Crítica: Meninas Malvadas 2024 passa longe da força do original

Já nos cinemas, o novo Meninas Malvadas ainda "não pode sentar na mesa" de sua versão com Lindsay Lohan.


Meninas Malvadas 2024



Existe um problema fundamental na concepção desta nova versão de Meninas Malvadas para o cinema. O filme original, de 2004, marcou a cultura pop com suas frases de efeito, com as piadas espertas escritas por Tina Fey e com as atuações absolutamente frenéticas de suas protagonistas. A explosão foi tamanha que, 14 anos depois, veio a ideia de adaptar o longa-metragem para os palcos da Broadway em uma versão musical – lembro de dar essa notícia no site da ELLE, em 2018, com muita desconfiança: será que essa transposição seria possível?

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Qualquer preconceito que eu pudesse ter foi obrigado a cair por terra – Vale dizer, sou fã de musicais, mas ainda assim duvidava que, mesmo para quem gosta desse tipo de performance, essa ideia pudesse dar certo. Mas deu. A peça ficou em cartaz por dois anos e, depois disso, fez uma tour pelos EUA. Como se não bastasse, em 2020, uma montagem do espetáculo pintou no West End, “a Broadway britânica”. Agora, em 2024, chega às telonas a versão cinematográfica do musical. 

Meninas Malvadas

Elenco de Meninas Malvadas no tapete cor-de-rosa da première do filme, em Nova York. Foto: Getty Images

E eis aqui o problema logo de cara: é a tradução da tradução do original. Quando o intuito é o de montar uma peça de teatro baseada em um filme abissalmente conhecido pelo público, alguns detalhes da história podem ser eclipsados ou alterados sem que isso cause grandes danos ao produto final. Aliás, pelo contrário, certas adaptações são fundamentais para que a versão musicada da coisa tenha graça, tenha novidade, tenha fôlego e segure um espetáculo ao vivo. No entanto, a versão dos palcos conta exatamente com o efeito que os números ao vivo causam: o deslumbramento com o cenário, com a dança, com o esforço físico do elenco, com a projeção vocal – e, nesse sentido, a versão Broadway de Meninas Malvadas é um sucesso.

As músicas são divertidas e exigem muito do elenco, que precisa se desdobrar para – sem perder o charme, o carisma e a piada – cantar longas e altas notas em canções que misturam rock e pop ao ritmo brodwayresco. No filme, contudo, sem esses efeitos – e com largas passagens sem música – o espectador fica entre esquecer que está vendo um musical e lembrar disso só para ser surpreendido por músicas que adicionam pouco ao enredo e também não servem tão bem para que a gente se aprofunde nos personagens. Afinal, Meninas Malvadas não é sobre isso: é sobre a cafonice, o desespero, a loucura, o exagero, o surto, a maluquice, a selva que é ser adolescente e estar no ensino médio nos Estados Unidos em um mundo que ensina garotas a se odiarem o tempo todo. É sobre uma dinâmica eletrizante e irônica que, nesta versão para o cinema, perde a força por esta e muitas outras razões.

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Entre algumas destas outras razões está a escolha da protagonista. A primeira Cady é ninguém menos que Lindsay Lohan – que, apesar de não ser a mais talentosa das atrizes, interpretou magistralmente naquela ocasião essa menina que sai da ingenuidade para cair direto na perversidade e, depois, cair em si e se redimir. Angourie Rice, ao contrário, parece nunca sair da primeira fase. Sempre angelical, ela provavelmente foi instruída a cantar mais como uma musa indie-folk do que uma protagonista de Broadway no filme. A questão é que o resultado soa mais como uma incongruência entre melodia e voz do que um contraste bem-vindo – que, creio eu, era o almejado pela direção. 

Aliás, o roteiro e a maneira como as cenas foram construídas também não ajudam a demarcar bem essas fundamentais transições de personalidade das personagens principais. Por exemplo, no Halloween – em que Cady assiste à traição de sua então possível amiga Regina George (Reneé Rapp), que beija Aaron Samuels (Christopher Briney) – a música em questão se volta a louvar a maldade de Regina em vez de focar na revolta de Cady. De modo que a justificativa para o ódio de Cady se enfraquece, e a canção “Revenge Party”, que vem a seguir, fica parecendo meio gratuita.

meninas malvadas

Quarteto de protagonistas de Meninas Malvadas em set de filmagem durante a gravação do filme. Foto: Divulgação

Sobre os acertos, Reneé Rapp, definitivamente, é um deles. As versões para o cinema das músicas protagonizadas por Regina George funcionam bem – têm um quê da sonoridade de Billie Eilish que moderniza o musical – e ela canta a plenos pulmões. Além dela, os “freaks” são um estouro. Tanto Auli’i Cravalho quanto Jaquel Spivey brilham, sempre que aparecem – ainda que sejam, por vezes, ofuscados pela frágil adaptação do roteiro. 

Por fim, o casting – como um todo – parece mesmo um grupo de pessoas na idade correta para estar no ensino médio. Não tem aquele efeito Malhação com um monte de adultos na escola que, em certa medida, ocorre um pouco na primeira versão. Fora que nem todo mundo é magérrimo – a própria Reneé é muito mais voluptuosa do que o estereótipo Barbie Girl ultramagro reforçado no filme original. Muita gente ficou brava com a escalação de Christopher Briney como Aaron Samuels por “ele não ser tão bonito assim”, mas gente… Você lembra do seu crush no ensino médio? Dá uma olhada nas fotos, ele nem era tão gato. Ele só tinha uma franja meio legal. Achei que fez jus

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