SPFW N55: Dendezeiro, Apartamento 03, LED, Rafael Caetano e The Paradise

Quarto dia da semana de moda contou com estreias, saltos evolutivos, homenagens artísticas e pessoais, nostalgia e tesão.


Dendezeiro. | Foto: Agência Fotosite
Dendezeiro. Foto: Agência Fotosite



Identidade, consistência, constância e renovação, lembram? Então, pode adicionar tempo também. Tempo é importantíssimo – na moda e na vida. Não dá para esquecer nem para ignorar. Apressar também não é coisa boa. Questão de respeito, sabe? Tem coisas que só vem com ele, e demora. Ou não. Enfim, chega de perdê-lo. Na sexta-feira (26.05), a temporalidade foi um fator importante para os desfiles de algumas marcas desta SPFW N55.

 

LED

Foi com o tempo que Célio Dias, estilista da LED, superou um coração partido, deu uma nova guinada na sua marca e dedicou toda uma coleção a outro sentimento tão visceral quanto: o tesão. Com casting estrelado com nomes como Erika Hilton, Urias e Pepita, o que não falta é pele à mostra, tecido envernizado, crochês e tramas bem abertas e muita calcinha – para todes. 

 

Dendezeiro

Hisan Silva e Pedro Batalha, da Dendezeiro, começaram a trabalhar no conceito do desfile de sexta-feira (26.05) há pouco mais de dois anos. Na segunda apresentação presencial na SPFW, eles deram sequência à coleção “Cor de Pele”, lançada em vídeo em julho de 2021, na Casa de Criadores.

A ideia era e é falar sobre as diferentes tonalidades, marcas e características que tornam todas as peles únicas. É quase como um desdobramento ou recorte do que a grife tem como proposta ou ideal. De um lado tem a questão de fazer uma roupa capaz de vestir um maior número de corpos, graças às construções de modelagens ajustáveis. Do outro, tem a identidade, a origem, a ancestralidade como potência máxima e conectada com o mundo, “não só com o lugar de onde viemos”, nas palavras de Hisan.

E que diferença faz dois anos. O que se viu na passarela, na noite de sexta-feira (26.05), foi impressionante – pela beleza, pelo avanço técnico e pela ampla oferta de produtos. Jaquetas estruturadas e casacos acolchoados (que prometem ser peça-chave do próximo inverno brasileiro) trazem o peso e o calor necessários para ir além da cidade natal, Salvador. “Pensamos nesta coleção para ser usada em todos os climas”, comentou Pedro. 

A alfaiataria chega mais bem acabada e conectada à pegada street e esportiva que serve de base para a etiqueta. Um tecido que imita o couro rouba a cena em saias, vestidos e corsets, abrindo uma nova frente no trabalho do duo. Porém, o destaque inconteste fica com as peças de tapeçaria de tufagem, feitas em parceria com o artista Renan Estivan.

 

Rafael Caetano

Antes de estrear na semana de moda paulista, Rafael Caetano passou 10 anos na Casa de Criadores, evento responsável por formar e lançar alguns dos talentos da atual geração de estilistas nacionais e novos integrantes da São Paulo Fashion Week. Passou também bons anos na etiqueta de moda praia Adriana Degreas, onde aprendeu a costurar e modelar peças em tamanhos reduzidos com tecidos complexos de trabalhar. 

A experiência foi valiosíssima. Quando percebeu que precisava tornar rentável o próprio negócio, lançou uma coleção de sungas muito bem-sucedida. A partir de então, investiu em produtos com apelo pop voltados para a comunidade LGBTQIA+. “Fiquei nessa até a pandemia. Depois, senti que estava meio que no limite”, admite sobre uma sequência de coleções formuláticas, repetitivas e sem novidades. De novo, coisas que só acontecem com o tempo. 

Para a estreia de sexta-feira, o estilista baixou o tom da sua cartela de cores, eliminou os brilhos de paetês e tecidos sintéticos, e se dedicou a reproduzir sua identidade em peças de alfaiataria alongadas, com recortes e justaposição de estampas. Ah, e deu preferência a tecidos naturais, como algodão e seda – este último melhor trabalhado em camisas com babados e mangas alongadas.

Ainda precisa de alguns ajustes, é verdade. Mas isso, perdoem a repetição, é coisa que vem com o tempo. De todo modo, é bom ver Rafael saindo da zona de conforto. 

 

Apartamento 03

O mineiro Luiz Claudio Silva, da Apartamento 03, conheceu o trabalho de Estevão Silva na faculdade. Um dos professores do estilista insistia que fizesse uma homenagem. Dizia que só ele poderia tirá-la do papel. Mas o então estudante nunca achava a hora certa. Até que o tempo passou.

Considerado o primeiro pintor negro do século 19, formado Academia Imperial de Belas Artes no Rio de Janeiro em 1846, mais de 40 antes da sanção da Lei Áurea, Estevão Silva tem uma obra excepcional de natureza-morta. E, como é comum no Brasil, não existem muitas biografias sobre sua história. Ou seja, é preciso o ler pela sua arte.

Apesar do realismo das pinturas de Silvas, as imagens nas roupas da Apartamento 03 são difusas, fragmentadas, mais reconhecíveis pelas cores do que pelo desenho. Os tecidos estampados ainda ganham plissados magistralmente bordados em blazers e casacos, alguns com dobraduras de tecidos, como se aquela natureza borrada ganhasse tridimensionalidade.

 

Como é Luiz Claudio quem conta essa história, sua imaginação não tem por que ficar de fora. Os pássaros aplicados em vestidos transparentes foram pensados como admiradores vivos das frutas, flores e plantas reproduzidos nas telas do pintor. Suas penas, aqui, são de tecidos desfiados delicadamente. 

Para quem não é muito chegado em estampas, vale ficar de olho nos longos plissados ou nos conjuntos com mesmo trabalho de volume e textura. E tem também os vestidos de festa de paetês com costas abertas (tendência recorrente nesta temporada).

Perfeccionismo era o segundo nome de Estevão Silva. Pode-se dizer o mesmo de Luiz Claudio. O artista e o estilista, aliás, compartilham o mesmo sobrenome, coincidência que torna essa história mais pessoal do que parece. Para além da homenagem, o mineiro quer falar sobre um Brasil apagado e silenciado. 

Para muitos a camélia é sinônimo de Gabrielle Coco Chanel. Bem antes disso, conta o desgner, a flor era símbolo da luta pela liberdade dos negros escravizados no Brasil. Daí, sua aplicação em ternos e vestidos. Um desfile para aplaudir de pé.

 

The Paradise

Na The Paradise, dos cariocas Patrick Doering e Thomaz Azulay, o tempo é nostálgico. Ou nostalgicamente celebrado. Com estrelas de ontem, de agora e de sempre na passarela – Eloína dos Leopardos, Monique Evans, Silvia Pfeifer, Dudu Bertholini, Betty Prado, Luciana Silva, Pathy Dejesus, Johnny Luxo, Veluma Nunes e Marina Dias –, a coleção revista as cinco últimas décadas do século 20. Para cada uma, uma estampa (a fonte e foco criativo da dupla), um tipo de beleza (assinada por Celso Kamura) e uma trilha sonora.

 

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