A farofa de Alexandre Herchcovitch 

Depois de retomar as rédeas de sua marca homônima e celebrar três décadas de carreira, Alexandre Herchcovitch revela o seu olhar para a praia em coleção de estreia na Casa de Criadores. 


Dois modelos com roupas do verão 2024 do estilista Alexandre Herchcovitch desfilados na 53ª edição da Casa de Criadores.
Alexandre Herchcovitch, verão 2024. Foto: Pedrita Junckes/Divulgação



Nesta terça-feira (5.12), a 53ª edição da Casa de Criadores começa com a estreia de um veterano: aos 52 anos de idade, 30 de marca, Alexandre Herchcovitch entra para o line-up do evento que ocupa o Centro Cultural de São Paulo até o dia 10.12.

“Ao contrário do que pensam, a Casa de Criadores não é uma semana de novos criadores, mas, sim, para criativos de todos os tipos lançarem as suas coleções, independentemente de suas idades e anos de carreira. E eu me encaixo nesse perfil”, explica o estilista. 

Ao longo da vida, ele conversou ao menos três vezes com André Hidalgo, o fundador e diretor da CDC, sobre a possibilidade de ingressar na semana de moda paulistana, conhecida pelo viés underground e por ter catapultado nomes como André Lima, Marcelo Sommer e Isa Isaac Silva. 

Se funcionou como trampolim para alguns, não significa que está fadada a ser o ponto de partida para todos. Por que não o lugar de um recomeço? Parte de um processo? O grande objetivo? 

Modelo com conjunto laranja da coleção de verão 2024 de Alexandre Herchcovitch desfilado na Casa de Criadores.

Alexandre Herchcovitch, verão 2024 Foto: Pedrita Junckes / Divulgação

“Rober [Dognani] desfila aqui há 12 anos”, lembra Alexandre. “Fora isso, aconteceu um encontro de datas, porque encaixou com o lançamento da minha coleção, e a estrutura era exatamente a que eu precisava”, ele continua. E que fique claro: da cenografia ao catering, nada é diferente dos outros designers. 

A coleção em questão é a de verão 2023/24, que ELLE Brasil teve acesso antecipadamente, durante uma sessão de provas, quatro dias antes do desfile. “Ela é uma coleção de verão inspirada no próprio verão. São memórias de praia, piscina e férias. É um tema inusitado para mim, mas eu queria me desafiar”, ele afirma. 

A sua primeira experiência com costura foi na fábrica de lingeries da mãe, algumas de suas grandes coleções tinham um aspecto solar e cara de Brasil, como a inspirada no surfwear e na realidade boia-fria. Alexandre Herchcovitch até mesmo trabalhou na Rosa Chá por anos, mas a sua marca registrada, não tem jeito, é dark, fetichista, sem dúvida alguma, noturna.  

Por isso, o verão à moda Herchcovitch tem um jeito próprio de revelar o corpo e imagens nada convencionais combinadas, driblando a obviedade e com aquele tino comercial pelo qual ele ganhou tanta fama. “Pensei na roupa propriamente de praia, mas também em opções de festa para esse mesmo lugar.” 

Modelo com look de verão 2024 de Alexandre Herchcovitch desfilado na Casa de Criadores.

Alexandre Herchcovitch, verão 2024 Foto: Pedrita Junckes / Divulgação

Esse litoral não é só para quem desfila com saída de praia e óculos escuros na orla ou para quem fica sentado na areia, tomando sol e bebendo drinques mil. Ele inclui também a imagem dos mergulhadores, dos surfistas e dos vendedores ambulantes. 

A modelagem colada no corpo não busca só sensualidade. As peças grudadas, quase que uma segunda pele, lembram uma proteção para situações de calor extremo – elemento pertinente num ano que bateu recordes de calor. 

Os tecidos são aqueles usados convencionalmente na fabricação de sunga, biquíni e maiô, mas não necessariamente nessas peças. Se uma parte da coleção é feita de neoprene, por exemplo, um tecido típico da roupa de mergulho, ele aparece em casaquetos retrô estampados no verso e reverso. Quando você levanta a manga, uma padronagem colorida e diferente é revelada. 

