Os planos de Marco Tomasetta para a Montblanc

Em um bate-papo com Susana Barbosa, diretora editorial da ELLE, o novo diretor criativo da grife alemã fala sobre sua primeira coleção para a maison e discorre sobre o poder da escrita.


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Marco Tomasetta é o tipo de pessoa que gosta de olhar seu interlocutor nos olhos. Um ano após assumir a direção criativa da Montblanc, em plena pandemia, partiu dele a ideia de um encontro presencial em Paris para conhecer de perto alguns poucos jornalistas e apresentar pessoalmente sua primeira coleção para a maison – a Meisterstück.

O italiano, que já trabalhou em outras renomadas casas de seu país, será o responsável daqui para a frente por redefinir e ampliar as linhas de acessórios de couro da grife alemã. Uma de suas metas é reafirmar a Montblanc como a marca definitiva para quem busca produtos luxuosos quando o assunto é o lifestyle dinâmico do mundo dos negócios, com uma variedade de itens que vai muito além da icônica caneta com o emblema inconfundível na tampa.

De cara, são três novas coleções a serem lançadas nos próximos meses: a Meisterstück Classic, a Meisterstück Selection Soft e a Meisterstück Selection Glacier. Sentindo os efeitos da terceira dose da vacina no braço, nos encontramos para um bate-papo informal no sofá do showroom, sem cerco de assessores e todo o protocolo que costuma ser imposto nessas ocasiões. Foi uma conversa fluida, com direito a troca de telefones, porque, como ele disse sem arrogância alguma, não é blasé como alguns colegas de profissão. Marco, além de ser um designer talentoso, gosta de estar com as pessoas, e sobre isso não tive a menor dúvida.

Há quanto tempo você trabalha na moda?

Há 20 anos. Comecei a trabalhar com 19 anos na Dolce & Gabbana. Trabalhei também na Fendi, Gucci, Prada, Louis Vuitton, Chloé e na Givenchy, com Clare Waight Keller. Adoro a Clare, ela é uma mulher muito chique e delicada.

É a primeira vez que você lidera a direção artística de uma marca?

Sim. É a minha primeira vez como diretor global. Em outras marcas, eu era o diretor da linha de acessórios e bolsas. Essa é a primeira vez que cuido de tudo, incluindo campanha, Instagram etc.

A Montblanc é muito conhecida por sua icônica caneta. Quais outros códigos da casa podemos ver na nova coleção?

O nib (a ponta da caneta) é a alma, a essência da Montblanc, e foi meu ponto de partida para criar os detalhes que aparecem em recortes de couro, costuras, bolsos, puxadores de zíper e alças. O emblema da marca (uma representação das seis geleiras que convergem para o ápice da montanha Mont Blanc) também surge maior e mais ousado. Revisitando os arquivos, vi que, embora muita gente o associe ao preto e branco, ele já foi feito em vermelho e azul. Portanto, essas são cores que fazem parte do DNA da marca e aparecerão com mais frequência daqui em diante. Também usei em algumas peças a silhueta do Mont Blanc recortada em couro azul, remetendo a uma campanha publicitária de 1920. Em breve, um novo elemento também será incorporado a uma coleção mais esportiva, a Glacier, inspirada na escalada e no montanhismo. Na coleção Meisterstück Soft, busquei um design mais moderno e compacto e utilizei um couro mais macio e fosco, tomando cuidado para que as peças não perdessem a forma. É uma coleção pensada para as aventuras diárias que vivenciamos nos centros urbanos.

Um dos seus grandes desafios na Montblanc é conquistar um público mais jovem e conectado, certo?

Cada vez mais entendemos que nosso público é criativo e orgulhoso de suas conquistas. Gosta de peças que possam ser encaixadas no trabalho e na vida privada e cada vez mais busca por funcionalidade e elegância. Nossos clientes amam produtos icônicos, que aliam a beleza à alta qualidade, sem perder as características artesanais.

Você se considera um designer que olha mais para o futuro do que para o passado? Como é o seu processo de criação?

