6 restaurantes que comprovam a vocação gastronômica do Jardim Botânico
Com casarões históricos e clima bucólico, o bairro carioca se firma como um dos melhores destinos do Rio para quem gosta de comer bem.
O Jardim Botânico, na Zona Sul do Rio, vive uma efervescência. Conhecido como um bairro residencial tranquilo, cercado de verde e com uma temperatura agradável, o lugar vem diversificando a paisagem. Além das espaçosas casas muradas, do comércio pacato e dos ateliês , quem passa por ali encontra uma crescente variedade de restaurantes que vem dando um contorno de burburinho gastronômico ao bairro.
O italiano Grado, de Nello Garaventa, e o afetivo Sud, o pássaro verde, da chef Roberta Sudbrack, foram pioneiros dessa movimentação, que tem no charme dos imóveis antigos, no clima tranquilo e na fotografia natural do bairro seus maiores atrativos.
Vizinho ao Leblon e à Lagoa Rodrigo de Freitas, o Jardim Botânico tinha uma gastronomia tímida até o fim do século 19, já que não contava com linhas de bonde, nem tampouco com todos os tipos de mariscos que as águas cristalinas da Lagoa ofereciam. Ainda hoje, guardadas as proporções, o JB, como é carinhosamente chamado pelos cariocas, conserva ares de refúgio urbano. E os restaurantes que ocupam antigos sobrados e casarões ajudam não só a preservar construções que fazem parte da história do bairro, mas também propiciam experiências saborosas.
Uma volta pela área para conhecer suas belezas naturais e restaurantes é um programa que vale a pena. Confira restaurantes que têm colocado o Jardim Botânico no mapa gastronômico da cidade e, quiçá, do mundo.
Gonza
A expectativa era grande e a estreia não decepcionou. Após meses de reforma, que atiçaram a curiosidade do público gourmet do Rio, o chef Gonzalo Vidal abriu, há poucas semanas, seu primeiro negócio próprio na Rua Pacheco Leão, no Horto, charmoso recanto do Jardim Botânico.
Na década de 1830, a rua foi conhecida como “Baixa Itália”, por ser point de italianos, que contribuíram consideravelmente para a introdução de massas na gastronomia carioca. Além dos imigrantes, o local também era ponto de encontro dos trabalhadores do complexo têxtil que funcionava ali.
E foi em uma casa que servia como confecção têxtil e moradia para operários que Gonzalo encontrou os predicados essenciais para a bodega que idealizava: em uma esquina, com pátio interno e em um bairro residencial, onde os clientes pudessem comer na calçada ouvindo o canto dos passarinhos, em vez do ruído do trânsito.

Gonza: fachada do casarão ganhou tons de rosa. Foto: Divulgação
“A espera de todos esses meses foi muito boa, pois encontramos essa casinha, que é uma delícia”, conta, entusiasmado, o chef que saiu da província de Santa Fé há 17 anos para viver no Rio de Janeiro. “No interior da Argentina, os bodegones são sempre perto de onde se mora, geralmente em uma casa antiga, pertencente ao próprio dono, que também cuida do serviço. É uma atmosfera calma, tranquila, come-se na calçada sem barulho, um hábito típico de cidade pequena, e possível de ser vivido também nesta área do Jardim Botânico”, complementa.
Na reforma, o casarão ganhou tons de rosa, uma das cores favoritas de Gonzalo. No meticuloso garimpo feito para decorar e equipar o lugar, o chef veterano, já celebrado por seu trabalho no 74 Restaurant, no Hotel Casas Brancas, em Búzios, encontrou uma relíquia na Argentina: um fatiador da Berkel de 1950, peça-chave para servir os embutidos artesanais feitos por Gonzalo, que são assinatura do lugar.
Para acompanhar, foram criadas exclusivamente para o Gonza duas variações de vermute: o Viejo Isaías Rosso, maturado em barris de carvalho maltado, e o Viejo Isaías Rosé, envelhecido em jequitibá-rosa. Completa o trio um gin com infusão de erva-mate.
Falando em mate, a primeira bodega do Jardim Botânico utiliza o símbolo carioca no molho ponzu que acompanha o crudo de atum com biscoito de polvilho e vinagrete de milho-verde. Batizado de “Pé na Areia” (R$ 58), surgiu da combinação de “tudo que gosto de comer na praia”, nas palavras do argentino que passou anos em Búzios, em uma menção à proposta da casa de reimaginar pratos com ingredientes e elementos do Rio. Gonza também leva à mesa bife de chorizo na brasa (R$ 129), com glace de chimichurri, batata ao murro e hollandaise.
