O marrom é o novo preto

De repente, a cor outrora esquecida se tornou a favorita. Caso não esteja convencido, aqui estão as evidências.


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Foto: Getty Images



“As mulheres pensam em todas as cores, exceto na ausência de cor. Para mim, o preto tem tudo. A sua beleza é absoluta.” A declaração, creditada a Coco Chanel, é constantemente revivida. E não à toa. A cor parece gerar um fascínio especial, sedutora e contida ao mesmo tempo, uma declaração arquitetônica bem como um espectro indecifrável, silenciosa e gritante. Os paradoxos são muitos e, talvez por isso, se mantenha como uniforme do guarda-roupa há séculos. Na última temporada, porém, o preto ganhou um concorrente.

Do chocolate profundo ao caramelo amanteigado, o marrom está tendo o seu momento. A nuance, que por muito tempo foi evitada, costumava ficar em segundo plano entre os tons neutros quando comparada ao cinza e ao azul marinho. Um cinto marrom, tudo bem. Um sapato, pode ser. Nas peças de roupa, porém, quase nunca. Embora seja subestimado, ele é conhecido pela humanidade desde as primeiras civilizações. Em tumbas e pinturas rupestres na pré-história, em vasos esculpidos por gregos ou em pinturas a óleo produzidas durante o Renascimento, a cor sempre esteve ali.

 

Entretanto, houve um momento em que o marrom passou a ser usado para simbolizar simplicidade. Enquanto os nobres e aristocratas usavam roupas extravagantes em vermelhos profundos, os integrantes da classe trabalhadora eram uniformizados em peças em tons de marrom e bege. O marco foi tanto que, na Roma antiga, o termo para se referir a plebeus era “pullati”, compreendido como “aqueles vestidos de marrom”.

Foi só entre as décadas de 1920 e 1940 que, enfim, emergiu uma atitude positiva em relação ao marrom. Graças à proliferação do Art Déco, nesse período, a nuance passou a ser vista como elegante, se incorporando aos acabamentos metálicos e padrões corajosos da estética européia. Mas a fase não perdurou e, silenciosamente, os tons morenos saíram de cena outra vez.

A relação tumultuada não se limita apenas à história. Na ciência, em 2009, um estudo revelou que as pessoas não costumam gostar do marrom por estar associado a objetos desagradáveis. Já em 2012, pesquisadores da Austrália o consideraram “a cor mais feia do mundo”. A análise levou países, incluindo Reino Unido, Bélgica e França, a aprovar uma legislação exigindo que maços de cigarro fossem vendidos nessa tonalidade (especificamente, a Pantone 448C) para desencorajar o fumo.

Porém, nada disso impediu que as principais marcas do globo tingissem de marrom toda e qualquer peça de suas coleções. No inverno 2022 da Bottega Veneta, a cor apareceu intensa nos vestidos, calças e blazers assinados pelo novo diretor criativo Matthieu Blazy. Na Chloé, uma estética semelhante foi evocada, desafiando a abordagem boêmia de sua cliente. Já na Fendi, em uma referência clara ao verão 2000 projetado por Karl Lagerfeld, Kim Jones, um arquivista nato, deu sutileza à tonalidade.

De repente, o marrom, que, na verdade, nada mais é que uma combinação entre vermelho, amarelo e azul, já estava em todos os lugares: no feed do Instagram, graças à Bella Hadid e outras estrelas do estilo de rua, na adoração declarada de Tyler, the Creator e no TikTok, onde milhares de usuários filmaram o processo de tingir peças de seu guarda-roupa em tons morenos. Uma vez infiltrado, agora, a cor ganha vantagens pungentes enquanto recupera sua reputação pública.

Se uma pessoa vestida inteira de preto pode parecer intimidadora ou imponente, o visual marrom é convidativo como o abraço caloroso de um velho amigo.

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