Dries Van Noten, verão 2025 masculino
O estilista belga Dries Van Noten se despede da marca que leva seu nome em desfile história na semana de moda masculina de Paris.
Meio fim de uma era, que já estava no fim há tempos. Na noite de sábadp (22.06), Dries Van Noten se despediu do comando da marca que leva seu nome com um desfile histórico na semana de moda masculina de Paris.
Vamos do começo: em março, o estilista belga pegou todo mundo de surpresa ao anunciar sua aposentadoria. Ele estava há 38 anos na chefia do próprio negócio, fundado em 1986.
Em 2018, a empresa foi vendida para o grupo espanhol Puig, que é mais voltado ao mercado de beleza e perfumes, mas também controla as marcas Carolina Herrera, Jean Paul Gaultier e Nina Ricci. Foi acordado, então, que Dries ficaria no cargo por cinco anos – no fim, foram seis devido à pandemia.
Dries Van Noten, verão 2025 masculino. Foto: Getty Images
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Segundo uma entrevista do designer ao The New York Times, a venda das ações foi o primeiro passo do plano de aposentadoria. O primeiro pensamento foi de fechar tudo. Mas Dries mudou de ideia para não deixar seus funcionários desempregados.
O ineditismo começa aí: é raro um estilista planejar e anunciar sua saída de cena. Mais raro ainda, fazer isso de forma considerada e cautelosa em relação ao negócio e, sobretudo, à quem o sustenta – no caso, os trabalhadores.
Para o último desfile, Dries foi quem recepcionou boa parte dos convidados – uns 800 no total. Colegas de profissão marcaram presença num gesto de admiração e respeito bonito de ver. Estavam lá Thom Browne, Pierpaolo Piccioli, Diane von Furstenberg, Glenn Martens (Diesel e Y/Project), Walter Van Beirendonck, Veronique Nichanian (Hermès), Neil Barrett, Alexandre Mattiussi (Ami), Harris Reed, Haider Ackermann, Ann Demeulemeester, Stephen Jones e até Martin Margiela em si.
Dries Van Noten, verão 2025 masculino. Foto: Getty Images
Dries Van Noten, verão 2025 masculino. Foto: Getty Images
Dries Van Noten, verão 2025 masculino. Foto: Getty Images
A acessibilidade e a generosidade, aliás, são grandes diferenciais do estilista. Mesmo sem representação comercial no Brasil, sempre rolavam convites à imprensa nacional durante as semanas de moda. Nos dias seguintes aos desfiles, quem passava pelo showroom da marca frequentemente via o estilista conversando com compradores e quem mais puxasse assunto ou cruzasse seu caminho.
Na trilha da apresentação, mixada pelo duo belga Soulwax, David Bowie falava sobre a complexidade do tempo: a expressão mais complexa, de acordo com ele. “É a memória manifestada, algo que abrange passado e futuro, sem nunca estar presente”, continua.
O monólogo de Bowie representa bem o verão 2025 masculino de Dries Van Noten, assim como toda a singularidade do criador.
Dries Van Noten, verão 2025 masculino. Foto: Getty Images
Dries Van Noten, verão 2025 masculino. Foto: Getty Images
Dries Van Noten, verão 2025 masculino. Foto: Getty Images
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O desfile começa com uma série de alfaiataria alongada, levemente seca e com caimento solto. Nessa primeira parte, a cartela de cores é neutra: bege, marrom, cinza, branco e azul-marinho. As decorações crescem aos poucos, começando pelos bordados dourados. Outras tonalidades cromáticas entram em cena no mesmo ritmo – primeiro esmaecidas, depois mais intensas. As estampas idem. E aqui vale dizer que elas são aplicadas com uma técnica japonesa com mais de mil anos.
O método, chamado Suminagashi, consiste em aplicar tinta numa superfície com água e, então, posicionar o objeto a ser estampado sobre o líquido, como um carimbo invertido. Por isso, algumas peças têm padronagens apenas na frente.
O efeito também é reproduzido em texturas metalizadas. Outras novidades em termos de maquete têxtil estão a lã escovada fundida ao neoprene, que dá toda uma estrutura felpuda ao look, e a poliamida enrugada, que parece um tecido feito de vidro.
Dries Van Noten, verão 2025 masculino.
Foto: Getty Images
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Foto: Getty Images
Dries Van Noten, verão 2025 masculino.
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Em depoimentos pré e pós-desfile, Dries reforçou que não queria mostrar uma coleção retrospectiva. Dá para identificar elementos de estações anteriores? Dá. Os bordados dourados na alfaiataria com um quê de nobreza, as estampas esmaecidas, os tingimentos, as transparências em camadas, as combinações de cores.
Tudo lembra alguma coisa. Nada parece nostálgico. Esta coleção – e todo o trabalho de Dries Van Noten – é sobre continuidade, evolução. Você é pego pela identificação ou assimilação de algo conhecido, e então é introduzido a algo novo, ou no mínimo diferente.
Dries foi um dos Antwerp Six, grupo de criadores belgas que introduziu um visual e uma maneira diferente de fazer moda no fim dos anos 1980. A professora deles na Royal Academy of Fine Arts da Antuérpia, Linda Loppa, estava no desfile.
Dries Van Noten, verão 2025 masculino. Foto: Getty Images
Dries Van Noten, verão 2025 masculino. Foto: Getty Images
Dries Van Noten, verão 2025 masculino. Foto: Getty Images
Um traço comum aos seis – além das aposentadorias (nenhum trabalha mais com moda) –, é a consciência, compromisso e comprometimento com a escala humana. Da criação à produção até a comunicação e venda.
Dries sempre fez tudo do seu jeito, no seu tempo. Com exceção de uma única temporada, ele nunca investiu em publicidade. As justificativas? Evitar o aumento de preço no produto final e não limitar a imagem a um ideal estético específico. Ao longo de quase 40 anos, a etiqueta resistiu às estratégias de marketing que prometiam sucessos quantitativos imediatos para não prejudicar consistência, coerência e identidade.
Nunca foi apresentada – sequer produzida – uma coleção de meia-estação, tipo resort e pre-fall. Acessórios, aqui, são acessórios mesmo: 95% das vendas vêm do prêt-à-porter – raridade hoje em dia. Apesar de algumas experimentações pontuais, os desfiles da marca fogem da lógica espetaculosa, instaurada a partir dos anos 2010.
Dries Van Noten. Foto: Getty Images
As roupas também não gritam por atenção, embora algumas carreguem trabalhos manuais, técnicas e tecidos dos mais nobres, escassos e valiosos. O apelo vem mais de um lugar de intimidade e pessoalidade. Tem verdade no produto, na divulgação, na ideia, na imagem. Um conjunto capaz de promover conexões bastante singulares – e agora ainda mais escassas na moda.
Dries Van Noten se afasta da criação, mas não da empresa. Ele ainda terá papel de conselheiro para o prêt-à-porter e continua responsável pela linha de beleza e pelos designs das lojas. Até o momento, o grupo Puig não anunciou um sucessor ou intenções de manter as coleções aos cuidados da equipe de estilo.
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