É cringe ou não é? Calça skinny: um caso de amor e ódio

Relembramos a história da peça, que vem rendendo (novas) polêmicas pela internet, em todas as suas glórias e derrotas.


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Foto: Getty Images



Ao longo de algumas décadas, a calça skinny foi onipresente. Ela estava por toda parte, era como um uniforme, considerada tão essencial quanto uma camiseta branca e capaz de alcançar o difícil posto de unanimidade. Não à toa, a acompanhamos em uma evolução constante e sempre resistente. Apesar de propostas de novos tecidos, novas tecnologias e shapes, a modelagem parecia se recusar a morrer. Quer dizer, até agora. Membros da Geração Z já começam a dar sinais não muito simpáticos ao item – a skinny virou um dos ícones do que é ser cringe – e um movimento a favor de outras silhuetas ganha cada vez mais força.

O vai e vem da calça skinny

Apesar da onipresença, a calça skinny é um fenômeno relativamente recente. Lá pelos anos 1950, o jeans não era tão justo ao corpo e começava a ser introduzido aos armários femininos ainda com corte bem reto. Audrey Hepburn, Brigitte Bardot e Marilyn Monroe foram nomes essenciais para esse movimento. Em especial a última, que apareceu usando a peça no longa River of No Return, causando, assim, toda uma onda em torno da peça.

O jeans, então, se tornou realidade na vida das mulheres, assim como já era na dos homens, e isso não teve mais volta. No entanto, a modelagem rígida e ainda não muito confortável não permitiu que, ao longo da década seguinte, o item tivesse grandes avanços. No início dos anos 1970, por influência do movimento hippie, as calças ganharam novas modelagens e cortes, se alargando e muitas bocas de sino. Ainda é um mundo de distância da skinny tal qual a conhecemos hoje, porém já com uma silhueta mais curvilínea.

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RamonesGetty Images

É só no final daquela década, com o surgimento do punk, que shapes colados ao corpo começam a se destacar. A ideia era subverter os costumes tradicionais e abrir uma nova era musical e comportamental. E é aí que as calças skinny surgem como parte dessa revolução. Elas eram o uniforme oficial dos integrantes do The Clash, Guns N’ Roses, Ramones e de tantas outras bandas que marcaram os anos 1980. Na moda, um nome importante para essa subcultura foi Vivienne Westwood. A estilista britânica, que até hoje bebe dessa fonte, se aliou ao movimento e teve uma voz essencial para os discursos não-conformistas.

Esse momento, por sua vez, abriu espaço para a perspectiva grunge, que, ao longo da década seguinte, se desenvolveu, deixando as calças skinny para trás. Agora, as cinturas subiam e a modelagem já não era mais tão justa ao corpo, pelo contrário. Num cenário mais mainstream, era o reinaldo do que conhecemos hoje como mom jeans. Os personagens de Friends e Barrados no Baile se tornaram a cara da estética dos anos 1990, popularizando o novo shape.

Agora sim, a dominação mundial

Entre esse vai e vem até um tanto cansativo da calça skinny, ela só foi se consolidar de forma duradoura lá pelos anos 2000. O turning point aconteceu em 2005, graças à Kate Moss. A modelo foi fotografada chegando à casa do seu então affair, o cantor Pete Doherty, em Londres, usando uma regata branca e um jeans bem justo de cintura ultra baixa. A imagem rodou o mundo e estampou as capas dos maiores tabloides da época. A partir daí, o desejo já estava instalado e Kate se tornou a referência número 1 da peça.

Mesmo que a britânica não tivesse aberto esse caminho, haveria ainda um outro responsável por levar a modelagem para além do cenário musical: Hedi Slimane. O estilista francês, que atuava como diretor criativo da Dior Homme, subverteu as regras e fez com que a calça skinny se tornasse o centro de seu trabalho. Na época, a peça foi considerada até como antimoda por ser urbana ou emo demais para as passarelas de uma maison de luxo.

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Hedi SlimaneGetty Images

Hedi Slimane no fim de um desfile vestindo cal\u00e7a skinny.

