Quem é Colm Dillane, estilista convidado do desfile masculino da Louis Vuitton

Nome por trás da marca KidSuper, o designer nova-iorquino se destaca pela abordagem artística e colaborativa no streetwear.


O designer e artista Colm Dillane.
Colm Dillane. Foto: Reprodução/Instagram KidSuper



Rube Goldberg foi um cartunista estadunidense que ficou conhecido por desenhar engenhocas complexas para executar tarefas simples. Ele fez tanto sucesso que seu nome passou a ser usado para descrever máquinas que, por meio de uma série de mecanismos complexos, realizavam atividades bem fáceis.

Quando Colm Dillane estava no colegial, suas disciplinas favoritas eram matemática e mecânica. Numa delas, precisou fazer um projeto sobre as tais engenhosidades e acabou fazendo uma série de camisetas com estampa de Che Guevara. Todas vendidas na lanchonete da escola.

Algumas décadas depois, o estadunidense se tornou um dos criativos de moda mais interessantes do momento – mesmo sem ter a mínima ideia de como se costura uma roupa, como ele mesmo gosta de repetir. Com os dois pés bem fincados no mundo do hip-hop, sua marca, a KidSuper, ficou conhecida por suas peças estampadas com pinturas feitas por ele mesmo, elementos folk e algumas referências futebolísticas (ele chegou a jogar em um time juvenil brasileiro por um ano).

A partir do dia 19 de janeiro, Dillane ficará conhecido também como o primeiro estilista convidado a coassinar uma coleção para a Louis Vuitton. No caso, para a linha masculina, dirigida, até novembro de 2021, por Virgil Abloh, falecido naquele mesmo mês. Mas calma, não se trata de uma sucessão. Em entrevista ao WWD, Michael Burke, CEO da maison, fez questão de ressaltar que se trata de uma parceria pontual.

O convite, aliás, veio depois que o designer foi um dos três vencedores do prêmio Karl Lagerfeld, uma categoria do LVMH Fashion Prize de 2021. Virgil em si foi um dos jurados, mas foi Michael quem pediu para o estilista algumas ideias do que ele faria para a Louis Vuitton. Pouco tempo depois, o executivo recebia uma espécie de monografia com quase 500 páginas com muitas ideias e alguns poucos produtos.

É que Dillane tem uma abordagem um pouco similar a de Abloh, ambos outsiders da indústria, quando se fala de moda. Para ele, é mais sobre ideias, criação e a formação de uma comunidade artística cheia de trocas, colaborações e suportes dos mais variados. A apresentação de 19.01, por exemplo, terá a participação dos cineastas Olivier e Michel Gondry, do stylist Ibrahim Kamara, da cenógrafa Lina Kutsovskaya e, segundo boatos, uma apresentação da cantora Rosalía.

Ah, e também como Abloh, Dillane tem como moto e missão lembrar as pessoas que tudo é possível.

Filho de pai irlândes e mãe espanhola, Dillane nasceu em Nova York, mas viveu em várias outras cidades dos EUA. Desde criança, mostrava aptidão especial pelas artes. Em entrevistas, ele fala constantemente de como sua mãe, uma artista que acabou sendo professora, o estimulava a desenhar no tempo livre. O gosto pelas exatas veio só mais tarde, porque, segundo o designer, é uma maneira prática de resolver problemas.

Depois das vendas na lanchonete do colégio, a moda ficou algo relegada na vida do nova-iorquino. Foi só durante a faculdade de matemática, na Universidade de Nova York, que retomou a ideia de ter uma marca de streetwear que contasse alguma história e fosse capaz de criar uma comunidade. Entre as aulas, começou a criar peças de patchwork e com seus desenhos e transformou seu dormitório em loja, com novas coleções sendo apresentadas sazonalmente.

A direção da universidade não curtiu muito o entra e sai e pediu para que Dillane interrompesse as atividades ou saísse de lá. Ele bem que tentou fazer alguns processos para não precisar se mudar, tentou uma ação judicial, mas não teve jeito. Ainda bem. Foi assim que ele chegou ao espaço no Brooklyn, onde vive e trabalha hoje, e que funciona como hub criativo, não muito diferente do que era a Factory de Andy Warhol nos anos 1960.

Com apoio de alguns amigos artistas de hip-hop, as peças da KidSuper começaram a ganhar as ruas, multimarcas e, em 2017, a semana de moda de Nova York. O desfile na SoHo House foi tímido, mas a festa depois dele não, com performances de Joey Badass e os integrantes do Pro Era. Algum tempo depois, numa conversa com amigos, Dillane brincou que queria se apresentar em Paris e acabou levado a sério.

O primeiro desfile na capital francesa foi em janeiro de 2020, logo antes da Covid-19 colocar boa parte do mundo em lockdown. No Cirque d’Hiver, uma escola de circo entre a Bastilha e a Praça da República, rolou uma mega apresentação, com casting de amigos e familiares. E teve muita gente dizendo que foi um dos eventos mais interessantes daquela semana de moda.

Ainda assim, a KidSuper não conseguia furar a bolha onde a marca foi criada. Artistas de hip-hop, como Jack Harlow, Gucci Mane, French Montana e Migos, eram clientes fiéis, mas os aficionados por streetwear e boa parte do establishment da moda parecia não se importar muito.

A coisa mudou com a migração das fashion weeks para o digital. Com boa experiência no audiovisual, Dillane viu ali uma oportunidade para deixar sua criatividade e multidisciplinaridade florescer sem amarras. Nasceu assim o vídeo em stop motion com bonecas tipo Barbie, caracterizadas como Pablo Picasso, Freddie Mercury, Salvador Dali, Michael Jordan, Meryl Streep, JLo, entre outros, vestidas com miniaturas das roupas da KidSuper.

Foi a partir daí que gente grande da indústria começou a prestar mais atenção no trabalho do matemático-artista-designer. Entre eles, o grupo LVMH, que não tardou em aceitar sua aplicação para o prêmio de novos designers organizado pela empresa.

Depois da coleção co-criada com a equipe masculina da Louis Vuitton, Dillane continua em Paris para mais um grande evento, agora da sua KidSuper, no dia 21, e com presença de Mike Tyson e três comediantes estadunidenses.

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