As sobremesas brincam com combinações de frutas da região e doces tradicionais, e são servidas com gelatos produzidos localmente. O alfajor (R$ 39) de chocolate e dulce de leche artesanal, por exemplo, leva gelato de creme de laranja. O rogel (R$ 36), doce típico argentino de muitas folhas de massa com doce de leite, merengue italiano e limão-siciliano, também segue o “feito na casa”.
Gonza: Rua Pacheco Leão, 868.
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Casa 201
Tudo começou de maneira bastante inocente: a administradora Cris Julião foi a um jantar particular na casa do chef João Paulo Frankenfeld e ficou tão impressionada com o talento do cozinheiro, que se animou a ter um negócio com ele. Coincidentemente, ela possuía o lugar ideal para fazer acontecer: uma casa da família na Rua Lopes Quintas, que havia servido como ateliê para o marido, artista plástico, e estava desocupada. Um imóvel com perfil residencial, intimista e acolhedor, em um bairro que concentra muitos estúdios, exatamente o tipo de ambiente que ambos imaginavam para o restaurante.
Após cinco meses de reforma, inauguraram o charmoso espaço, inicialmente, de apenas 20 lugares, cozinha aberta, serviço suave e tranquilo, menu degustação com preço acessível e atmosfera intimista. Cris e João não miravam prêmios, mas foi isso que aconteceu. Em pouco mais de um ano, a Casa 201 já era uma referência e, em 2025, com somente dois anos de existência, conquistou uma estrela Michelin.
“É um restaurante de destino – as pessoas saem de casa com a intenção de vir até aqui. Por isso, ele poderia estar em qualquer outro bairro. Ainda assim, não faria sentido que estivesse fora do Jardim Botânico, com seu clima calmo, residencial e acolhedor. O bairro é o único no Rio que poderia passar a atmosfera intimista que o restaurante propõe em seu conceito e menu”.

Casa 201: ambiente intimista e acolhedor. Foto: Divulgação
O menu degustação de nove etapas é atualizado com frequência em respeito às estações, aos ingredientes do dia e aos experimentos do chef formado pelo Instituto Paul Bocuse, em Lyon. Boa parte dos insumos são preparados artesanalmente no próprio restaurante: a charcutaria, os pães, os queijos, a cerveja, o saquê, a manteiga, as conservas, os sorvetes e as massas folhadas, tudo tem a mão do chef. Um exemplo é o raviolo de vieira, acompanhado de um lardo que levou um ano para atingir o ponto perfeito de maturação.
As receitas têm forte influência da gastronomia italiana e alemã, com ênfase no apuro técnico francês. Atualmente, a experiência custa R$ 660, com o acréscimo de R$ 420 para a harmonização com espumante e vinhos branco e tinto, e inclui etapas como o yellowfin marinado no saquê e missô da casa, com sorvete de saquê com kombu e caviar mujol e o ovo meurette e brioche folhado com creme de cogumelos. Como pré-sobremesa, o entremet de baunilha envolto por queijo da casa com gelato de alho negro e mel esparrama toda a inspiração e talento do chef.
Casa 201: Rua Lopes Quintas, 201, tel. (21) 96707-0201.
Grado
Bem antes de o Jardim Botânico ter este destaque no circuito gastronômico da cidade, o olhar estrangeiro de Nello Garaventa e a paixão por casas de época de sua esposa, a designer Lara Atamian, os levaram à Rua Visconde de Carandaí, uma plácida ruazinha com apenas 160 metros, no mesmo quarteirão da Lopes Quintas e da Pacheco Leão.
Inaugurado em 2017, o Grado é o primeiro restaurante próprio de Nello, que começou a profissão como cozinheiro na Locanda della Mimosa e depois integrou o time de casas como Cipriani e o extinto Fasano Al Mare.
“Eu adoro imóveis antigos. É legal a sensação de estar em uma casa, com suas características, histórias e esquisitices. Muitas vezes os ambientes de restaurantes são assépticos, com iluminação comercial, projeto de arquiteto, deixa a vida pasteurizada”, diz Lara.
