João Pimenta completa 20 anos de desfiles e jura que ainda não gosta de roupas
Na noite desta segunda-feira, 22.05, o estilista apresenta nova coleção no Theatro Municipal de São Paulo.
“Básico, né?”, dispara João Pimenta ao me encontrar analisando as peças na arara de sua loja, no bairro de Pinheiros, em São Paulo. Uma camisa preta com pequenos volumes inflados nas mangas ou um blazer com um recorte circular no tecido drapeado das costas não é o que a maioria das pessoas considera básico. Para o estilista e boa parte de sua clientela, no entanto, são peças bem mais usuais do que as desfiladas pela marca ao longo dos últimos 20 anos. Pois é, tudo isso.
Exatamente duas décadas atrás, o criador, mineiro de nascença e paulista de criação, estreava na Casa de Criadores. Hoje a coleção de estreia talvez não levantasse tantas sobrancelhas. À época, suas propostas subversivas lhe garantiram uma posição de destaque no então árido mercado de moda masculina brasileiro. É que João tem uma sensibilidade rara. E, quando combinada a reflexão, estudo, pesquisa, aceitação e autocrítica, resulta numa fórmula de sucesso poderosa, embora nada fácil e tranquila. Para ele inclusive.
Suas duas paixões são de campos similares, mas com práticas e funções completamente opostas. João percebeu que gostava da moda na adolescência, quando trabalhou numa filial das Casas Pernambucanas, em Ribeirão Preto (SP), para onde se mudou com a família na infância. Aos 18 anos, foi para São Paulo e conseguiu um emprego na Rua São Caetano, a “rua das noivas”.
A mudança não tinha nada a ver com uma das profissões que exerce. É que, além de estilista, ele é figurinista – e premiado, mais de uma vez. A vinda para a capital se deu por um teste para um curso de ator, ministrado pelo diretor Antunes Filho, no qual foi aprovado. Logo no primeiro encontro, ouviu do professor que todos ali presentes deveriam viver em função do teatro. “Pensei: fodeu! Como vou pagar minhas contas?” Aos poucos, as imposições da vida adulta alteraram sua relação com a dramaturgia e reforçaram a sua aproximação com a moda.
Confira a seguir uma versão editada da entrevista com João Pimenta publicada na ELLE Men Vol. 02:
Podemos pensar nos seus desfiles como uma válvula de escape para seu lado performático e artístico?
Os desfiles acabaram virando uma vitrine para os meus figurinos. Várias vezes, cheguei para falar com um diretor e ele tinha as fotos da última apresentação nas mãos. Nunca fiquei feliz com isso porque sempre acreditei naquilo como moda. É a mesma coisa quando alguém me diz que o figurino roubou a cena do espetáculo. Não! Não é essa a intenção. Agora, quero que meus desfiles sejam para comunicar o trabalho da marca.
Como?
Quero voltar para o começo, reencontrar meu homem. Então, na próxima coleção, tem as saias, os vestidos, mas de um jeito natural, menos impositivo. Depois da pandemia, sinto que o desejo por uma imagem conceitual murchou. As pessoas querem roupas que vão durar, bem feitas, que permitam a elas expressarem sua personalidade de forma mais direta, sem alegorias, sem imposições. A gente, que cria, tem uma questão complicada com o ego. Num desfile, queremos surpreender, fazer algo diferente. Por outro lado, quando um cliente gosta de tudo, é outro alimento muito gostoso para o ego. Tenho me interessado mais por esse lado, que sempre foi conflituoso na minha cabeça. E, assim, o que estou fazendo para o próximo desfile está muito longe de ser algo simples ou puramente comercial.
João Pimenta.
Essa satisfação que você disse sentir quando vê um cliente feliz tem a ver com o fato de você oferecer à pessoa algo que fará parte da vida dela?
Sim, principalmente com o público masculino. Quando você sai atrás de moda masculina, por exemplo, num shopping, encontra as mesmas coisas: a calça reta, o chino, a de prega e a social. Aqui, temos 20 modelos de calça. Temos uma variedade gigante e ainda podemos fazer pequenos ajustes ou modificações. É muito legal quando o cliente chega e começa a pegar uma de cada. Foi quando identifiquei a satisfação na capacidade de servir, ajudar alguém a encontrar algo diferente, que vista de uma forma especial, que a faça se sentir bem. A roupa tem dessas. E olha que eu não gosto de roupa. (risos)
Ao longo desses 20 anos, você percebeu alguma mudança no seu consumidor?
Não sei se pelo que o país está vivendo politicamente ou pela introspecção forçada, pela qual muita gente passou nos meses mais duros da pandemia, mas sinto que alguns homens começaram a se manifestar de modo autêntico, fora dos padrões, se permitindo mais. Quantas vezes atendi clientes com uma esposa que escolhia tudo? Me parece que está rolando uma evolução na cabeça dos homens. Ainda que muitos ainda achem que a roupa define coisas. E roupa não define nada.
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