É difícil decifrar com precisão os motivos para o sucesso das calças skinny de Slimane. A subversão, claro, é um deles. No entanto, não era só isso, sobre o excelente corte de seus jeans ou sobre todo o status cool agregado. Havia ainda um outro fator responsável: o corpo que estava sendo exibido. Os tamanhos minúsculos das peças do estilista chamavam atenção e ele ficou conhecido por sempre montar castings excessivamente magros. Algumas de suas campanhas foram até banidas por terem modelos com uma magreza considerada não saudável.

Ficamos sabendo também de casos extremos envolvendo grandes nomes, como a famosa dieta de Karl Lagerfeld, um fã declarado do francês, para que ele coubesse nos ternos e calças de Hedi. Os integrantes da banda Green Day, que seriam vestidos pelo estilista em uma de suas turnês, também fizeram o mesmo. Na época, tudo isso ainda era entendido em um tom de normalidade – e algo bem lucartivo. Após passar pela Dior Homme, Slimane assumiu o posto de diretor criativo da Saint Laurent, onde já havia trabalhado anteriormente. Lá, dobrou a receita anual da marca, de €353 milhões para €787 milhões, em apenas três anos.

A essa altura, nem é preciso dizer que as calças skinny já estavam consolidadas. Elas eram impossíveis de serem ignoradas e eram praticamente as únicas opções de jeans nas lojas. Nos anos 2000, Paris Hilton, Lindsay Lohan e Nicole Richie foram algumas das adeptas fiéis. Vale dizer que elas levaram a peça a sério, escolhendo-a até mesmo para red carpets. A partir de 2010, com a ascensão das blogueiras, a modelagem skinny seguiu firme e forte, e passou a ser acompanhada de tops peplum e sapatos Rockstud, da Valentino. As celebridades, no entanto, não eram as únicas a amar a peça. De Kim Kardashian ao anônimo que frequentava o mercado mais próximo, todos usavam o mesmo tipo de calça.

E a queda

E o que acontece quando uma tendência se torna extremamente convencional? Em alguns anos, perde o seu status e uma outra geração ou grupo faz o oposto daquela peça passar a ser considerado cool. Por tantas e tantas vezes, foi isso que aconteceu e a história da moda não nos deixa mentir. Assim, após quase duas décadas sob domínio da calça skinny, a Geração Z não só tem uma preferência declarada por outras modelagens, como também a detesta.

@momohkd Skinny jeans just aren’t for me but to each their own. ##momostyleme ##fashion ##TodayILearned ##skinnyjeans ##diy
♬ Brace Yourself – zenorachi

“Três formas de usar calça skinny: jogue fora, queime ou customize fazendo outra coisa”, foi o que indicou a jovem stylist Monette KD em seu TikTok (por favor, não queimem suas roupas! O resto tá valendo). Pela plataforma, a hashtag #SkinnyJeans já acumula mais de 100 milhões de visualizações e muitos vídeos tirando sarro da peça. Porém, antes da discussão começar por lá, esse já era um movimento nítido. Há algumas temporadas, as calças já vinham se alargando nas passarelas. Hoje, as celebridades que dominam a mídia têm as wide legs como suas favoritas. Vale dizer que as opções retas e baggy também têm o seu lugar de destaque.

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Bella HadidGetty Images

Aliás, já não há mais espaço para apenas uma única modelagem. Os diferentes formatos, cortes, lavagens e acabamentos estão por aí, revelando novos comportamentos de consumo e preferências cada vez mais amplas. Para a Geração Z, que cresceu com praticamente uma única opção no mercado, a mudança parece atraente e ainda conectada aos seus anseios. Afinal, se lá atrás, a problemática em volta das calças skinny de Hedi Slimane passava despercebida, agora, a história já é outra.

A nossa percepção de mundo mudou e esse item parece pertencer a um momento difícil de ser replicado atualmente. No entanto, em entrevista ao Business Insider, Chip Bergh, CEO da Levi’s, foi contundente: “Com certeza há uma forte tendência de calças mais largas e confortáveis, mas não acho que o skinny vá embora”. De fato, elas nunca irão morrer, sempre haverá interessados por elas e, talvez, daqui há alguns anos, possam voltar a ter a força que um dia já tiveram. Mas, pelo menos por agora, as novas gerações estão prontas para algo diferente, e isso não só é justo (em todos os sentidos), como é também o sinal de uma mudança maior na moda, o que é sempre emocionante.

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