Lizzo fala sobre seu documentário na HBO Max

"Permitir que as câmeras capturassem o máximo possível foi uma tarefa enorme para mim", diz a cantora sobre "Love, Lizzo", que foi filmado ao longo de três anos.


Leon Bennett/Getty Images



“Ninguém queria contratar uma garota negra e gorda, que fazia rap, cantava e tocava flauta”, lembra Lizzo no documentário que estreou na HBO Max no fim de novembro. Love, Lizzo repassa a trajetória da cantora desde seu início em Houston até a fama – são quatro álbuns desde sua estreia com Lizzobangers (2013) e três Grammys até aqui. “Vocês não têm ideia do quanto cheguei perto para que isso não fosse uma realidade”, diz no documentário que passa pela turnê mundial do disco Cuz I love you (2019), pela pandemia e pela gravação do álbum Special (2022).

Filmado ao longo de três anos Love, Lizzo tem produção-executiva da própria cantora. “Não sabíamos qual seria a história desse documentário do Coachella de 2019 até junho deste ano. Permitir que as câmeras capturassem o máximo possível, para que a história ganhasse vida, foi uma tarefa enorme para mim.” Na entrevista a seguir, a cantora fala suas referências, os altos e baixos da carreira, além do filme.

Por que você quis fazer Love, Lizzo?
Não queria ter que responder mais uma vez sobre quem eu sou! Sinto que estou fazendo a mesma entrevista desde 2012 – de onde você é? Como surgiu a flauta? Você é uma rapper? Você é um cantora? Não vou responder mais perguntas depois que Love, Lizzo estrear (a entrevista foi feita antes da chegada do documentário à HBO Max). Você pode consultá-lo sempre que tiver uma questão sobre mim! As perguntas das pessoas são válidas. Sou essa anomalia de um artista e eu entendo. Como eu vim, de onde eu vim e o jeito que eu sou, isso é meio misterioso. E as pessoas não estão acostumadas com isso. Então, elas vão ter muitas perguntas. Mas agora tenho as respostas.

Você filmou o documentário ao longo de três anos. Quão importante foi para você garantir que as câmeras tivessem acesso a todos os aspectos de sua vida naquela época?
Minha vida é muito inesperada. Tudo pode acontecer. Há momentos espontâneos que são muito inspiradores ou muito engraçados. Falei: “Pessoal, vocês sempre devem estar gravando. Porque nunca se sabe quando a música vai sair no estúdio. Ou quando aquele momento ‘a-ha!’ acontece”. Eu não sou uma pessoa muito roteirizada. Então, parece quase um documentário no estilo reality show. Embora eu ache que reality shows são documentários! É de onde eles vêm.

Você é produtora-executivo de Love, Lizzo. Quando você não estava à frente da câmera, no que essa responsabilidade implicava?
Em tomar decisões. É difícil se produzir quando você quer autenticidade e realidade. Mas houve momentos em que tive que, mesmo chorando, permitir que certas coisas acontecessem. Juntar as peças da história era algo que eu estava tentando fazer em tempo real, embora não soubéssemos o que diabos estava acontecendo. Não sabíamos qual seria a história desse documentário do Coachella 2019 até, honestamente, junho deste ano. Portanto, saber qual era a história e permitir que as câmeras capturassem o máximo possível, para que a história ganhasse vida, foi uma tarefa enorme para mim. Sem falar na pós-produção, escolher as cores das palavras, as fontes na tela, a maneira como está escrito – há muito trabalho tedioso em ser uma produtora do qual me orgulho. Porque se eu estiver produzindo, vai ser excelente.


“De uma forma estranha, quando eu não estava emocionalmente estável e precisava de algo que me fizesse feliz, quando eu não tinha nada, tinha a música.”

 

Como você diz no trailer, “estou sempre perseguindo a música”. O que você está procurando nela?
A música sempre foi algo que me deixou feliz. De uma forma estranha, quando eu não estava emocionalmente estável e precisava de algo que me fizesse feliz, quando eu não tinha nada, tinha a música. Então, acho que estava perseguindo a minha alegria. E isso me levou ao lugar certo. Mas, felizmente, agora minha alegria está enraizada em meu senso de identidade, nos meus relacionamentos e na minha família.

