Karen O, do Yeah Yeah Yeahs, conta como equilibra rock e maternidade

Cantora, que se apresenta com a banda neste fim de semana, em São Paulo, conversou com a ELLE na época do lançamento de "Cool it down", álbum mais recente do trio.


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Foto: David Black



Durante o lockdown, Karen O lembra de ter sonhado com os lugares pelos quais excursionou com o Yeah Yeah Yeahs pelo mundo nos últimos 20 anos, enquanto uma dúvida pairava no ar: e se a gente não conseguir fazer tudo isso de novo? O trio conseguiu. Em junho de 2022, a banda voltou aos palcos “e a intensidade de tudo parecia cinco vezes maior do que geralmente sentimos”, descreveu a cantora à ELLE.

Três meses depois, o Yeah Yeah Yeahs lançou Cool it down, depois de quase uma década desde o último trabalho do grupo. O álbum foi criado em meio à pandemia, um cenário em que a cantora vê paralelos com o disco de estreia da banda, feito sob a nebulosa poeira do 11 de Setembro em Nova York.

São quase duas décadas desde que Karen, acompanhada pelo baterista Brian Chase e pelo guitarrista Nick Zinner, estreou com o ótimo Fever to tell (2003), um disco com um pé na pista e outro no punk. Na cena de rock nova-iorquina de bandas como Strokes, LCD Soundsystem e Interpol, que marcou o início dos anos 2000, a vocalista era a única mulher. Era dela a performance mais impressionante (e catártica) daqueles anos férteis para a música. A roqueira, nascida na Coreia do Sul e criada em Nova Jersey, também influenciou a moda, atualizando a estética punk para aquele início de milênio. Nos dez anos seguintes, o Yeah Yeah Yeahs lançou outros quatro álbuns, que trouxeram o trio duas vezes ao Brasil.

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O Yeah Yeah Yeahs: Brian Chase, Karen O e Nick Zinner Foto: Jason Al-Taan

Nesse intervalo longe do trio, Karen seguiu criando em projetos paralelos, assim como Brian e Nick. Gravou dois álbuns solo (Crush songs, de 2014, e Lux prima, de 2019), compôs a trilha para uma animação (Where is Anne Frank?, de Ari Folman, de 2021) e teve um filho, Django, 7 anos, com o diretor inglês Barnaby Clay.

Às vésperas de uma turnê, Karen, 43 anos, disse que estava aprendendo a equilibrar sua vida na música com a maternidade. Ela falou com a ELLE com um riso fácil, que parece disfarçar a timidez de uma das mulheres mais seguras no palco nesses anos 2000.

Faz quase uma década que o Yeah Yeah Yeahs lançou seu último álbum. Nesse intervalo, você se envolveu com outros projetos. Quão importante foi esse período longe do grupo?
Acho que sempre fomos muito generosos uns com os outros quando se trata de encorajar colaborações e projetos fora da banda. Nós aprendemos ao longo dos anos com a riqueza das parcerias e com o tipo de evolução como artista que trazemos quando voltamos ao grupo. Foi uma reunião muito significativa voltar para a banda depois de dez anos, ter um filho e fazer esses projetos em tempos tão turbulentos e incertos no mundo.

Como foi se reunir com Nick e Brian para compor novamente?
Nós vínhamos falando de fazer novas músicas desde o fim de 2019. Depois dos últimos dois anos e de tudo que vivemos desde nosso último álbum, estava curiosa sobre o que sairia de nós quando voltássemos. Parecia que a música, para a qual sempre podíamos retornar, tinha sido tirada de nós (na pandemia). Voltar a tocar juntos parecia mais profundo, com a gratidão de fazer isso depois de todo esse tempo.

Qual foi a sensação de estar nos palcos em junho, na Inglaterra, no primeiro show após o momento mais grave da pandemia?
Foi uma mistura de sentimentos. Havia inquietação e receio de se apresentar em meio à pandemia. Havia também uma pressão, já que as pessoas não nos viam havia muito tempo. Então houve euforia e êxtase. A recepção foi muito calorosa. O público passou por tanta coisa. Tocar ao vivo é sempre uma experiência muito visceral. A intensidade de tudo parecia cinco vezes maior do que geralmente sentimos.

“No início de nossa carreira, também havia muita turbulência no mundo por causa do 11 de Setembro. Então, há uma familiaridade em fazer música em tempos instáveis.”

Como você vê Cool it down comparado com os quatro álbuns anteriores do Yeah Yeah Yeahs? O quanto ele foi influenciado pela pandemia?
Esse álbum parece mais maduro, no sentido de que tentamos abordar alguns temas existenciais. (O single “Spitting of the edge of the world”, com Perfume Genius, faz referência à crise ambiental.) Passamos por muitas coisas desde o nosso primeiro disco. Acho que há mais maturidade e compaixão no jeito que criamos como uma banda e também na maneira como estamos tentando ver tudo o que sentimos desde a pandemia. No início de nossa carreira, também havia muita turbulência no mundo e em Nova York por causa do 11 de Setembro. Então, há uma familiaridade em fazer música em tempos instáveis. Há um sentimento de amor infundido nesse disco. E um desejo de homenagear as raízes.

Sua performance no palco sempre foi muito elogiada. Que cantores a inspiram?
Há alguns. Lux Interior, (vocalista) do The Cramps (banda de psychobilly estadunidense), era uma força da natureza no palco. Ele era tão imprevisível, sexy e muito pouco convencional. Foi uma grande influência para mim. Há também Cat Power. Vê-la se apresentar, mostrando suas emoções, realmente causou um impacto em mim. Mostrar-se supervulnerável no palco é muito corajoso. É algo que brilha na Cat Power. E Nick Cave and The Bad Seeds. Acho que ele é o maior astro do rock vivo. É um performer incrivelmente visceral. Vê-lo é como ir à igreja. É poderoso, espiritual e autêntico.

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Faz quase 20 anos que o Yeah Yeah Yeahs lançou Fever to tell e Strokes, Interpol e LCD Soundsystem também estrearam com seus discos. Como você vê a importância dessa cena de rock nova-iorquina?
Na época, enquanto nós estávamos vivendo isso, era incerto se era realmente uma cena, o que é uma pena. Porque, olhando em retrospectiva, é como se fosse o último grande tipo de cena de rock que realmente cativou o mundo. Fico feliz de ter estado no lugar certo e na hora certa. Foi uma das coisas mais significativas que aconteceram comigo.

Você era praticamente a única mulher da cena. Era solitário?
Era, no sentido de não ter outras mulheres para trocar, para poder perguntar “o que você acha?”, “como você lida com essa situação?”. Christian Joy, que criava todos os meus figurinos, era minha melhor amiga e me manteve segura durante esse tempo. Mas, ao mesmo tempo, eu e ela amávamos ser as mulheres em cena porque éramos irreverentes, rebeldes. Temos o espírito punk.

A banda está se preparando para uma nova turnê. Como você procura equilibrar a carreira e a maternidade?
Meu Deus, sinto como se estivesse fazendo um curso intensivo de como ser uma mãe que trabalha. É muito desafiador. Nós (Karen e o marido) levamos meu filho para a turnê que o Yeah Yeah Yeahs fez em junho na Inglaterra. A família do meu marido é de Londres. Meu filho ficou muito doente, teve uma forte gripe estomacal enquanto estava lá. E não podia vê-lo, porque não podia pegar a gripe. Foi complicado, sabe? Encontrar um equilíbrio ainda é um trabalho em andamento.

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