Tudo sobre a compra da Versace pela Prada
O Grupo Prada comprou a Versace da Capri Holdings por 1,25 bilhão de euros. Entenda os detalhes da aquisição e as suas implicações.

O Grupo Prada, detentor da Prada, comrpou a Versace da Capri Holdings, estadunidense dona de grifes como Michael Kors e Jimmy Choo, por 1,25 bilhão de euros, algo em torno dos 8,2 bilhões de reais. Após meses de especulação, a holding italiana confirmou a negociação nesta quinta-feira (10.04), o Grupo Prada. O acordo, no entanto, deve ser concluído na segunda metada de 2025.
O valor negociado é mais de 200 milhões de euros a menos do que o esperado pela Capri Holdings. A guerra tributária iniciada pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, foi um fator decisivo nesse ajuste de preço.
Em nota à imprensa, Patrizio Bertelli, presidente e diretor executivo do Grupo Prada, afirmou: “Estamos encantados em dar as boas-vindas à Versace ao Grupo Prada e em construir um novo capítulo para uma marca com a qual compartilhamos um forte compromisso com a criatividade, o artesanato e a herança. Nosso objetivo é continuar este legado, celebrando e reinterpretando sua estética ousada e atemporal.”
Os rumores da aquisição começaram em fevereiro, quando Bloomberg News revelou, com base em uma fonte anônima, que o Grupo Prada era o principal candidato à compra. No mesmo mês, a Reuters, também de acordo com uma fonte próxima não revelada, confirmou que a Prada recebeu um prazo de quatro semanas para avaliar os dados financeiros da Versace. O período exclusivo de diligência é para entender os riscos da transação.
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No dia 13 de março, Donatella Versace anunciou que estava deixando a direção criativa da Versace, após 28 anos – ela assumiu o cargo depois da morte do irmão, Gianni Versace. Agora, Dario Vitale assume o lugar de Chief Creative Officer. O estilista foi diretor de design e imagem da Miu Miu, uma marca do Grupo Prada. Donatella segue como embaixadora-chefe da grife, concentrada em iniciativas filantrópicas, como a Fundação Versace.
“Os anúncios de hoje fazem parte de um plano de sucessão bem pensado para a Versace”, afirmou John D. Idol, presidente e CEO da Capri. Há tempos, a holding estadunidense pretendia vender a grife italiana comprada em 2018. Na época, o império Versace, incluindo artigos de casa, design de hotéis e algumas dívidas, foi adquirido por 1,85 bilhão de euros.
Donatella Versace Foto: Getty Images
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A trajetória da etiqueta sob gestão da Capri nunca ascendeu. Pelo contrário: a receita nos últimos três meses de 2025 foi de 193 milhões de dólares, 15% a menos que o mesmo período de 2024. Também neste ano, o prejuízo operacional da label soma 21 milhões de dólares.
Em outubro do ano passado, a Capri estava próxima de fundir toda a sua estrutura com a Tapestry, dona da Coach e Kate Spade, em um acordo de 8,5 bilhões de dólares. A aquisição, porém, foi bloqueada por uma juíza estadunidense. A Comissão Federal de Comércio apresentou uma ação para impedir o desenrolar da união e a corte entendeu que a fusão violaria as leis antitruste, pois reduziria a concorrência.
Depois da derrota nos tribunais, o preço inicial pedido pela Capri para vender a Versace, em torno de 3 bilhões de euros, prolongou as negociações com novos interessados. A aquisição Grupo Prada por 1,25 bilhão de euros representa ainda prejuízo para a holding estadunidense.
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A situação da Capri, porém, não é das melhores, o que a levou a fechar o acordo. Em fevereiro, a S&P Global Ratings rebaixou a classificação da dívida da empresa, afirmando que “as dificuldades operacionais e o seu alto endividamento dificultam o pagamento de suas obrigações”.
Por que o Grupo Prada?
