PREVIEW SPFW: Neriage apresenta seu maior desfile de olho no futuro
Com duas lojas, equipe talentosa e crescente, a marca de Rafaella Caniello colhe os frutos dos investimentos recentes e já planeja os próximos passos.
Por volta das 17h de uma terça-feira quente e ensolarada, em São Paulo, as maquiadoras Vanessa Rozan e Ana Carolina Sabadin testavam alternativas para o penteado que haviam idealizado para o desfile da Neriage, marcado para o sábado seguinte, 19.20. “Não pode gel!”, diz Ana Carol. “Nem pomada”, completa Rafaella Caniello, diretora criativa e fundadora da marca.
A ideia era fazer um cabelo solto, jogado para trás e com aparência molhada (daí a necessidade do gel). Porém, por alguma limitação técnica ou descuido, esta edição da São Paulo Fashion Week não tem lavatórios para limpar os cabelos das modelos entre um desfile e outro. “Eles mandaram um comunicado avisando que não seria permitido esse tipo de produto”, continua Rafaella.
Mas tudo bem, existem alguns planos Bs. Para a estilista é algo um pouco mais arrumado, mas nem tanto. Tipo um rabo de cavalo baixo e meio solto. Já para stylist Rita Lazzarotti, é uma coisa mais natural, sem nada preso, só com um pouco de textura. Seu argumento é que as roupas do inverno 2023 são mais austeras, com cartela de cores densa, construções elaboradas e bastante alfaiataria, então seria bom ter um contraponto na beleza.
Croquis da coleção de inverno 2023 da Neriage. Foto: Cortesia Neriage
Rafaella concorda, pelo menos em parte. É que nas duas apresentações anteriores, os cabelos das modelos tinham essa mesma pegada natural. Ela queria algo um pouco diferente.
A relação entre as duas, embora recente (essa é a segunda coleção de trabalho conjunto), é de uma sintonia um tanto peculiar. A estilista tem uma quedinha pelo drama e pela complicação, vide suas roupas cheias de camadas, metros e mais metros de tecidos e silhuetas alongadas. Rita tem uma abordagem mais leve, direta, quase pop. É um contraste interessante e criativamente muito bem-vindo.
O primeiro resultado dessa parceria pôde ser visto no jardim do Hotel Rosewood, em São Paulo, em junho. Depois de um desfile impactante na temporada anterior, o verão 2023 da Neriage apareceu mais casual e até um pouco street (para os padrões de Raffaella).
Agora, para o inverno 2023, a praticidade da temporada passada continua presente, porém junto a propostas mais elaboradas, texturas intrincadas (um novo tipo de plissado, um jacquard com desenhos desérticos), tecidos nobres (com a mesma seda usada pela Hermès e veludo de seda) e acessórios de palha feitos artesanalmente em colaboração com o Projeto Akra, dedicado a treinar artesão da Bahia, Maranhão e Madagascar e conectá-los com marcas de moda.
“É nosso maior desfile”, fala Rafaella, que, há cerca de dois anos, em pleno caos pandêmico, quase desistiu de tudo. “Tinha uma entrevista com ela no dia seguinte em que fiquei sabendo dos planos de fechar a marca”, diz Laura Cerqueira Leite, sócia da Neriage. “Ela me mandou uma mensagem perguntando se a reunião ainda estava de pé, e disse que sim, claro”, continua a estilista, aos risos.
Croquis da coleção de inverno 2023 da Neriage. Foto: Cortesia Neriage
As duas quando Laura trabalhava com a assessora de imprensa e relações públicas Sônia Gonçalves. “Ela cuidava da nossa produção”, explica a designer. Pouco tempo depois, ela decidiu ir estudar em Paris e por lá ficou até o início da pandemia de Covid-19. Quando retornou, entrou em contato com uma proposta de se tornar sócia do negócio. E deu certo.
Hoje, a Neriage tem duas lojas, uma na rua Mateus Grou, no bairro de Pinheiros, e outra temporária no Shopping Iguatemi São Paulo, uma equipe talentosa e um ateliê e oficina de costura. “Viemos para cá em março e já está ficando pequeno”, comenta Laura, sobre o sobrado onde acontecia as provas de roupa naquela terça-feira, 15.11.
Segundo Rafaella, os planos são mudar para um espaço maior no ano que vem e contratar mais costureiras. “Queremos verticalizar cada vez mais a nossa produção. Nosso produto é muito específico, somos muito exigentes com acabamentos, com qualidade dos materiais. Então é importante manter tudo dentro de casa.”
Interior da loja Neriage, em Pinheiros. Foto: Cortesia Neriage
Pop-up store da Neriage, no Shopping Iguatemi São Paulo. Foto: Cortesia Neriage
A viagem até aqui não foi fácil. “Foi um desafio, precisei fazer vários empréstimos para manter a empresa nos primeiros anos da pandemia e fui persistindo”, relata. A chegada da sócia e, hoje, amiga serviu não só para dar mais estrutura e força ao negócio, como também para renovar as energias da estilista. “Considero que, hoje, a Neriage tem um ano”, continua Rafaella. Para ela, o que aconteceu entre 2017 e 2021 foi um projeto, não uma marca. “Antes, não tinha vendedora, não tinha nada. Até fizemos um novo CNPJ. Quando conversei com a Laura e decidimos seguir juntas para reconstruir a Neriage, nosso primeiro passo foi abrir a loja de Pinheiros”, diz.
E aí, neste ano, surgiu a oportunidade de experimentar com uma pop-up store no Shopping Iguatemi. “O principal objetivo era apresentar marca para um novo público. Apesar de sermos bem conhecidas entre os mais interessados em moda, sentimos que, principalmente em São Paulo, temos muitas clientes em potencial que não nos conhecem”, explica Laura. “Nossa roupa tem um nicho específico, por não ser tão comercial, ser cara, feita à mão e em pouca quantidade, conter técnicas complicadas”, continua Rafaella. “Queremos expandir nosso alcance e apresentar nossa mensagem para mais pessoas.”
Depois de algumas tormentas, parece que a Neriage e sua criadora atingiram uma calmaria. Ou, para usar a referência da coleção atual, chamada Oásis, naquele ponto entre tempos e jornadas em que é possível parar, respirar, refletir e pensar qual será a próxima viagem.
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