Existe ainda uma seleção de vestidos feitos de seda pura, uma série de jeans e um trabalho de “falso crochê”, em que uma máquina desenvolvida para criar tênis de corrida produz peças que imitam o trabalho manual de um jeito industrial. A roupa nasce com o formato e o volume projetado.  

Modelos com looks de verão 2024 de Alexandre Herchcovitch desfilado na Casa de Criadores.

Alexandre Herchcovitch, verão 2024 Foto: Pedrita Junckes / Divulgação

O toque inesperado, apesar de bem Herchcovitch, é uma pesquisa de roupas de época, que não necessariamente têm a ver com a praia. Pense em vestidos-camisola cheios de pregas e alguns elementos vitorianos. “É algo que eu gosto de fazer, olhar para roupas dos séculos passados ou para peças utilitárias com fins específicos e puxar partes desses universos para a coleção.” 

Esses contrastes são bem resolvidos no design, mas o styling, assinado por Marcio Banfi, soluciona com igual excelência o desafio de reunir e apresentar o arsenal de licenciamentos da marca (se no ano passado foi um, este ano conta com 17) e ainda segurar uma imagem quase sacoleira, farofeira, aquele jeito bem nosso de curtir a praia carregando pencas de coisas nas mãos e nos braços. 

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Não é novidade para Alexandre Herchcovitch recorrer a elementos nacionais e muito cotidianos e transformá-los em visuais luxuosos, que despertam desejo, mas a coleção revela que a sua atenção segue firme em direção ao futuro, depois de uma volta carregada por retrospectivas. 

Retrospectiva merecida, vale dizer. Por meio de uma aliança estratégica, Alexandre voltou a comandar a direção criativa e de comunicação da marca que leva o seu nome em 2022, exatamente três décadas depois de colocá-la no mundo e sete anos depois de vendê-la para a InBrands. 

O desfile de retorno, que aconteceu em dezembro do ano passado, tinha lâmpadas fluorescentes fazendo as vezes de araras com peças de 1992 a 2022. Ou melhor, de 1992 a 2015. Nos seis anos sem desfile, as araras estavam vazias. Na passarela, várias de suas assinaturas apareceram, dos xadrezes ao uso do látex, do color block ao chapéu feito em parceria com Stephen Jones para homenagear o ídolo Boy George.

Nos últimos meses, Alexandre foi administrando melhor a sua participação na À La Garçonne, marca do ex-marido, Fábio Souza, focada em upcycling, customização e sustentabilidade. “Eu sempre fui o estilista, porque o Fábio dá as diretrizes. São marcas diferentes”, ele diz. “Tem gente que, quando faz mais de uma marca, leva muito de um lugar para o outro e deixa as coisas parecidas. Não deixo isso acontecer”, continua. E o foco agora é total na Herchcovitch; Alexandre.  

Modelo com look de verão 2024 de Alexandre Herchcovitch desfilado na Casa de Criadores.

Alexandre Herchcovitch, verão 2024 Foto: Pedrita Junckes / Divulgação

Olhar para frente não deixa de trazer novos desafios. “O maior deles hoje é entender quem compra Alexandre Herchcovitch, depois de sete anos da marca sem colocar produtos no mercado. Eu ainda não entendi isso por completo”, diz. “Nós vendemos em três lugares diferentes, ainda não temos ponto próprio, o que fica difícil de compreender o que procuram. Quando a NK (Store) compra, por exemplo, é a seleção deles da coleção.” 

Por isso, entre os planos para 2024, está o desejo de aumento nos licenciamentos, e investigar melhor esse público. “Pode ser que a gente abra uma loja própria, que a gente passe a vender em mais lugares, certamente algo nesse sentido para ter uma ideia melhor de quem compra.” 

Das certezas, uma é a de que o próximo desfile, o de inverno, está programado para abril. A outra, é a de que a sua energia criativa segue a mesma: “Em termos de criação, eu continuo igual. Respeito sempre o que eu gosto e as minhas escolhas.” 

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