Trata-se do maior grupo de moda italiano e que mantém um bom desempenho financeiro apesar da desaceleração do setor de luxo. No dia 4 de março, o conglomerado anunciou seus resultados de 2024. Com um faturamento de 5,43 bilhões de euros, o grupo registrou uma alta de 17% em comparação a 2023. Os lucros são de 839 milhões de euros, 25% a mais que o ano anterior. O crescimento da Miu Miu tem a ver com isso: no quarto trimestre do ano passado, as vendas no varejo da irmã mais nova da Prada subiram 84%.
O que a Prada ganha com a aquisição da Versace?
Hoje, o Grupo Prada tem em seu portfólio as marcas de moda Prada, Miu Miu, Church’s e Car Shoe (as duas últimas são etiquetas de calçados tradicionais, respectivamente britânica e italiana). A aquisição da Versace, cujo estilo contrasta com as demais empresas, é um complemento poderoso. “É um estilo que ironicamente se encaixa no portfólio do grupo. Você já tem a Prada, com aquela elegância, a Miu Miu, atendendo uma versão mais jovem dessa mulher, e, então, a Versace, com toda a sua exuberância. Isso completa o leque”, avalia Rosana Moraes, professora de Marketing na FGV com especialização no mercado de luxo.
Com Versace, o Grupo Prada consegue fazer uma frente italiana aos conglomerados franceses, como LVMH e Kering?
A compra leva a Versace novamente para mãos italianas. Nos últimos anos, muitas marcas fundadas no país foram adquiridas por grupos estrangeiros: Gucci, Valentino, Fendi, Loro Piana e Bottega Veneta, por exemplo. Mais do que um movimento de fraternidade nacional, a compra da Versace pelo Grupo Prada também amplia um embate histórico que é econômico e cultural. “Existe o orgulho desses países (a Itália e o seu artesanato, principalmente com o couro, e a França com o seu savoir faire e alta-costura). A competição não se dá em termos de tamanho (hoje, o Grupo Prada tem um valor de mercado de cerca de 22 bilhões de dólares, enquanto a LVMH soma 347,5 bilhões de euros), mas, sim, da defesa de um jeito nacional de se fazer moda”, diz Rosana Moraes.
É a primeira vez que o Grupo Prada compra uma grande grife?
Na virada do milênio, Miuccia Prada e Patrizio Bertelli, casal que dirige a Prada, começaram a fazer uma série de aquisições para fundar o que hoje entendemos como Grupo Prada. Em 1999, eles compraram 51% da Helmut Lang e, meses depois, adquiriram a Jil Sander. Mais tarde, entraram ainda para o leque de investimentos a Alaïa e uma fatia da Fendi. Na época, a ampliação dos negócios e o desenvolvimento de uma holding teve um gosto agridoce. As dívidas e o alto custo operacional de algumas marcas, além dos desentendimentos com os estilistas fundadores, levaram a dupla a se desfazer de quase tudo até 2007. A japonesa Fast Retailing comprou a Helmut Lang em 2006. No mesmo ano, a Jil Sander foi vendida para a inglesa Change Capital Partners que, mais tarde, a revendeu para o grupo italiano OTB. Nos casos de Jil Sander e Helmut Lang, ambos os designers fundadores deixaram as suas grifes durante a gestão Prada. Os desacordos chegaram a tal ponto de Patrizio Bertelli afirmar, anos depois, que cometeu um erro com essas casas.
Como a Prada pode dar um novo futuro para a Versace?
A reestruturação da Versace é complexa, mas a ligação da Prada com Dario Vitale, o novo diretor criativo, já traz ao menos otimismo. Vitale começou sua carreira na Bottega Veneta, depois de se formar no Instituto Marangoni. Em julho de 2010, mudou-se para a Miu Miu, onde trabalhou sob a direção criativa de Miuccia Prada por 14 anos. O destaque nesse período foi a sua capacidade de se comunicar com o público mais jovem de uma forma cool, o que seria uma boa saída para uma Versace ainda ancorada em signos do passado. Segundo Rosana Moraes, uma boa medida é apontar para o novo: “Se aproximar das novas gerações é a melhor possibilidade. Elas estão mais sensíveis ao luxo, contanto que se vejam retratadas. Manter o DNA da marca alcançando essas gerações com potencial de crescimento é uma boa ideia.”
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