Em Love Lizzo, você lembra como o período de 2006 a 2010 foi uma grande confusão para você – o impacto da crise financeira nos negócios do seu pai, como a pressão chegou até você, ter abandonado a faculdade… Como foi revisitar esses tempos?
Mesmo na minha narração, ou nas minhas entrevistas, quando tínhamos que falar sobre isso, era difícil. Fiz parte do processo de edição, então foi difícil assistir ao primeiro corte – que era diferente do final, graças a Deus, porque posso revelar muito sobre mim! Ainda me emociono em certos pontos. Sempre há dois ou três trechos no filme em que tenho que desviar o olhar, ou mexer as pernas, para não reviver como me senti. Isso é muito novo e ainda muito relevante para mim e para quem sou. Você nunca supera algumas das coisas que eu descrevi, sabe?

​​No documentário, você discute o período da morte do seu pai e como você perdeu a vontade de viver. No Dia de Ação de Graças, você dormiu no seu carro. O que a manteve atravessando aqueles tempos, quando não tinha mais nada?
Dei uma volta completa ao perceber que em 2009, dormi no meu carro no Dia de Ação de Graças (sem dinheiro, a cantora morou em seu próprio veículo) e agora, em 2022, estou lançando na mesma data este documentário para o mundo, que conta a história de quando eu estava vivendo isso. As pessoas sempre me perguntaram também: “O que te fez continuar?”. Muitas delas estão em lugares escuros agora, semelhantes a onde eu estava. Sinto que ainda estou aqui só porque escolhi estar. Sempre tive consciência de que estava no meio da história da minha vida. Muitas vezes as pessoas sentem que onde estão atualmente é o fim, “ah, não tem como ficar pior que isso”. E eu respondo: “Não, você está escrevendo sua vida”. O que acontece a seguir?

Você também lembra seu antigo professor de flauta no filme. Qual a importância dele na sua formação musical?
Eu e meus amigos falamos sobre o Sr. Brownden até hoje. Nem sei se ele percebe o impacto que teve em tantos jovens, especialmente negros, de Houston, que provavelmente não teriam tocado um instrumento e mudado suas vidas para melhor. Acho que ele nem sabia que eu cantava, mas meus amigos o procuraram e ele disse: “Se soubesse que ela cantava, a colocaria em uma banda de jazz!”. Sempre quis fazer parte de uma e fiquei brava porque ele nunca me deixou porque disse que flautas não eram permitidas! Ele moldou completamente aspectos da minha personalidade. É muito apaixonado por música e escolheu meu instrumento para mim. Eu não estaria tocando flauta se não fosse pelo Sr. Brownden. Eu poderia tocar clarinete ou saxofone. E então não teríamos Sasha!

O filme mostra altos e baixos. Vemos você vendendo 75 mil ingressos para um show em um rodeio em Houston em sete minutos. Mas veio a Covid e o evento foi cancelado. Quão frustrante foi para você, já que depois de todos esses anos de esforço, quando as coisas estavam acontecendo, o mundo parou?
Acho que não pensei na minha carreira naquele momento. Eu estava tipo: “Ei, o que está acontecendo? Nunca vi nada assim antes…” Acho que todo ser humano neste planeta ficou abalado com o que aconteceu. Sinto que experimentamos essa conectividade global como pessoas. E me senti muito conectada ao mundo, ao medo e à ansiedade. Estava mais preocupada em não apenas me proteger, mas também ajudar os outros. Estava prestes a ir para o Japão, que é um lugar que sempre quis visitar desde criança. Tinha um show em um estádio em Houston, minha cidade natal. Tive todos esses pináculos de carreira incríveis. Mas acredito firmemente que tudo o que aconteceu comigo foi por uma razão. Então, por que questionaria alguma coisa agora?

Como você também diz no filme: quando as pessoas te veem no palco, elas se veem. Quem você viu no palco quando era um artista ou mais jovem, que chegou perto de permitir que você se visse?
Missy Elliott é definitivamente alguém em quem eu me vi. Ela é inconvencional, brilhante e incrível. É um dos seres humanos mais únicos que você já viu e que não era “permitido” no mundo pop. Mesmo que Missy Elliott seja bonita, brilhante, estilosa e sexy, os padrões de beleza e a mídia não celebram as pessoas que se parecem conosco dessa maneira. Então, foi incrível vê-la dizer, “foda-se”, tornando-se um ícone da moda, escrevendo músicas positivas sobre sexo e sendo uma artista e dançarina incrível. Vê-la realmente me ajudou a acreditar que posso ser aceita. Era como “eu sou tão talentosa e única. Então, por que não posso fazer isso também?”.

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