O casarão dos anos 1940, então, virou uma segunda casa do casal: fotos da família de Lara, livros e objetos da família de Nello compõem a estante do térreo, cuja única abertura revela a cozinha ao salão. O móvel é uma réplica de uma estante que Lara herdou da avó.

Salão do Grado. Foto: Rodrigo Azevedo
A sensação de acolhimento continua na culinária suculenta e saborosa de Nello, apresentada no menu de três etapas – entrada, principal e sobremesa, sem contar o couvert, que dá as boas vindas com pão da casa dourado na lenha e manteiga artesanal.
“O cardápio do Grado é totalmente pessoal, são os sabores que nós gostamos e também pratos que fazem parte da nossa história. O carbonara, por exemplo, é porque temos saudades de Roma. A trofie com pesto é da região da família de Nello, a focaccia di Recco é receita de um grande amigo, o chef Nicola Fedeli. Um pouco como na própria casa, tudo o que está no menu tem um motivo”, afirma Lara.
As escolhas são flexíveis, com clássicos e novidades, além das sugestões do dia. Na entrada, fazem sucesso a fiori di zucca (flor de abóbora frita recheada com mozarela de búfala e aliche do mar Cantábrico) e o vitello tonnato (fatias rosadas de vitelo, creme de atum e alcaparras). Nas opções de principais, surgem cotoletta di maiale alla milanese (prime rib de porco à milanesa, rúcula e tomates e purê rústico de batatas gratinadas na lenha) e lagostins na brasa, com risoto do próprio caldo e chicória grelhada. Para finalizar, s crostata rústica de maçã, assada no forno a lenha, e o gelato feito na hora, de mascarpone com pinoli, chamam a atenção. O valor é R$ 223, mas algumas opções possuem um custo adicional.
Grado: Rua Visconde de Carandaí, 31, tel. (21) 99435-8386.
Sud, o pássaro verde
Quando a chef Roberta Sudbrack decidiu fechar, em 2015, o seu restaurante de alta gastronomia na Lagoa, ela circulou por meses no Jardim Botânico até encontrar um lugar para instalar o seu novo projeto. “Ficava rodando por aqui, que não é o bairro onde eu moro, mas é um bairro que eu amo”, conta.
A casa que escolheu pertencia à bisneta do Visconde de Carandaí, o mesmo que dá nome à rua onde está localizada. Antes de partir, a antiga moradora deixou um bilhete carinhoso para a chef: “Avise à Roberta que esta sempre foi uma casa de gostosuras.”
Para não ferir o conceito de lar, o restaurante não exibe nenhuma identificação na fachada – afinal, uma casa de verdade não tem placa nem letreiro na porta.
O nome “Sud, o pássaro verde” veio de uma maçaneta metálica em forma de pássaro, trazida da França. Mas a estrela mesmo do restaurante é o forno de barro a lenha, usado em todos os preparos, exceto para esquentar a água do café, que tem o mesmo sabor do café de dona Iracema, avó da cozinheira.
O forno foi um presente do amigo Federico Desseno, também cozinheiro e criador dos restaurantes uruguaios Marismo, em José Ignacio, e Cantina del Vigia, em Maldonado. Foi produzido com uma técnica ancestral, na qual o próprio Federico trabalhou o barro.

Arroz de frutos da terra. Foto: Instagram / @sudopassaroverde
Roberta o considera a grande estrela de tudo, pois ele a desafia diariamente: “Ele não está todo dia do jeito que eu quero. Ele não quer saber se sou Roberta Sudbrack, se cozinhei para o rei Charles. No dia que está chovendo, ele está de um jeito, no dia que está ventando, ele está de outro. Então, trabalhamos todos os dias com o improvável, pois a cozinha é viva”.
O franguinho assado lentamente no forno de barro foi o primeiro prato que Roberta quis colocar no cardápio. A chef não usa nenhuma máquina para cozinhar.
“A cozinha do Sud é difícil, pois demanda muito tempo de preparo e de cocção. Mas isso é muito Brasil, esse cozimento de ancestralidade. É uma cozinha afetiva. Infelizmente, o assado está se perdendo na cozinha brasileira.”
O restaurante não divulga o cardápio, pois ele é definido horas antes da abertura e durante o funcionamento, com base nos itens frescos recebidos. No entanto, o arroz de frutos da terra e o frango assado são presença garantida.