Eu tive uma grande experiência em diversas marcas de moda e adquiri uma metodologia para trabalhar comigo mesmo. Gosto de trabalhar em marcas com história. Preciso conhecer primeiro suas raízes para depois fazer florir a árvore. Acredito que precisamos sempre observar o hoje, mas sou um designer que precisa da profundidade, do retrô, do clássico, para depois traduzir tudo isso em códigos modernos e de vanguarda.

Qual o papel de uma marca tradicional como a Montblanc em um mundo que está mudando tão rápido, com jovens consumidores mais engajados em temas como a sustentabilidade?

Temos feito reflexões e trabalhado para ajudar o planeta. Em breve, lançaremos a linha Glacier, em que o couro passa por um processo ambientalmente consciente para reduzir o uso de água e das emissões de CO₂. Sinto que uma das minhas grandes responsabilidades com a marca é fazer a nova geração escrever. Mesmo tendo o computador, é importante escrever (à mão). É uma forma de sustentabilidade, porque escrever é poder e, quando escrevemos, somos mais verdadeiros do que quando falamos. Quando vejo uma mulher ou um homem que escreve um livro, isso se torna potente. Um livro é eterno. Quando escrevemos algo eterno, queremos escrever algo que irá servir para o planeta.

A nova geração não escreve mais?

A gente generaliza um pouco. Não é verdade que os jovens não escrevem. Tenho conhecido muitos que são poetas, artistas, diretores e que escrevem. Sempre vai ter uma faixa de pessoas que escreve. Quem tem conexão com arte e criação vai continuar escrevendo.

O que é a elegância para você?

A elegância é algo que não cansa. É uma coisa que o faz sentir confortável, que não o coloca em uma situação difícil de se apresentar. Elegância é achar uma coisa que é sua, que pertence a você, e ter um diálogo pessoal com esse objeto porque ele lembra algo. Não é elegante tudo aquilo que nos é colocado de forma obrigatória.

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A nova coleção da Montblanc: variedade de itens vai muito além da icônica caneta.Foto: Karim Sadli

Recentemente a Montblanc lançou uma campanha que dizia: “What moves you, makes you”. O que move você? Qual a sua paixão?

Minha paixão na vida é o cinema. O cinema me fez sonhar, me educou e foi por meio dele que cheguei à moda. Cada diretor me fez desejar trabalhar em certas marcas. Todos os diretores italianos são incríveis, porque contam histórias fortes. Luchino Visconti, Federico Fellini, Michelangelo Antonioni… Para mim, Montblanc é um ponto de chegada porque, quando crio, é como se eu estivesse escrevendo vários filmes.

Você falou muito sobre poder. E poder, na maioria das vezes, costuma ser algo associado aos homens. Como você vê as mulheres na Montblanc e como pensa em incluí-las na conversa sobre poder?

A mulher sempre existiu na Montblanc porque a marca é feminina e masculina. A Meisterstück, por exemplo, parece muito masculina do lado externo, mas tem uma silhueta muito feminina, sensual, com suas curvas e detalhes do nib. A caneta é um objeto de poder, mas quem a escolhe geralmente é a mulher. Então, existe essa transferência de poder. Esse objeto, para mim, também é um diálogo de amor entre o homem e a mulher.

O que as brasileiras podem esperar de suas criações para a Montblanc?

Elas podem esperar algo que as faça se sentir elegantes, poderosas, mas sem tirar sua feminilidade. O que eu desenho é para homens e mulheres, mas tem dentro a feminilidade. Até porque o homem também precisa da feminilidade, como a mulher precisa da masculinidade. É ter as coisas com equilíbrio, na medida. O homem e a mulher devem estar na mesma linha, mas não por uma questão política ou religiosa. Para mim, é uma questão energética, de simbiose. Quando nasce uma ideia, ela não é masculina ou feminina. Uma ideia para mim não tem sexo.

Susana Barbosa viajou a Paris a convite da Montblanc.

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