitas as possibilidades desse universo paralelo, que deve se integrar ao nosso dia a dia mais rápido do que pensamos. De olho nesse exercício de futurismo, ELLE Decoration Brasil ouviu seis artistas digitais. Aqui, eles revelam como imaginam as casas em algumas décadas (seriam anos?). Um ponto em comum: todos visualizam um lugar de escape, um oásis para relaxar, se desconectar da realidade e ter um pouco de paz. Nem que seja a digital.

Sem fronteiras

Somewhere in the World, por Mue Studio

ilustração digital de uma sala futurista com janela com vista para montanhas

“Estamos interessadas em borrar a fronteira entre a fantasia e a realidade”, diz a artista Minjin Kang, sócia de Mijoo Kim no Mue Studio, com sede em Nova York. A dupla, que atualmente trabalha como diretora de criação de um metaverso da moda, cria imagens de ambientes internos e paisagens surreais com cores e contornos suaves. A ideia, segundo elas, é levar os espectadores a curtir alguns momentos de férias virtuais. “Quando projetamos um lugar, que pode ser em qualquer parte do mundo, procuramos elaborar um espaço aconchegante no qual as pessoas sintam vontade de entrar e fazer uma pausa”, afirma Mijoo. As artistas explicam ainda que fazem questão de definir intencionalmente o período do dia na imagem, ajustando a luminosidade para criar um entardecer ou amanhecer, por exemplo. Outro detalhe importante na hora de criar é o lema “menos é mais”, que justifica o visual minimalista de suas obras de arte digitais. “Fica difícil promover o conforto quando a imagem é confusa ou excessiva”, afirma Minjin.

Novo mundo

Pool Side, por Solomon Woods

Ilustração digital de uma banheira futurista com janela

Dá vontade de se teletransportar ao olhar o ambiente criado pelo artista digital escocês Solomon Woods. “A inspiração vem do desejo de projetar lugares pacíficos e tranquilos, que possam levar as pessoas a um novo mundo”, explica. Com um senso estético apurado, o artista desenha os móveis e os revestimentos em detalhes e usa cores suaves com o objetivo de descansar a mente. O exterior é fundamental no trabalho dele, que sempre inclui paisagens entrando por grandes janelas. “É uma oportunidade de aproveitar o sol, olhar para o céu azul e limpar a cabeça de todos os pensamentos.” O teletransporte não será possível num futuro próximo, mas, segundo Woods, as casas onde vivemos se tornarão mais adaptáveis com a ajuda da realidade virtual e os espaços digitais criados por artistas como ele serão perfeitos para isso. “Vamos trabalhar e relaxar no mesmo espaço graças à capacidade de projetar casas virtuais”, explica.

Universo relax

Mansion of Infinity, por Anna Broeng e Tekla Evelina Severin

ilustração digital de um banheiro futurista em tons de azul com banheira tubular

Com o objetivo de levar o público a viajar em sua própria imaginação, a designer dinamarquesa Anna Broeng criou a série Mansion of Infinity, em parceria com a designer de interiores e colorista sueca Tekla Evelina Severin. Nesse banheiro, as cores suaves e a iluminação agradável, que remete a uma tarde ensolarada, transmitem o clima zen. Segundo elas, a inspiração veio do encontro entre os estilos escandinavo e mediterrâneo. “São características contrárias que se encontram, como o realismo e o surrealismo e o básico e o extravagante”, explica Anna. Elas acreditam que no futuro as casas não serão apenas funcionais, mas o nosso próprio santuário. “Queremos criar um universo relaxante, mais do que um quarto e salas de jantar e estar comuns. Não vamos precisar viajar ou dar uma escapadinha nos fins de semana porque poderemos viver isso sem sair de casa.” Basta nos plugarmos.

Em outra galáxia

Bath House, por Alexis Christodoulou

ilustração digital de ambiente futurista

 

O designer Alexis Christodoulou, da Cidade do Cabo, na África do Sul, é louco por videogame desde criança e sempre foi fascinado pelos cenários dos jogos. E se tornar um artista digital não foi um caminho natural, mesmo diante dessa influência. Antes de ingressar na profissão, ele foi redator publicitário. Em paralelo, aprendeu a usar softwares para criar imagens em 3D e logo abriu seu próprio estúdio de design, que tem uma filial em Amsterdam. Hoje, os espaços criados por Alexis lembram oásis, com cores delicadas e clima relaxante. “Busco inspiração na arquitetura minimalista e na sensação de olhar para um lugar e me sentir calmo”, diz o designer, que revela buscar referências no trabalho dos arquitetos Tadao Ando, David Chipperfield e Aldo Rossi. Alexis extrapola as fronteiras da Terra e pensa numa vida em outro planeta. “Imagino uma casa em Marte. Um lugar que deixa entrar a bela atmosfera vermelha, com florestas e jardins internos junto à lareira.”

Retrofuturismo

Villa in the Wild Gardens of Termini, por Odd in Shape e Charlotte Taylor

ilustração digital com uma sala futurista em tons de verde

A vista de uma paisagem natural exuberante invade a casa digital com atmosfera vintage criada pelo estúdio russo Odd in Shape em parceria com a designer inglesa Charlotte Taylor. “Somos fascinados por ideias que unem o retrô e o futurismo em lugares pretensamente explorados pelo ser humano”, explica Katia Tolstykh, sócia de Fedor Katcuba no Odd in Shape. A inspiração veio de anúncios publicitários criados pelo ilustrador Charles Schridde nos anos 1960 e alguns detalhes foram pinçados de filmes de ficção científica. Assim, formatos circulares e texturas aveludadas são as principais características do interior, que tem ainda um teto com jeito de nave espacial. Do lado de fora, a copa das árvores revela uma floresta no entorno. “Nesse projeto, quase não há fronteiras entre o interior e o exterior porque a natureza afeta diretamente o ambiente. A decoração, toda verde, tem uma relação simbólica com a paisagem”, explica a designer.

Esta reportagem foi publicada originalmente no volume 1 da ELLE Decoration Brasil. Para comprar seu exemplar, clique aqui.

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