Sud, o pássaro verde: Rua Visconde Carandaí, 35. Tels. (21) 3114-0464 e (21) 97383-6725.
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Elena
“Na verdade, no nosso caso, podemos dizer que foi o Horto que escolheu o Elena. A ideia de criar o Elena veio somente após termos conhecimento de que o imóvel estava disponível, e ali visualizamos de que forma criaríamos algo conectado com o Horto. Na nossa opinião, é o bairro mais bonito e charmoso do Rio”, revela Alexandre Leite, sócio da casa.

Salão do Elena. Foto: Tomas Rangel
O imóvel em questão é um casarão reformado do século 19 que faz parte do conjunto histórico conhecido como Chácara do Algodão – um espaço que abrigava as residências dos operários da antiga Companhia América Fabril, uma das maiores empresas têxteis do país na década de 1920. A Chácara do Algodão formava uma verdadeira comunidade, com escola, clube esportivo, áreas de lazer e eventos tradicionais, como a famosa festa de carnaval. Por sua relevância arquitetônica, histórica e cultural, o conjunto foi tombado e preserva até hoje o charme de outra época.
Com cinco ambientes divididos em dois andares, o cardápio do Elena segue a cartilha de cozinhas milenares. Itamar Araújo recorre a sabores da Ásia, com passeios por Coreia, Japão, Tailândia, Singapura e Hong Kong, entregando pargo, merluza negra, camarão, cavaquinha, porco, sobrecoxa de frango e bife de chorizo Black Angus, que passam no forno de carvão. Kimchi de acelga fermentada (R$ 18) e arroz jasmim no vapor (R$ 26) acompanham.
Elena: Rua Pacheco Leão, 758.
Casa Horto
Foi durante suas corridas e pedaladas diárias pelo Jardim Botânico que Sérgio Lopes, um dos investidores da Casa Horto, passou a observar com atenção o casarão à venda no número 696 da Rua Pacheco Leão. A construção, datada de 1839, não apenas chamava a atenção pela imponência, como também oferecia a possibilidade de abrigar diferentes experiências gastronômicas sob o mesmo teto, tudo com o conceito de serviço de luxo e sofisticação que o grupo tinha em mente.
“Escolhemos um casarão histórico porque ele materializa a essência da Casa Horto. Hospitalidade com alma, atenção a detalhes e a sensação de estar em um refúgio onde o serviço tem padrão de hotelaria e a vista abraça a cidade, em uma experiência gastronômica completa”, afirma Sérgio.
A reconstrução, que se estendeu por pouco mais de um ano, manteve a identidade do imóvel, com vista para o Cristo Redentor. Assim, a palmeira imperial existente no espaço não apenas foi mantida, mas ganhou uma homenagem: o restaurante instalado no andar superior recebeu o nome de P’Alma. Já o restaurante do térreo, o Pátio, ganhou lateral de vidro que permite vista para a árvore.

Fachada da Casa Horto. Foto: Tomas Rangel
Contando com o Empório 1839, padaria no andar inferior, são três operações bem diferentes. O Pátio foi pensado para servir carnes e é tocado pelo parrillero argentino Adair Herrera. Começou com cortes nobres, como T-bone (R$ 229) e black angus (R$ 189) e, neste mês, acrescentou ao menu dois que são mais conhecidos e abraçados pelos brasileiros, a fraldinha (R$ 179) e a maminha (R$ 189). Peixes (R$ 99) e lagosta (R$ 152) também são preparados na parrilla.
Para acompanhar, farofas (a partir de R$ 32), saladas (a partir de R$ 46) e molhos chimichurri, manteiga de ervas ou vinagrete do Pátio. Na ala das entradas, uma volta ao mundo: ceviche de peixe fresco do dia (R$ 56) e empanadas de fraldinha (R$ 25), cordeiro (R$ 26) e queijo (R$ 22).
Uma escada de aço corten leva ao rooftop, onde está o P’Alma, restaurante que funciona apenas para o jantar, e conta com duas varandas ao ar livre. O steak tartar (R$ 86) aparece trufado e acompanhado por telha de parmesão que, vale dizer, pode ser comprada no empório para levar para casa.
Para finalizar, as sugestões são o mil-folhas de ouro, com creme namelaka de chocolate branco belga e pó de morango (R$44), e a Panelinha de Chocolate (R$ 39), com crema de laranja baía.
Casa Horto: Rua Pacheco Leão, 696.
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